Novos modelos de contratação/compra de tecnologia redefinem a logística: SaaS e pay-per-use estão em alta

A digitalização da logística avança com novos formatos de contratação. Modelos como os citados ganham força ao substituir grandes investimentos por soluções flexíveis, escaláveis e de menor risco financeiro. Isto reflete a busca por eficiência, escalabilidade e inovação contínua nas operações.

A digitalização da logística avança em ritmo acelerado — e não apenas pela adoção de novas tecnologias, mas pela forma como elas são contratadas. O antigo modelo de compra definitiva, com altos custos iniciais e baixa flexibilidade, dá lugar a formatos mais dinâmicos e aderentes à realidade operacional das empresas. SaaS (software como serviço), pay-per-use e contratos de assinatura redefinem o modo como transportadoras, Operadores Logísticos e embarcadores estruturam seus investimentos em tecnologia.

Mais do que uma mudança contábil, trata-se de uma transformação estratégica: a tecnologia deixa de ser um ativo de longo prazo para se tornar um serviço que acompanha a evolução do negócio. Essa virada permite atualizar sistemas com rapidez, reduzir riscos de obsolescência e ajustar os custos conforme a demanda. Em um setor pressionado por margens estreitas e exigência de eficiência contínua, flexibilidade e previsibilidade tornaram-se ativos tão valiosos quanto a própria automação.

Novos modelos de contratação/compra de tecnologia redefinem a logística: SaaS e pay-per-use estão em alta

Diferenças práticas

Hoje, as empresas de logística contam com uma ampla gama de modelos para aquisição de tecnologia – licença perpétua, SaaS, assinatura mensal e pay-per-use. Mas quais são, na prática, as diferenças entre essas formas de contratação e como elas impactam o desempenho e a competitividade do setor?

Segundo Rodrigo de Castro Barros, engenheiro, mestre em Engenharia de Produção e managing director & partner da Andersen Consulting, as distinções não estão apenas no aspecto técnico, mas, sobretudo, no efeito sobre o caixa e na gestão de riscos. “Na licença perpétua, a empresa faz um investimento elevado de forma concentrada, assume a responsabilidade pela atualização do software e perde elasticidade para reagir a mudanças. Já o SaaS e os modelos de assinatura oferecem previsibilidade e transferem ao fornecedor a obrigação de manter a solução atualizada, mas criam dependência e uma despesa recorrente que precisa ser justificada constantemente pelo valor agregado. O pay-per-use, por sua vez, é ideal para operações com forte sazonalidade, pois ajusta o custo ao uso real.”

Vinicius Pessin, cofundador da EuEntrego, complementa a análise com uma analogia simples: “A licença perpétua é como comprar uma casa — o investimento inicial é alto, você tem controle, mas precisa arcar com reformas e manutenções. Já o SaaS ou assinatura é como alugar — menor custo inicial, previsibilidade de gastos e atualizações constantes. O pay-per-use adiciona flexibilidade, pagando apenas pelo que realmente utiliza, o que é vantajoso em operações sazonais.”

Para Tiago Dantas, mestre em Administração de Empresas (MBA) e Gestão de Negócios, bacharel em Engenharia Elétrica e Sales Manager da Infios, a escolha depende do propósito. “Se a prioridade é rapidez de implementação e previsibilidade, o SaaS tende a prevalecer, com custos previsíveis, atualizações contínuas e menor esforço de gestão de infraestrutura. Já quando há necessidade de controle total sobre dados e customizações específicas on-premises, a compra definitiva ainda pode fazer sentido. Custo importa, mas os fatores críticos são previsibilidade operacional, qualidade e governança dos dados, sempre alinhados ao roadmap tecnológico da empresa.”

