Mas ainda existe um vasto campo a ser explorado, levando em consideração a disseminação da IoT e a chegada do 5G, que permitirão a geração de insights mais rápidos, amplos e assertivos, abrangendo todas as operações.
Um mundo mais conectado, integrado e colaborativo favorece melhores perspectivas.” Com esta frase, de Igor de Freitas Fonseca, product manager da Pontaltech, começamos esta terceira e última matéria sobre Inteligência Artificial aplicada à logística. Os destaques são as mudanças mais recentes pelas quais passou a IA no setor e as tendências na área.
Mesmo com a complexidade da cadeia de suprimento nacional, o setor de logística encontrou oportunidades para inovar durante a pandemia. Passamos a perguntar: Por que ter posse se posso ter acesso? Por que seguir uma grade de horários se posso consumir on demand? As empresas de tecnologia aproveitaram este cenário para levar os novos sinais de consumo com ações imediatas de fomento ao marketing digital.
“Fomos impactados por Inteligência Artificial, hiper-automação, multica- nalidade, pós-dinheiro, pós-privacidade, redes interdependentes, novos modelos de negócios, novas categorias de produtos e serviços, novos hábitos de consumo, novos perfis de clientes, novas necessidades e uma nova cadeia logística de suprimentos para atender a todas essas demandas”, ressalta Fonseca.
Assim, continua o product manager da Pontaltech, surgiram questões, como a importância (ou fragilidade) da digitalização dos negócios ao repensar o uso de determinados ativos de logística. São elas:
1) Cognificação: deixar as coisas mais inteligentes e com sentido. É o novo tipo de inteligência que combina a inteligência humana com a da máquina;
2) Interação: interagir através da realidade virtual e realidade aumentada. Experiências dominarão as questões futuras. O foco sai da “commoditie” e vai para a experiência;
3) Acesso: ter acesso ao mundo de modo instantâneo, imediato, constante e por demanda. Acessar é melhor que possuir. Economia sob demanda;
4) Compartilhamento: ter conhecimento das coisas através dos dados. O poder está em aprender a cooperar e coordenar pessoas para a solução de problemas complexos.
“Estas quatro mudanças recentes de paradigmas impactaram todo o setor de logística”, destaca Fonseca.
De fato, para Lilio de Souza Rocha Neto, evangelizador em Inovação da DHL Supply Chain, o cenário pandêmico demandou maior agilidade e resiliência das cadeias de suprimento. “Neste sentido, a Inteligência Artificial é uma aliada fundamental, pois gera insights tanto para questões cotidianas, como para a resolução de problemas.”
Como exemplo, ela identifica com rapidez áreas de maior risco na circulação de mercadorias ou mesmo classes específicas de produtos que têm experimentado picos de demanda. “Ajuda a responder também a questões fundamentais, como qual é o melhor veículo para determinado tipo de entrega ou mesmo a melhor localização de entrepostos logísticos analisando variáveis complexas e dinâmicas”, acrescenta.
Já Vinícius Abreu, gerente de TI da Log-In Logística Intermodal, tem visto um crescimento significativo da automação via RPA (Robot Process Automation), que é uma das grandes tendências em relação à Inteligência Artificial. “A parte de roteirização logística também é algo que o mercado tem procurado, uma vez que conta com otimizadores para fazer as melhores rotas com essa aplicação, além da ciência de dados, que é uma contribuição para melhorar a tomada de decisões, e da inteligência em relação à cotação de fretes. Temos visto, ainda, a aplicação de chatbots para automatização de atendimento se difundindo no mercado”, expõe.
Para Guilherme Juliani, CEO do Grupo Flash Courier, a mudança mais recente pela qual passou a Inteligência Artificial aplicada à logística foi a implementação de robôs e esteiras, que vão reduzir os erros de separação e envio de produto a quase a zero.
Além de robôs, Fabrício Santos, especialista em logística na MáximaTech e na onBlox, acrescenta veículos autônomos de grande porte (caminhões), drones autônomos e modelos matemáticos de previsão de demanda.
