Também as transportadoras buscam atender as indústrias que fabricam e distribuem medicamentos, as mais atuantes na terceirização, incluindo o grande mercado de vacinas, medicamentos oncológicos, equipamentos médicos, reagentes e correlatos.
A terceirização logística farmacêutica busca, em geral, redução de custos, atender a uma demanda que não pode ser suportada internamente pelo embarcador ou atender à necessidade de áreas em melhores condições para a atividade logística farmacêutica, quando comparada com as suas.
“Em geral – diz Marcelo Azevedo, gerente Nacional de Operações da Ativa Logística – as empresas mais novas ou com baixa implementação dos seus processos buscam um Operador Logístico, bem como aquelas que querem focar no seu core business, substituindo local de armazenagem por linha de produção, aumentando eficiência e produtividade e, portanto, competitividade, e que querem acesso a mercados e canais não explorados ou não conquistados e integridade no ponto de venda.”
Em linhas gerais, aqui é apresentado o conceito de terceirização logística, com destaque desta aplicação à logística farmacêutica, tema desta matéria de capa de Logweb.
Lucy Maia, Healthcare Industry Manager da DMS Logistics, também começa por explicar que a terceirização de alguns serviços é importante para aumento de performance, considerando a dificuldade de uma empresa em possuir excelência em todas as etapas. Armazenamento e monitoramento são os principais serviços terceirizados por conta do alto grau de especialização, controles em tempo integral e altos investimentos em infraestrutura.
“Para a indústria farmacêutica – pontua Lucy –, todos os prestadores de serviço devem atender aos requisitos de qualidade como uma extensão da empresa.” Ainda especificamente quanto ao segmento farmacêutico, Deiler Alves de Oliveira, gerente de Logística da Embragen Empresa Brasileira de Armazéns Gerais e Entrepostos, destaca que a terceirização logística é crescente por parte das empresas que necessitam da regularização dos seus produtos, incluindo a etiquetagem. Esta procura ocorre porque é uma necessidade do importador em cumprir a legislação da ANVISA.
Eduardo Viana, gerente Comercial Fármaco da IBL logística, também destaca que a terceirização no serviço de armazenagem na Indústria farmacêutica vem em uma grande crescente, e há grandes OLs que estão totalmente capacitados e contam com profissionais especializados no segmento. “Isso se dá, pois, em sua maioria, a indústria entende que não vale a pena trazer essa atividade para dentro e que se deve passar esse serviço para quem possui know how e a empresa embarcadora focar em novas tecnologias para medicamentos ainda mais eficazes.”
Ainda segundo Viana, as indústrias que fabricam e distribuem medicamentos são as mais atuantes na terceirização, incluindo o grande mercado de vacinas, medicamentos oncológicos, equipamentos médicos, reagentes e correlatos.
“A implementação de inovação tecnológica para atender as exigências regulatórias e ganhar em produtividade e eficiência é a necessidade do momento, de forma a atender a demanda reprimida pós-pandemia, que muitas empresas estão passando”, completa o gerente da IBL Logística.
Já Fabio Gobor, diretor Comercial da Gobor Transportes & Logística, lembra que a terceirização neste segmento é muito diferente da subcontratação para o transporte de carga geral, porém não é novidade, uma vez que a legislação sanitária reconhece e permite essa prática.
“Atualmente, a ANVISA permite apenas a terceirização de serviços de transporte e armazenagem, incluindo expedição. Já a manipulação com retrabalho na embalagem primária não tem permissão de terceirização. É fundamental salientar que há uma corresponsabilidade entre o embarcador e os demais agentes pelo resultado dos serviços prestados”, completa João Trajano, COO da Soluciona Logística. Ele diz que a sua empresa enxerga como tendência e oportunidade a possibilidade de oferecer serviços e soluções que suportem a conexão direta entre a indústria e o varejo ou mesmo com o consumidor final.