Heinz Falkemburg, especialista em transformação digital e gestão de operações complexas e vice-presidente de Operações do Grupo Intelipost, reforça a diferença entre CAPEX e OPEX. “A licença perpétua exige alto investimento inicial, maior responsabilidade sobre infraestrutura e atualizações menos frequentes, enquanto o SaaS/assinatura distribui custos operacionais, garante atualizações contínuas e acelera o time-to-value. A assinatura mensal dilui o investimento, podendo ser parecida com SaaS ou com manutenção tradicional, dependendo da entrega, e o pay-per-use conecta custo diretamente ao volume processado, sendo ideal para operações sazonais, mas exigindo monitoramento para evitar variações inesperadas.” Ele acrescenta que, em muitos casos, a combinação do modelo SaaS com o pay-per-use representa uma solução de excelente custo-benefício, pois permite absorver períodos de pico, como a Black Friday, sem a necessidade de manter o mesmo volume nos demais meses do ano.

Na visão de Helmuth Hofstatter, especialista em logística internacional, tecnologia e comércio exterior, fundador e CEO da Logcomex, a escolha do modelo de contratação reflete mais do que uma decisão financeira: “É uma questão de posicionamento estratégico – ver a tecnologia como ativo, serviço ou infraestrutura estratégica.”

A licença perpétua pode parecer vantajosa pelo controle e pela posse do sistema, mas costuma ser limitada em atualizações e na capacidade de acompanhar a evolução tecnológica. O SaaS, por outro lado, oferece acesso contínuo a melhorias e acompanha o ritmo de transformação que a logística exige. Já o modelo pay-per-use também tem seu espaço, especialmente para operações com sazonalidade alta, onde é necessário mais fôlego em determinados períodos. “O que muda entre eles, no fim, é o quanto a empresa consegue se manter atualizada, conectada e preparada para evoluir junto com o mercado”, acentua Hofstatter.

Thiago Priess Valiati, advogado, doutor em Direito Administrativo pela Universidade de São Paulo (USP), vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Regulatório (IBDRE) e sócio do escritório Razuk Barreto Valiati, resume as diferenças de forma conceitual: a licença perpétua é a aquisição definitiva do direito de uso de uma versão do software, com pagamento único e sem cobranças recorrentes; o SaaS é o modelo em nuvem com pagamentos contínuos que incluem acesso, suporte e atualizações; a assinatura mensal é uma forma de precificação dentro do SaaS, com taxa fixa periódica; e o pay-per-use é a cobrança apenas pelos recursos efetivamente utilizados, como espaço de armazenamento ou volume processado.

SaaS ou compra definitiva?

Embora o modelo de assinatura (SaaS) esteja em franca expansão, ainda há resistência de empresas que preferem comprar software de forma definitiva. O que pesa mais nessa decisão: custo inicial, previsibilidade de gastos ou controle sobre os dados?

Definitivamente não é apenas o custo inicial, mas uma combinação de previsibilidade e percepção de controle, explica Barros, da Andersen Consulting. Segundo ele, muitas empresas de logística lidam com margens apertadas e precisam planejar despesas operacionais com bastante antecedência, o que faz da assinatura algo atraente.

Por outro lado, setores acostumados a manter sistemas críticos sob seu domínio preferem a compra definitiva, pois acreditam que dessa forma terão maior governança sobre os dados e menor risco de depender de terceiros em momentos críticos.

“Normalmente, a balança está entre custo inicial e previsibilidade. Porém, vejo cada vez mais empresas preocupadas com controle de dados. Não adianta ter um software barato se você não sabe onde os dados ficam ou se consegue extrair insights deles com rapidez”, concorda Pessin, da EuEntrego.

A análise de Falkemburg, do Grupo Intelipost, segue pelo mesmo caminho: a escolha entre SaaS e compra definitiva é impactada por três fatores: o custo inicial (alto no modelo de licença perpétua, baixo no SaaS), a previsibilidade de gastos (melhor em assinaturas, mas sujeita a reajustes contratuais) e o controle sobre os dados (percepção de segurança e compliance, sobretudo com LGPD). “Muitas empresas ainda resistem ao SaaS por entenderem que a posse da licença garante maior autonomia e soberania sobre os dados, mesmo que isso signifique maior custo e menor agilidade. Já para uma aquisição segura de SaaS, é importante verificar se a empresa adota padrões de governança de dados, se possui certificações de segurança reconhecidas, como a ISO 27001, e em qual provedor de nuvem sua infraestrutura está hospedada”, aconselha o vice-presidente de Operações do Grupo Intelipost.