Levi Ferreira Lima Junior, engenheiro de vendas da Zebra Technologies Brasil, vê conceitos de Inteligência Artificial, como Machine Learning, em dispositivos bem simples, como leitores de códigos de barras. “Esses produtos podem ser programados para identificar uma etiqueta e saber qual código deve ler dentre vários que identificam um item, eliminando a necessidade de o operador ‘entender’ a etiqueta para ler o código correto.”
Sistemas de RFID, que no passado tinham custos elevados, hoje podem ser implementados de forma fácil, se integrando com sistemas de análise de imagem, continua Lima Junior. “Na prática, isso impede, por exemplo, que, em Centros de Distribuição com centenas de docas, uma carga seja colocada dentro de um caminhão. Atualmente, a Inteligência Artificial é ferramenta disponível desde equipamentos mais simples até sistemas complexos”, completa.
Pesquisas recentes apresentam resultados proeminentes na utilização de IA na logística, como conta Rodolpho Nascimento, coordenador de Produto da GKO Informática, empresa que foi adquirida pela Senior Sistemas em abril.
Por exemplo, um grupo de pesquisadores elaborou um modelo preditivo para Planejamento de Transporte (PT) utilizando séries temporais e algoritmos de aprendizado automático. Segundo os pesquisadores, tal modelo objetiva atender às necessidades de uma limitação crítica nos modelos existentes de PT, que é a incapacidade de adaptar-se rapidamente a novas condições (como agrupamento de novas rotas). “O modelo proposto possibilita uma abordagem de PT mais rápida, eficiente e adequada à realidade”, destaca.
Outra pesquisa recém-publicada apresentou um modelo que coletou as opiniões de consumidores publicadas em um marketplace por meio da IA. “Foram analisadas e detectadas deficiências no PT, revelando lacunas que dificilmente seriam identificadas em um processo manual, devido à grande quantidade de dados a analisar.”
No setor aéreo, Rodolpho diz que a IA também está sendo aplicada para predizer a trajetória e o consumo do combustível das aeronaves, de forma balanceada e eficaz, minimizando perdas financeiras e evitando problemas de segurança.
Dentro desta questão de mudanças e novas aplicações, Eliel Fernandes, CEO da Buonny Projeto e Serviços, aproveita para comentar que o maior problema da IA no Brasil é o despreparo tecnológico da maioria dos dirigentes das empresas. “Com raras e meritórias exceções, a maioria é composta por uma geração analógica (baby boomers) que não entende e não se preparou para o mundo digital que estamos vivenciando.”
Portanto, segundo ele, o que se vê é o uso indiscriminado da expressão Inteligência Artificial nas propagandas, sem que de fato existam sistemas verdadeiramente baseados nessa tecnologia. “São chatbots toscos que não operam em linguagem natural, são sistemas de previsão de entregas com erros de várias semanas, são frotas de veículos que continuam operando com grande ineficiência, são roteirizadores que não otimizam os percursos, são marketplaces de fretes que não fazem o gerenciamento dos riscos do transporte de cargas, são sistemas TMS que não conseguem gerenciar a última milha das entregas”, aponta.
Perspectivas
Para Lilio, da DHL Supply Chain, existe um vasto campo a ser explorado, ainda mais com a disseminação da IoT e a chegada do 5G, que permitirão a geração de insights ainda mais rápidos, amplos e assertivos, abrangendo todas as operações.
Por exemplo, a IoT permitirá um monitoramento mais preciso da movimentação da mercadoria, inclusive dentro dos Centros de Distribuição e até no estoque do cliente. Já o 5G tornará toda esta comunicação mais rápida, possibilitando também o tráfego de maiores volumes de informação.
“Com isso, no futuro, os insights derivados de algoritmo combinatorial permitirão que as organizações descubram oportunidades para construir operações mais resilientes e tornar essa inteligência mais transparente em toda a cadeia de suprimentos”, explica.