Características
Na verdade, a logística para produtos de interesse da saúde tem necessidades diferentes no que se refere aos cuidados durante seu processo de distribuição. O medicamento apresenta características de toxicidade, fotossensibilidade, termossensibilidade e higroscopicidade, portanto, é necessário garantir a sua estabilidade durante o período de “vida útil” (prazo de validade). “Os produtos para saúde, como equipamentos hospitalares e materiais médicos, também são sensíveis, por isso deve se tomar todos os cuidados necessários para que mantenham suas condições ideais para uso”, acrescenta Cristiane Fabiano Gonzalez Dias, farmacêutica responsável técnica da Via Expressa Logística e Armazenagem.
Devido a sua fragilidade e de acordo com as exigências sanitárias – completa Cristiane –, devem ser transportadas em veículos adequados com controle e monitoramento de temperatura e existe a compatibilidade de cargas que deve ser seguida.
“A logística farmacêutica começa pelas licenças e adequações corretas de acordo com a legislação vigente da ANVISA e vigilância sanitária, pois aí começam as diferenças entre os nichos de negócios dentro do segmento, e seguir todas as exigências corretamente e mantê-las vigentes é o primeiro desafio. Também é preciso realizar investimentos em infraestrutura e, principalmente, em colaboradores de qualidade, considerando a obrigatoriedade de um farmacêutico como RT – Responsável Técnico”, diz Mírian Costa, gerente Comercial da Transrefer Transporte e Logística.
De fato, Trajano, da Soluciona, diz que o segmento farmacêutico tem como principal diferencial a necessidade de adaptação técnica para preservação da integridade da carga, sujeita ao rol de licenciamentos e certificações estabelecidos por órgãos ambientais, ANVISA e demais órgãos regulatórios.
“O mercado farmacêutico é extremamente regulado. Possui demandas próprias e alto nível de especialização. É um mercado extremamente sensível à performance de entrega e sempre em busca de melhoria de processos e inovação”, completa Daniela Teixeira, gerente de Farma da Braspress.
E, além da regulamentação bastante específica, em todas as etapas do processo logístico existe um cuidado especial com a integridade física e segurança da carga, como controles de temperatura, de modo a se evitar contaminação cruzada, extravio, perda de rastreabilidade, acrescenta Lucy, da DMS Logistics.
“Na verdade, os cuidades envolvem controle e monitoramento de temperaturas, áreas controladas e equipamentos qualificados com periodicidade de sete dias nas temporadas de inverno e verão”, diz, agora o gerente de Logística da Embragen.
Desafios
Diante de tantas exigências, quais são os desafios a serem enfrentados na logística farmacêutica?
Azevedo, da Ativa, aponta o alto investimento na construção de uma estrutura moderna que atenda aos clientes de forma muito eficiente e com qualidade, que lida não só com cargas de alto valor agregado, mas que requerem o armazenamento com especificidades de alto nível (controle de temperatura e umidade). Além disso, é preciso contar com mão de obra especializada, que entenda como funciona o segmento e consiga passar o detalhamento para o restante da equipe, e com treinamento constante para os profissionais, pois as exigências da indústria devem ser observadas, especialmente quanto às condições de armazenagem e temperatura, áreas segregadas e integração com todas as áreas.
Cristiane, da Via Expressa, também destaca que um dos desafios encontrados é o fator humano sendo fundamental para o sucesso na distribuição – qualquer procedimento inadequado significa risco para a saúde do consumidor final.
Outro principal desafio é o monitoramento, que visa à integridade dos produtos farmacêuticos durante seu processo de distribuição, que deve ser realizado por profissionais qualificados e pautado nas Boas Práticas de Transporte de Medicamentos. São estas práticas que asseguram as condições adequadas de transporte, armazenagem e movimentação das cargas. As distribuidoras devem seguir rigorosamente as diretrizes para garantir o controle de qualidade dos produtos.