Mais do que isto, Hofstatter, da Logcomex, lembra que de fato precisa existir é uma política clara de governança de dados – e isso deve ser uma preocupação tanto no modelo SaaS quanto no modelo tradicional.

Existe uma percepção, nem sempre justa, de que ao contratar um software como serviço, a empresa está cedendo o controle das informações. Por outro lado, o SaaS oferece benefícios reais: previsibilidade de custos, atualizações contínuas e a segurança de estar operando com o que há de mais moderno. “É uma escolha que envolve confiança, mas que também precisa de critério. Subir qualquer planilha ou dado sensível em qualquer lugar, só porque é ‘nuvem’, é um risco. A tecnologia precisa ser usada com consciência e responsabilidade.”

Já Dantas, da Infios, faz questão de ressaltar que a compra definitiva traz riscos de obsolescência, upgrades caros e dificuldade de integração com novas aplicações. Sem um roadmap sólido e dados de qualidade (WMS/OMS/TMS como base), a solução tende a ficar limitada – resultando em reimplementações que elevam o custo total de propriedade ou customizações que travam inovação.

SaaS ou assinatura?

Já no caso do SaaS, a dependência do fornecedor para atualizações, suporte e eventuais mudanças unilaterais de preço ou de contrato é inevitável e deve ser gerida de maneira contratual e estratégica. Barros, da Andersen Consulting, adverte que a empresa precisa garantir cláusulas de atualização contínua, níveis mínimos de suporte e regras claras para reajustes de preço. O risco de alterações unilaterais existe, mas pode ser mitigado com governança contratual e, sobretudo, com um plano de contingência que preveja a migração de dados em formatos abertos, evitando o aprisionamento tecnológico. “É crucial negociar contratos que tragam transparência em reajustes, roadmap de evolução e SLA de suporte. A dependência existe, mas é compensada pela velocidade de atualização e pela redução de riscos operacionais”, adiciona Pessin, da EuEntrego.

Também para Dantas, da Infios, a dependência do fornecedor pode ser mitigada com contratos claros sobre atualizações, suporte e reajustes, além de exigir direitos de portabilidade de dados e critérios objetivos para mudanças contratuais. Também é essencial avaliar a solidez e reputação do fornecedor tanto da plataforma quanto de hospedagem, adotar práticas internas de testes em sandbox antes de atualizar e, quando possível, estruturar estratégias de redundância ou fallback para reduzir riscos.

“A dependência do fornecedor em SaaS pode ser mitigada por contratos que estabeleçam SLAs claros de atualização, suporte e comunicação de mudanças, incluindo janelas de manutenção e limites de reajuste anual. Além disso, cláusulas de portabilidade e reversibilidade de dados asseguram continuidade em caso de migração, e a definição de índices de reajuste ou direito de saída diante de aumentos desproporcionais ajuda a equilibrar a relação de longo prazo.”

Outros pontos importantes a serem considerados no modelo SaaS ou de assinatura – ainda sob a ótica de Falkemburg, do Grupo Intelipost –, são os SLAs de disponibilidade, a latência da plataforma e o tempo de resolução de chamados e falhas. Quando definidos em contrato, esses SLAs asseguram uma operação de alta disponibilidade e padrões de atendimento de excelência.

Mais enfático, Hofstatter, da Logcomex, diz que é essencial que a empresa não entre nesse tipo de relação de forma passiva. A contratação de um fornecedor SaaS deve vir acompanhada de cláusulas que protejam a continuidade do serviço, que garantam transparência nas atualizações e que estabeleçam critérios justos para reajustes. “O SaaS é um modelo que exige confiança mútua – mas confiança não exclui governança. Também é importante escolher parceiros sólidos, com histórico de mercado, visão de longo prazo e compromisso real com a evolução da plataforma. É preciso lembrar: o modelo SaaS é poderoso, mas a escolha do fornecedor certo é tão estratégica quanto a escolha do modelo.”