É importante lembrar, de acordo com Anderson Benetti, head de Produto WMS e TMS na Senior Sistemas, que o Machine Learning tem um papel preponderante nos dias atuais, porque permite que os bots possam aprender continuamente conforme as experiências, tornando o atendimento cada vez mais inteligente e assertivo.
Além do Machine Learning, há também o Processamento de Linguagem Natural (NLP na sigla em inglês), que é uma subárea da IA, que proporciona que o chatbot tenha uma comunicação mais natural com o usuário.
“Como tendência, acreditamos que a Inteligência Artificial será cada vez mais usada para movimentação de mercadorias com foco em ganho de produtividade em Centros de Distribuição. Além, claro, de seu uso no monitoramento de operações de transporte em tempo real conseguindo prever atrasos nas operações – Logística 4.0”, ressalta Benetti.
Com a redução de mão de obra humana na realização de tarefas repetitivas e o aumento de veículos autônomos desde a armazenagem, transporte até a entrega final, as pessoas precisarão passar por processos de reposicionamento e qualificação para assumir cargos mais estratégicos do que operacionais dentro da cadeia logística. É o que aponta Cleverson Orlando Cachoeira, cientista de dados na LogComex.
“A customização no tratamento aos clientes também trará mais fidelidade, e a tendência de processos mais otimizados resultará em armazenagens mais eficientes, acarretando menos espaço requerido em menos tempo de uso”, acrescenta.
Fabrício, da MáximaTech e da onBlox, espera que os próximos passos da tecnologia sejam o barateamento e, consequentemente, sua popularização nas operações de logística. “O maior apoio do governo ao plano de desenvolvimento da Indústria 4.0 no Brasil contribuiria também para que mais software houses passassem a adotar IA em seus sistemas, além de contar com mais profissionais capacitados, que hoje acabam seguindo caminho para fora do país, uma vez que ainda são escassos”, expõe.
De toda forma, ele vê que, aos poucos, grandes indústrias, portos, distribuidores e varejistas estão adotando não apenas automações em seus processos produtivos, mas também IAs preditivas, robôs e outros modelos mais complexos para acelerar a produtividade. “Em um momento tão delicado, como o que vivemos, há uma maior distância entre esses grandes players e os menores, justamente por conta da adoção de tecnologia”, analisa.
Fabrício espera ver, dentro de alguns anos, mais Centros de Distribuição automatizados, veículos autônomos e algoritmos cada vez mais precisos para remover de atividades perigosas as pessoas, aumentando a segurança nos processos logísticos. “Em alguns locais, como China e EUA, isso já acontece e deve crescer e, para o Brasil, espero que ainda nesta década algum ponto seja realidade.”
Por sua vez, Márcio Arbex, diretor de Pré-Vendas da TIBCO para a América Latina, diz que, basicamente, a Inteligência Artificial pode eliminar todos, ou a maioria, dos problemas decorrentes de falha humana no setor de logística. “No entanto, a IA, como é hoje, não é totalmente autossuficiente, o que pode ser interpretado como um paradoxo. Ou seja, a tecnologia ainda precisa da supervisão humana”, analisa.
Na opinião de Cassius Tadeu Scarpin, consultor da Nimbi, a maior e mais esperada evolução será a passagem de modelos preditivos de IA para modelos prescritivos de otimização matemática. “Além de prever o que vai acontecer e permitir a tomada de decisão operacional com o menor custo, o que se chama de decisão ótima, passará a ser um diferencial para a empresa que possuir esse conhecimento.”
Modelagem matemática de Programação Linear Inteira binária será a evolução que afetará fortemente o mercado, pois os primeiros a ofertarem essa possibilidade terão um diferencial competitivo brutal em relação ao processo manual de decisão atual. “Essa área de desenvolvimento será a integração do aumento de poder computacional com a utilização de técnicas de otimização de pesquisa operacional. Sem dúvidas essa é a perspectiva”, expõe.