Fabio, da Gobor, também diz que, dentre os muitos desafios podem ser citados os altos investimentos em taxas públicas, estrutura operacional e capital humano, tanto para atender ao que determina a legislação, que constantemente traz mudanças importantes, quanto para atender ao mercado, que além das exigências nacionais do segmento, traz requisitos da indústria, baseando-se muitas vezes em critérios de boas práticas e qualidade internacionais.
Também pelo lado financeiro é feita a análise de Daniela, da Braspress. Ela destaca que o grande desafio é conseguir fechar a equação financeira, para conseguir atender os três grandes demandadores dos serviços: 1 – A área de qualidade das indústrias, orientadas pela ANVISA, VISAS municipais e algumas com padrões internacionais, cada vez mais exigentes em relação aos controles e processos de toda a cadeia na distribuição; 2 – A área de logística e a cobrança pelo SLA de entrega, num mercado cheio de destinatários (grandes redes e distribuidores) com suas políticas de recebimento próprias, e pouco “fair” em relação à estrutura necessária para a efetivação da entrega, o que pode gerar desperdício na cadeia e, consequentemente, aumento no custo do serviço; 3 – A área de compras, que procura sempre achatar as margens dos parceiros, buscando, através de novos BIDS, o melhor preço, independente da qualidade do serviço prestado.
A análise dos desafios da logística farmacêutica feita por Trajano, da Soluciona, também é bastante ampla.
Ele diz que, dada a complexidade de cumprimento regulatório, é necessário ter uma organização de equipamentos e capacitação que garanta uma relação de custo x esforço com viabilidade competitiva. Um desafio de grande relevância é garantir recursos tecnológicos adequados para controle e monitoramento de temperatura em todas as etapas da cadeia.
De modo detalhado, continua o COO da Soluciona, podemos traçar o cenário de desafios da logística farmacêutica da seguinte maneira: Os diferentes tipos de medicamentos requerem diferentes acondicionamentos; Os de cadeia fria, por exemplo, devem ser transportados a temperaturas entre 2°C e 8°C. Já os de cadeia seca devem ser transportados a temperaturas entre 15°C e 30°C; A depender do destino, algumas remessas precisam combinar diferentes modais, como transporte rodoviário e aéreo, geralmente necessitando de diferentes empresas de logística para isso; As distribuidoras sempre tiveram estoques gigantes e frequentemente sofrem com a demora e o “engessamento” do sistema de entregas; Hoje, elas preferem operar com estoques menores, contando com mais agilidade e flexibilidade das empresas de logística para atender a diferentes Centros de Distribuição. Quanto ao mercado de terapias especializadas, Trajano coloca que essas cargas são bastante específicas e abarcam produtos oncológicos, cardiológicos, para transplante e para o tratamento de doenças imunológicas e metabólicas.
A entrega final geralmente é feita em hospitais, clínicas, consultórios ou residências onde existam pacientes de home care sob supervisão médica, incluindo também materiais médicos educativos e amostras grátis.
O setor no pós-pandemia
Agora, neste momento de volta ao “normal”, como está sendo a logística no segmento farmacêutico? O que tem sido mais requisitado? O que mudou na demanda e na distribuição? Quais os produtos mais requisitados e por quê? Qual a frequência de reposição? Veja a seguir o que falam alguns dos participantes desta matéria especial.
Azevedo, da Ativa: A logística de produtos farmacêuticos ou a indústria farmacêutica tende a ser menos suscetível às oscilações da economia, por conta da necessidade do produto farmacêutico, e assim o segmento obteve um crescimento de faturamento de 11,16% em um período de 12 meses – comparativo realizado entre julho de 2019 e julho deste ano, conforme informado pela Federação Brasileira das Redes Associativistas e Independentes de Farmácias (Febrafar). Dessa forma, não foram notadas alterações de demanda ou mudança de frequência de reposição de forma geral.