Valiati, do escritório Razuk Barreto Valiati, também destaca que o modelo SaaS, evidentemente, também possui aspectos que podem ser desvantajosos para as empresas e a estrita dependência com o fabricante, para fins de atualizações e suporte, por exemplo, consiste em um elemento crucial neste caso.

Segundo ele, e concordando com os outros participantes desta matéria especial, um contrato sólido, bem elaborado tecnicamente e que trate de forma detalhada destes aspectos é essencial para que as empresas de tecnologia possuam previsibilidade e segurança jurídica, sobretudo em relação às cláusulas que tratam do preço e eventuais alterações. “Os contratos não podem ser silentes em relação a tais aspectos, especialmente no âmbito de contratações que envolvam necessidade constante de atualizações.”

Plataforma estratégicas

Quando falamos em plataformas estratégicas de logística, que envolvem integração com setores-chave (financeiro, compras, transporte, armazenagem), a flexibilidade e compatibilidade futura devem ser tratadas como uma obrigação contratual. Isso significa prever no contrato, segundo Barros, da Andersen Consulting, garantias de compatibilidade futura com padrões de mercado e a possibilidade de expansão modular. Um fornecedor que não ofereça essa visão de interoperabilidade coloca em risco não apenas a área de logística, mas a estratégia corporativa como um todo.

“O ponto central é interoperabilidade. Plataformas estratégicas devem prever cláusulas de compatibilidade futura, abertura para integrações via API e não aprisionamento tecnológico. Um contrato bem desenhado antecipa a evolução, em vez de bloqueá-la”, completa Pessin, da EuEntrego.

Também é importante incluir ambientes de homologação, regras claras de migração de dados e penalidades em caso de quebra de compatibilidade. “A plataforma deve ser tratada como uma camada estratégica e o contrato precisa contemplar não só tecnologia, mas também processos e capacitação”, acrescenta Dantas, da Infios.

Além de prever em contrato o uso de APIs abertas, padrões de integração documentados e compatibilidade retroativa por um período mínimo e cláusulas que assegurem aderência a normas de segurança e privacidade, outro ponto importante apontado por Falkemburg, do Grupo Intelipost, é formalizar comitês de roadmap ou direito de participação em testes beta, garantindo que a plataforma evolua em sintonia com os processos financeiros, de transporte, armazenagem e compras que dependem dela.

De fato, flexibilidade é um ativo estratégico. O contrato deve prever que a plataforma evolua junto com o ecossistema da empresa. Isso significa garantir que ela seja construída sobre uma arquitetura aberta, com capacidade de integração via APIs, padrões amplamente utilizados e escalabilidade. Também é importante – agora na visão de Hofstatter, da Logcomex – incluir cláusulas que permitam revisões tecnológicas periódicas, prevendo atualizações não só técnicas, mas também de compatibilidade com sistemas internos e novos parceiros. “A tecnologia, quando pensada de forma estratégica, deixa de ser um sistema e passa a ser um facilitador de crescimento.”

Diante de um mundo cada vez mais marcado pela inovação e evolução tecnológica, os contratos, atualmente, precisam ser dinâmicos e adaptados a tais elementos, com cláusulas que permitam a adequação e flexibilidade às novas tecnologias. Isso não significa dizer o desrespeito ao previsto e firmado em contrato; muito pelo contrário, tratam-se de previsões e cláusulas dinâmicas que garantam justamente a adequada prestação do serviço e sua adaptação às novidades e inovações que impactam no objeto do contrato.

“Diferente de um passado que se preocupava excessivamente com cláusulas contratuais extremamente engessadas e petrificadas, atualmente, os contratos precisam de dinamicidade e cláusulas que possuam gatilhos para justamente garantir esta compatibilidade com o futuro e com a evolução da tecnologia”, completa Valiati, do escritório Razuk Barreto Valiati.

Dependência de planilhas

Muitas empresas relatam frustração porque investiram em plataformas caras, mas continuaram dependentes de planilhas para ter confiabilidade nos dados. A questão que se coloca é: esse tipo de problema é resultado de má escolha de fornecedor, falha na implantação ou modelo de contratação inadequado?