Falando em expectativas, a pesquisa “Future of Fulfillment”, realizada com CEOs e profissionais de logística pela Blue Yonder e pela Researchcape International, revela que, nos próximos 12 meses, 50% a mais de varejistas – em comparação com aqueles que estão neste momento totalmente automatizados – planejam automatizar completamente seus pontos de distribuição para atender às necessidades do consumidor.
Além disso, o uso de Centros de Distribuição emergentes, dark stores (exclusivamente para suprir as vendas online) e microcentros de distribuição se duplicarão à medida que os varejistas se voltam para o comércio impulsionado pelo cliente. “As tendências são a diversificação das fontes de abastecimento, o on-shoring e o nearshoring para redução dos tempos de entrega e agregar agilidade ao abastecimento de produtos”, conta Miguel Alvarez, VP Industry Latam da Blue Yonder.
Uma das novidades, segundo Abreu, da Log-In, são as inteligências de tomadas de decisões de forma automática. “Parte das empresas de cloud, como Amazon e Google, tem trazido cada vez mais ferramentas para a Inteligência Artificial, que é uma novidade não especificamente da logística, mas que pode acelerar as empresas no processo de implementação da Inteligência Artificial. Isso acontece porque esse serviço conta com muitas APIs e funções prontas, que possibilitam que sejam realizadas apenas a adaptação e a aplicação ao nosso modelo, evitando ter de fazer tudo do zero.”
Segundo Fonseca, da Pontaltech, a IA avança cada vez mais rápido por meio do Machine Learning e é bem provável que em um futuro próximo as máquinas sejam capazes de ensinar a si próprias, como já tem acontecido em laboratório.
O setor de logística fará uso intenso de tecnologias emergentes, incluindo Inteligência Artificial, por ser um ambiente com fartura de oportunidades e uma imensidão de dados para usar como modelo de aprendizado. Isso refletiu na disseminação das dark stores – Centros de Distribuição, ou Fulfillment Centers, quando utilizados para as operações mais ligadas ao e-commerce, atuando como um hub de distribuição, menor que os CDs regulares e localizados em zonas com alta densidade urbana, objetivando aproximar o online dos clientes offline.
Fonseca diz que os riscos de ruptura em toda a cadeia estão sendo reduzidos por meio da transparência dos dados, conectividade em tempo real e cloud computing. A aplicação de devices em toda a cadeia logística, por exemplo, viabiliza o tracking de produtos do fornecedor até o cliente final em tempo real.
Ele cita também que a internet das coisas favorece a gestão inteligente, expandido a aplicação de Inteligência Artificial ao transporte de cargas. A IoT conecta devices aos veículos para roteirizar trajetos de entrega, rastrear frotas, medir níveis de combustível e integrá-los a diversos sistemas. Eles permitem o diagnóstico sobre performance, acompanhar motoristas durante o percurso para avaliar desempenho e prevenir acidentes, entre outras aplicações. “Como consequência, contribui para o conceito de direção virtual e inteligente, seja veículo autônomo ou entrega de carga. Também é possível aplicar a inteligência à gestão de estoque com previsão de pedidos e alertas de escassez”, explica.
O product manager da Pontaltech também diz que chegarão ao Brasil os devices que permitem a gestão de equipes em CDs por mapa de calor, para monitorar o fluxo de pessoas e os veículos que compartilham o mesmo espaço. Além disso, a popularização do drone na entrega para o consumidor final só cresce.
“Sabemos que o futuro será cada vez mais digital e esse é um caminho sem volta. As corporações deverão cada vez mais se adaptar às novas tecnologias para se manterem entre os melhores players do mercado ou se tornarão obsoletas. A procura por ferramentas capazes de melhorar a performance cresce a cada dia, com novos recursos e atualizações, e as empresas precisam ficar sempre atentas nessa busca por melhoria da performance e resultados financeiros”, avisa, por fim, Lucas Moura, diretor de Crescimento da e-Vertical Tecnologia.
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Se você não leu ou quer reler as duas matérias anteriores desta série, acesse www.logweb.com.br, baixe o pdf das edições 214 e 215 da Revista Logweb ou leia em html.