Daniela, da Braspress: O volume de carga para abastecimento de grandes redes e distribuidores tem aumentado consideravelmente desde julho. Esse aumento pode estar sendo impulsionado pelo auxílio emergencial liberado pelo governo, que está permitindo o acesso a medicamentos a uma classe menos privilegiada. E agora no último trimestre, há, ainda, o aumento gradual de abastecimento desses grandes centros para suportar o período de férias coletivas da indústria farmacêutica.
Oliveira, da Embragen: Hoje os maiores requisitos são: Flexibilidade, preços, prazos de pagamento e atendimento personalizado. Os horários de recebimento das cargas oriundas de zona primária foram os que mais mudaram, fazendo com que o terminal aumentasse o seu efetivo nos horários após as 20 horas, finais de semana e feriados. Quanto aos produtos mais requisitados, no sentido do recebimento e abastecimento do mercado, são os laboratoriais, testes de Covid e EPIs, porque todos eles estão ligados ao combate ao Covid. E, quanto à frequência de reposição, para alguns itens a chegada e saída passaram a ser diárias, e outros semanais – com mudanças em relação ao mesmo período sem o cenário do Covid.
Fabio, da Gobor: A distribuição está se mantendo em alta, tanto que a Gobor antecipou os projetos de expansão previstos para 2021, atendendo essa alta e colocando em prática projetos que estavam parados. No início da pandemia, a frequência de reposição de produtos farmacêuticos por parte dos clientes aumentou, desta forma, de modo proporcional, a demanda por transporte também aumentou, mas com a retomada da ‘normalidade’ a volumetria programada tem sido retomada, facilitando a programação e roteirização diária.
Viana, da IBL logística: Hoje, o que tem sido mais requisitado são a qualidade nos serviços e a redução de custos. Quanto à mudança na demanda e na distribuição, a empresa entende que ela foi no aumento da volumetria. Houve um crescimento de 25% neste período, principalmente na movimentação de produtos para exames laboratoriais. Isto porque, devido à pandemia, a população começou a fazer um tratamento preventivo. Sobre a frequência de reposição, no caso da empresa, ela sempre foi diária e assim se permaneceu.
Mírian, da Transrefer: O segmento farmacêutico é, economicamente, muito forte, é um mercado que dificilmente entra em crise, sempre mantém um movimento acima da média dos outros e é uma indústria que se renova e se adapta muito rapidamente. O que têm sido mais requisitado hoje são a agilidade e a confiabilidade nas informações e o cumprimento do lead time acordado para cada mesorregião acima de 98% de performance exigida pela indústria. No início da quarentena houve um grande aumento no volume, devido às incertezas do mercado, porém com o aumento da duração e das restrições, não somente as indústrias, como os destinatários também começaram a não receber, esta foi a maior dificuldade. Hoje, com as adequações de todos, a necessidade de demanda está se normalizando. No início da pandemia, os produtos mais requistados foram os químicos, voltados a limpeza industrial, agora com o mercado aquecendo, matérias primas para abastecimento das fábricas voltam a ter alta demanda. As indústrias estavam com seus estoques praticamente vazios devido à indefinição do mercado, com a reação de agora, as reposições estão sendo praticamente diárias, pois as dificuldades de encontrar matéria prima e insumos são crescentes.
Cristiane, da Via Expressa: Hoje, o que tem sido mais requisitado é o serviço especializado com entrega imediata. Com relação à demanda, aumentaram o número de clientes e a quantidade de envios, enquanto o prazo de entrega de alguns diminuiu. Com os protocolos obrigatórios adotados pelos órgão governamentais e de saúde houve a necessidade de uso de máscaras de proteção por toda a população, e não somente por parte dos profissionais da saúde como era antes. Dessa forma, o consumo aumentou consideravelmente e houve uma alta rotatividade nas prateleiras dos comércios, com isso a frequência de reposição se tornou diária, diferente do que era antes, em que os prazos para reposição eram muito mais extensos.