Esta frustração não é apenas fruto de uma má escolha de fornecedor, conforme destaca Barros, da Andersen Consulting. “Na maioria dos casos, decorre de uma implantação mal conduzida, sem gestão da mudança e sem governança de dados. O software pode até ser robusto, mas se não houver alinhamento de processos e capacitação do time, a ferramenta se torna apenas uma camada adicional, e não um substituto eficaz das práticas antigas.”

Já Pessin, EuEntrego, acredita que, na maioria dos casos, é uma combinação de fatores: escolha de fornecedor inadequado, implantação mal conduzida e falta de governança de dados. “O modelo de contratação, por si só, não resolve. O que importa é como a tecnologia é integrada à operação.”

Valiati, do escritório Razuk Barreto Valiati, também pondera que esse tipo de problema pode envolver um pouco de cada uma destas três causas, a depender do fator predominante em cada caso. “Sem dúvidas, quando a escolha da empresa é realizada de forma equivocada, uma plataforma ou modelo de contratação inadequado contribui diretamente para a ocorrência desse problema, porque a plataforma e a contratação não vão garantir a almejada confiabilidade pela empresa. Por sua vez, eventual falha na implantação da plataforma também é causa fundamental para tal problema. De nada adianta um bom fornecedor e um modelo de contratação adequado se a empresa não fizer a sua parte internamente e não implantar adequadamente a plataforma. Todos os aspectos, portanto, precisam ser considerados.”

Também para Dantas, da Infios, esse problema geralmente é resultado de uma combinação de fatores: decisões desalinhadas, falhas de implantação em governança e treinamento, e em alguns casos limitações do fornecedor. Mesmo com bons sistemas como WMS, OMS ou TMS, se processos não forem adotados corretamente e a equipe não estiver capacitada, os usuários acabam recorrendo a planilhas. É, portanto, uma responsabilidade compartilhada entre fornecedor, cliente e gestão do projeto.

“Esse problema geralmente decorre de uma combinação de fatores: escolha inadequada do fornecedor (com foco apenas em funcionalidades, e não em integração); falhas ou ausência na arquitetura da solução (fase em que o sistema é desenhado e os requisitos de integração são mapeados e documentados); problemas de implantação (como subestimação da qualidade e da migração de dados); e, em alguns casos, um modelo de contratação inadequado que limita evoluções.”

Ainda segundo Falkemburg, do Grupo Intelipost, quando as integrações não são bem mapeadas e, consequentemente, mal executadas, as equipes acabam recorrendo a planilhas para consolidar informações, o que representa um retrocesso e aumenta a exposição a erros manuais. Para o sucesso de um projeto de migração de plataforma, é essencial envolver todo o ecossistema, especificar claramente como as integrações funcionarão e definir os fatores críticos de sucesso, garantindo que as entregas de valor estejam disponíveis não apenas ao final da implantação, mas também ao longo de toda a operação.

“Não adianta contratar uma plataforma moderna se o processo de implantação é mal conduzido, se os dados não são preparados ou se a equipe não está capacitada. A tecnologia sozinha não resolve problemas estruturais. Ela potencializa o que já existe – para o bem ou para o mal. Quando uma empresa investe em tecnologia mas continua rodando planilhas paralelas, geralmente há um desalinhamento entre o que foi contratado e o que foi executado. Governança, mais uma vez, é a palavra-chave: governança de dados, de processos e da própria implantação”, diz Hofstatter, da Logcomex.

Cláusula contratual de SLA

Pelo que já foi dito nesta matéria especial, vários fatores devem ser considerados em uma cláusula contratual de SLA (Service Level Agreement) para evitar falhas críticas de operação logística em sistemas de gestão e torre de controle.

Na verdade, como diz Barros, da Andersen Consulting, um contrato de SLA em sistemas logísticos precisa ser encarado como um seguro de operação. Isso significa exigir níveis claros de disponibilidade, tempos de resposta compatíveis com a criticidade do negócio e planos de contingência bem definidos para falhas. Penalidades financeiras em caso de descumprimento são importantes, mas mais relevante ainda é o compromisso formal de escalonamento rápido e suporte em situações que possam comprometer a continuidade das operações de transporte ou armazenagem.

