Moisés Cona, especialista em Economia Urbana e Gestão Pública, fala sobre privatização na área de logística

28/10/2022

Nosso entrevistado desta edição, Moisés Cona, é especialista em Economia Urbana e Gestão Pública, atuando há cerca de 10 anos com setores relacionados à infraestrutura na América Latina, especialmente nas áreas de Assuntos Institucionais e Governamentais, Assuntos Corporativos, Desenvolvimento de Negócios e Comercial, com alto senso de responsabilidade, excelência e pensamento analítico. Cona também é diretor do GRI Club Infra Brasil, que faz parte do GRI Club Infra, clube global de líderes do setor de Infraestrutura. O GRI Club reúne investidores, desenvolvedores, operadores, credores, funcionários do governo e outros especialistas do setor. O clube sedia diversas atividades, entre as reuniões a portas fechadas ao longo do ano e os temas abordados que são solicitados pelos associados.

Como se pode ver, Cona tem amplo conhecimento para falar do tema desta entrevista: a privatização no segmento de logística. Acompanhe a seguir.

Em termos de logística, quais os planos de privatização que você considera mais válidos? Por quê?

É importante distinguir as privatizações e as concessões. A privatização é a transferência do controle da empresa do poder público para o privado, e não é isso que majoritariamente ocorre no setor de infraestrutura logística. O que acontece são contratos de concessão com datas de início e término, matrizes de risco entre os setores público e privado, planos de investimento definidos e melhorias que precisam ser feitas nos ativos.

O setor público passa a ser o poder concedente, ou seja, o ativo não deixa de pertencer ao público, ele somente é concedido por um determinado período de tempo, atrelado a compromissos de investimento e com os serviços regulados, isto é, existem agências e órgãos reguladores que controlam a prestação dos serviços em relação à qualidade, ao andamento dos investimentos etc. Esse é um ponto fundamental.

Em relação aos planos de investimento privado em infraestrutura logística, destaco a privatização da Santos Port Authority, que é a empresa pública que administra o Porto de Santos. O governo federal vai privatizar a empresa e essa companhia privatizada receberá a concessão para operar no Porto de Santos. É uma modelagem que ainda está sendo discutida, mas é um projeto que vai angariar muito investimento no ativo e gerar recursos para o governo federal por meio do pagamento de outorga.

Alguns outros portos também estão no pipeline do Ministério da Infraestrutura, do PPI e do BNDES, como em São Sebastião, portos na Bahia e em Santa Catarina.

No setor de rodovias, existem tanto rodovias federais quanto estaduais com planos de concessão. O maior destaque são os lotes das rodovias paranaenses. Dois lotes estão previstos para serem concedidos ainda este ano, e os demais para o ano que vem. São novas concessões que vão ocorrer após o término dos contratos que estavam vigentes até 2021, e, portanto, são ativos que estão sem concessionários, sem operadores, o que impacta a prestação dos serviços para os usuários.

Além disso, alguns estados estão consolidando agenda e trabalhando com o BNDES e governo federal para conceder suas rodovias, como são os casos de Pernambuco e Santa Catarina, possivelmente fazendo um mix entre rodovias federais e estaduais, montando lotes como foi feito no Paraná.

Na parte de ferrovias, o que se espera é o avanço de alguns dos projetos de autorizações ferroviárias que foram autorizados nos últimos meses. Foram expedidas várias autorizações diante de mais de 70 pedidos de empresas privadas, boa parte deles de short lines, geralmente focadas no escoamento de produção mineral, de papel e celulose e do agronegócio. São projetos que estão em fase de licenciamento ambiental. A expectativa é que alguns desses projetos destravem investimentos no setor ferroviário, os quais estavam muito atrelados ao planejamento do governo federal para a logística nacional. Antes, o governo abria editais para a concessão das linhas, e o marco legal agora permite apresentação de propostas para autorizações, com o setor privado indicando onde gostaria de operar uma ferrovia totalmente privada, sem recurso público na construção ou operação.

E tem toda a parte aeroportuária também. Já nos próximos meses, os contratos da última rodada de licitação (7ª rodada) serão assinados e começarão a valer, beneficiando diretamente o sistema logístico aéreo do país. E já existe a perspectiva de estruturação dos próximos projetos, como Santos Dumont e Galeão, que devem ser licitados juntos.

Quais os benefícios que estes planos de privatização vão trazer?

Em relação aos benefícios, basicamente destaco que serão destravados investimentos esperados para o setor – o Brasil investe uma baixa porcentagem do orçamento público em infraestrutura, e esse plano de concessões consegue garantir investimentos por meio da participação privada, algo que o orçamento público não comporta.

O segundo ponto é a qualidade da infraestrutura oferecida para a população. Existem incentivos para garantir a qualidade do serviço e existe a regulação para garantir os investimentos. As concessionárias têm mais possibilidades de buscar inovação e novas tecnologias, o que se traduz em menos custos de operação. No setor aeroportuário, por exemplo, toda a parte de manutenção e vigilância, ao invés de ser realizada por pessoas e veículos, é feita com uso de drones em algumas concessões, e isso otimiza a operação, gera menos uso de combustível, enfim, traz vários benefícios neste sentido.

Uma das operações que aplicam essa tecnologia, inclusive, é finalista do GRI Infra Awards, que é da Zurich Airports. Há outros exemplos de eficiência na parte energética dentro dos aeroportos: a VINCI Airports tem um plano ambicioso neste sentido, a própria Socicam também, então podemos explorar melhor essa questão, se quiser.

Quais os pontos negativos destas privatiz ações?

Não existem pontos negativos, mas sim pontos de atenção na estruturação dos projetos, no compartilhamento de risco entre o poder concedente e o setor privado, para que sejam projetos que, de um lado, beneficiem a população e, de outro, tenham compartilhamento de riscos adequado para que o setor privado possa financiar, investir e operar os ativos, e que tenha segurança jurídica nos contratos.

Pegando um gancho de algo que aconteceu recentemente no Rio de Janeiro, onde algum tempo atrás o prefeito decidiu suspender as praças de pedágio de uma concessão rodoviária que era válida e estava em vigor, então é preciso ter segurança jurídica e compartilhamento de riscos adequado para que os financiadores (bancos), os investidores e os operadores tenham apetite para entrar nas concessões.

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