“Disponibilidade mínima (99,9%), tempo de resposta para incidentes críticos, métricas de desempenho transacionais e penalidades claras em caso de falha. Um SLA de logística deve tratar o sistema como infraestrutura vital, não como ferramenta acessória”, afirma Pessin, da EuEntrego.

Na verdade, o SLA não pode ser tratado como um anexo técnico — ele é um instrumento estratégico de proteção operacional. “Em ambientes logísticos, onde o tempo é um ativo valioso, falhas de sistema podem gerar efeitos em cadeia. Por isso, é essencial que o SLA defina claramente a disponibilidade esperada, o tempo de resposta em diferentes níveis de criticidade, os canais de suporte e as ações de contingência. Além disso, penalidades devem ser estabelecidas em caso de falhas recorrentes. Mais do que garantir que o sistema funcione, o SLA deve garantir que o negócio continue funcionando”, diz o fundador e CEO da Logcomex.

Um SLA eficaz em plataformas logísticas deve prever níveis claros de disponibilidade, janelas de manutenção acordadas e RTO/RPO definidos para incidentes. Também é fundamental estabelecer tempos máximos de resposta por criticidade, planos de continuidade com testes periódicos, garantia de compatibilidade em atualizações, além de obrigações formais sobre backups, criptografia e responsabilidade pelos dados. Esses pontos dão previsibilidade e reduzem o risco de falhas críticas na operação, relaciona Dantas, da Infios.

O fato é que o SLA deve incluir métricas claras de disponibilidade e tempos de resposta e de resolução por severidade, também comenta Falkemburg, do Grupo Intelipost. Esses prazos, especialmente os de solução, devem estar alinhados às necessidades da operação, assegurando indicadores objetivos que possam ser monitorados e que garantam uma operação com alta disponibilidade e excelência operacional, bem como políticas de contingência como o RPO (Recovery Point Objective), que estabelece quanto de dados a empresa pode perder em caso de falha ou desastre, considerando o intervalo entre o último backup válido e o incidente, e o RTO (Recovery Time Objective), que determina por quanto tempo a operação pode permanecer fora do ar até que o sistema seja restaurado e volte a funcionar.

Ambas as métricas são fundamentais para planos de recuperação de desastres, ainda segundo o vice-presidente de Operações. “Além disso, é essencial estabelecer SLAs específicos para APIs (latência, taxa de sucesso e limites de consumo), cláusulas de segurança e privacidade alinhadas à LGPD, bem como penalidades ou compensações em caso de falhas críticas que impactem a operação logística.”

Com uma visão jurídica, Valiati, do escritório Razuk Barreto Valiati, explica que o contrato deve atentar-se, com cuidado, para a definição cristalina e transparente das responsabilidades das partes envolvidas e com os processos que serão realizados, a fim de evitar a ocorrência de eventuais falhas críticas de operação logística. Assim, pontos fundamentais incluem a descrição detalhada e específica do serviço (contendo exatamente tudo o que está incluído), as métricas de desempenho (para a adequada avaliação do desempenho do serviço) e, sobretudo, as consequências e penalidades muito bem definidas para o não cumprimento dos serviços acordados. “Transparência em relação às consequências nesse caso é essencial, pois sua clareza serve justamente para coibir falhas críticas relacionadas à operação.”

Assinatura

A adesão a uma plataforma estratégica de logística muitas vezes significa um custo fixo recorrente (assinatura). Como equilibrar esse gasto frente à pressão constante para reduzir custos logísticos operacionais?

O desafio é garantir que essa plataforma realmente substitua outros custos operacionais. Isso exige avaliar o TCO e o custo total de propriedade, e não apenas o valor da assinatura. “Uma solução SaaS bem implementada deve reduzir retrabalho, eliminar redundâncias e aumentar a confiabilidade dos dados, gerando economias indiretas que justificam o desembolso recorrente”, comenta Barros, da Andersen Consulting.

Mais ainda, para Pessin, da EuEntrego, a assinatura deve ser vista como custo estratégico, não apenas operacional. Reduzir centavos no contrato pode custar milhões em ineficiência logística. “O equilíbrio vem de alinhar a assinatura ao ganho em produtividade, rastreabilidade e visibilidade de ponta a ponta.”

Também para Dantas, da Infios, a assinatura deve ser tratada como um investimento estratégico que gera ganhos operacionais, como redução de erros, automação e maior visibilidade, compensando o custo recorrente. É importante destacar que o investimento em tecnologia só entrega seu potencial completo quando acompanhado de melhoria de processos e mudança cultural; automatizar operações com redundâncias ou processos desnecessários limita os ganhos e impede a empresa de atingir eficiência total. 

Já Falkemburg, do Grupo Intelipost, também comenta que o segredo está em atrelar o gasto fixo da assinatura a indicadores operacionais objetivos, como custo por pedido processado, taxa de reentregas ou lead time de entrega, evidenciando o valor gerado. Além disso, revisar periodicamente a quantidade de usuários, os módulos contratados e negociar franquias de consumo ajudam a manter a plataforma dentro do orçamento, reforçando a assinatura como investimento estratégico, e não apenas como custo operacional. “Atualmente, os clientes têm percebido a logística como fator estratégico, e não mais apenas uma linha de custo. Nesse contexto, é essencial que as plataformas demonstrem de forma clara o valor entregue, conectado aos principais KPIs monitorados pelos clientes, como aumento da taxa de conversão, redução de custos logísticos e melhoria da experiência do consumidor, que se reflete em maiores taxas de recompra, recomendações e avaliações positivas em diferentes canais.”

Também precisa ser considerado que o custo fixo de uma assinatura tecnológica pode parecer pesado num primeiro momento, mas deve ser analisado à luz dos benefícios que ela entrega, segundo argumenta Hofstatter, da Logcomex. Uma plataforma bem implementada reduz erros, aumenta a previsibilidade, melhora o planejamento e, no médio prazo, reduz o próprio custo logístico. Em vez de cortar esse tipo de investimento, o desafio está em extrair o máximo valor dele. A lógica da recorrência é positiva quando está conectada a um ciclo contínuo de melhoria. “O que não dá é para manter a assinatura e seguir operando como se nada tivesse mudado”, diz o CEO da Logcomex.

A redução dos custos logísticos consiste em uma demanda muito relevante para as empresas envolvidas neste processo, sobretudo em um mercado altamente competitivo. Por sua vez, em um mundo cada vez mais tecnológico, a adesão a uma plataforma estratégica de logística é essencial para o sucesso destas operações. Vale dizer, a tecnologia está em constante evolução e consiste em aspecto crucial na logística, sendo que a contratação eficiente e certeira de uma plataforma pode justamente contribuir com a redução dos custos operacionais. “Em tais casos, a escolha pela empresa por uma determinada plataforma deve ser estratégica e muito bem planejada, visando justamente essa redução dos custos e a eficiência das suas operações. Portanto, o planejamento adequado é crucial nesse processo”, completa Valiati, do escritório Razuk Barreto Valiati.

Minimizando riscos contratuais

Os riscos contratuais – como dependência de fornecedor único, riscos de cibersegurança, multas por rompimento de contrato ou dificuldade de integração futura – podem ser minimizados já no processo de contratação desde que a empresa adote uma postura preventiva. É fundamental assegurar a portabilidade dos dados, prever uma estratégia de saída clara em caso de ruptura e avaliar a robustez de cibersegurança do fornecedor, aconselha Barros, da Andersen Consulting. Também é importante limitar multas de rescisão, negociar reajustes de preços de forma transparente e evitar a exclusividade que leva ao aprisionamento tecnológico. “Em logística, onde o ecossistema depende de múltiplos atores, contratos fechados demais podem se tornar gargalos críticos no futuro.”

Minimizar os riscos contratuais implica em diversificação e transparência: contratos que permitam portabilidade de dados, cláusulas de segurança cibernética bem definidas, revisões periódicas e, quando possível, evitar dependência de fornecedor único. “É melhor gastar tempo na negociação do contrato do que perder meses apagando incêndios depois”, diz Pessin, da EuEntrego.

Dantas, da Infios, também comenta que os riscos contratuais podem ser minimizados desde a contratação ao incluir cláusulas de portabilidade de dados, flexibilidade de integrações, direitos de auditoria e requisitos mínimos de segurança. É essencial prever planos de continuidade, avaliar a arquitetura (multi-tenant vs. single-tenant) conforme criticidade e manter governança ativa pós-go-live, garantindo a mitigação completa dos riscos.

“Os principais riscos podem ser reduzidos já na contratação por meio de cláusulas que assegurem portabilidade e exportação de dados em formatos abertos, certificações de segurança como ISO 27001, limites para reajustes de preços e condições de saída em caso de alterações unilaterais. Também é importante prever obrigações de integração via APIs versionadas, planos de contingência testados e auditorias de segurança, evitando lock-in e garantindo a sustentabilidade da solução no longo prazo”, diz Falkemburg, do Grupo Intelipost.

Esses riscos precisam ser enfrentados com inteligência e clareza, logo na fase de negociação, acrescenta Hofstatter, da Logcomex . É importante garantir, por exemplo, que o contrato preveja a portabilidade de dados, que existam regras para saída planejada e que a segurança da informação seja auditável. A escolha de um fornecedor também não pode ser baseada apenas no preço – é necessário avaliar a reputação, a solidez técnica e a transparência com que ele trata temas como proteção de dados e governança. Em tempos de IA generativa, em que muitas soluções oferecem resultados rápidos com baixa explicabilidade, é ainda mais importante selecionar plataformas confiáveis. “Adotar tecnologia sem pensar em segurança é um atalho para a vulnerabilidade. Por isso, o processo de contratação deve ser tratado com o mesmo cuidado que qualquer decisão estratégica da empresa”, alerta o CEO da Logcomex.

Um contrato elaborado tecnicamente com cláusulas robustas e bem detalhado é essencial para a mitigação de riscos contratuais e ocorrência de eventuais prejuízos às empresas de tecnologia. Por sua vez, ainda segundo o sócio do escritório Razuk Barreto Valiati, e como já dito antes, isso não significa a previsão de cláusulas que meramente engessam o contrato e que o tornem totalmente imune às alterações tecnológicas e à inovação. Muito pelo contrário. Os contratos precisam se preocupar cada vez mais com tais aspectos e não podem ser completamente imunes à dinamicidade de suas cláusulas.

Participantes desta matéria

Andersen Consulting – Consultoria global que atua apoiando empresas desde a definição da estratégia até a implementação prática de transformações. Seu portfólio cobre áreas como estratégia corporativa, transformação digital, Supply Chain e operações, cibersegurança, sustentabilidade, capital humano e inteligência artificial.

Eu Entrego – É uma plataforma digital que conecta varejistas à maior rede de entregadores autônomos do país, promovendo entregas rápidas, escaláveis e com alto nível de confiabilidade.

Infios – É uma líder global em execução de cadeias de suprimentos que, com um portfólio de soluções flexíveis, ajuda negócios de todos os portes a simplificar operações, otimizar a eficiência e gerar impactos mensuráveis. É uma joint venture entre a Körber, fornecedora global de tecnologia, e a KKR, empresa de investimentos internacionais. 

Intelipost – É líder em inteligência logística, oferecendo uma plataforma completa que garante mais controle e agilidade nos processos logísticos para que as empresas possam proporcionar uma experiência de entrega perfeita aos seus clientes. Oferece soluções para e-commerces, varejistas, marketplaces e Operadores Logísticos.

Logcomex – É uma empresa de tecnologia para o comércio exterior na América Latina. Com presença em quatro continentes, conecta todos os elos da cadeia global – importadores, exportadores, Operadores Logísticos, despachantes e autoridades – promovendo mais eficiência, compliance e inteligência estratégica em cada etapa do processo.

Razuk Barreto Valiati – É um escritório de advocacia que atua com soluções jurídicas personalizadas e integradas nas áreas de Direito Ambiental, Urbanístico, Administrativo e Empresarial. 

Essa matéria faz parte da Revista Logweb Ed. 247 – Acesse aqui para ler o conteúdo completo e baixar o pdf.

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