Mercado aquecido não significa tranquilidade. Há mais custos do que entrada de caixa. Haja jogo de cintura

28/10/2022

Embora o transporte rodoviário de cargas enfrente um bom momento, ainda se debate com os custos de insumos e equipamentos, bem como de combustíveis. OLs e transportadoras enfrentam desafios diários, incluindo preço do frete.

“Costumo dizer que o TRC é o termômetro da economia. Este ano tem sido um bom ano para o TRC: a economia está crescendo, e as operações de transporte também.”

Com este otimismo, José Alberto Panzan, presidente do SINDICAMP – Sindicato das Empresas de Transportes e Cargas de Campinas e Região e diretor da Anacirema Transportes, dá início a esta matéria especial sobre o transporte rodoviário de cargas, e a atuação dos Operadores Logísticos e das Transportadoras (veja as tabelas com dados destas empresas no final desta matéria).

Mas, o otimismo encontra restrições. “Ainda estamos ‘brigando’ com os custos dos insumos e equipamentos, tentando manter a última linha positiva. O aumento do diesel impactou bastante nas operações, não conseguimos repassar aos clientes integralmente. Por outro lado, os embarcadores (clientes) têm procurado alongar os prazos de pagamento, exigindo que as empresas de transporte passem a agir como financeiras – pagamos a vista e recebemos a prazos não inferiores a 60, 90 dias”, lamenta Panzan.

Também na ótica de Roberto Schmeing, gerente Comercial da IBL Logística, neste momento, devido à proximidade da Black Friday e das festas de fim de ano, o mercado está aquecido. “Porém, observamos que, apesar da redução no valor do diesel, não houve redução no frete por parte dos proprietários de veículos. Sabemos também que os proprietários de veículos não estão errados, pois apenas estão tentando recuperar parte da receita que perderam no passado.”

Por outro lado, ainda segundo Schmeing, as empresas estão tendo de arcar com um custo maior para efetuar os transportes pelo País, já que os embarcadores (clientes), em sua maioria, não estão repassando o reajuste correto. “Esse repasse, muitas vezes, está sendo feito abaixo da realidade. Com isso, assumimos os custos e diminuímos as margens do frete. Tudo isso impactará o consumidor final na hora das compras. Lembrando que estamos falando apenas dos combustíveis, sem contar outros custos indiretos que também aparecem na hora de efetuar o transporte.”

Max Trevisan, diretor Comercial e de Relações Institucionais na RV Imola, também destaca que o TRC vem enfrentando sucessivas dificuldades e desafios. Dentre os problemas, o destaque principal foram os sucessivos aumentos de combustível, estando neste momento em declínio, mas com uma média acumulada ainda de aumento no ano. “Outro aspecto, principalmente relacionado ao transporte da saúde, que envolve medicamentos e material médico, é que a aplicabilidade da RDC430, que regula a qualificação térmica, teve o seu prazo ampliado. Os transportadores que já realizaram os investimentos necessários de qualificação da frota, frente à concorrência que ainda não se regularizou, quando em concorrências e processos de contratação se deparam com preços comparativamente maiores”, comenta Trevisan. Também fazendo um balanço do TRC hoje, Solon Barrios, vice-presidente de Transportes da DHL Supply Chain, lembra que, mesmo com uma recuperação geral considerável, como apontam vários indicadores macroeconômicos, ainda há bastante instabilidade e incertezas, principalmente em relação à demanda por parte dos consumidores.

“A pressão da inflação e as dificuldades na cadeia logística (na área internacional, principalmente, e menor disponibilidade de navios, contêineres e voos) ainda persistem, mas têm um peso consideravelmente menor do que em 2021. Por fim, as cadeias de suprimentos ainda estão se adaptando a este novo mundo em que elas precisam, ao mesmo tempo, ser mais resilientes, eficientes e ágeis. Esse é um desafio contínuo, mas que também traz oportunidades para as empresas extraírem mais valor de seus processos logísticos e também na área de transportes”, afirma Barrios.

Já para Ramon Alcaraz, CEO da JSL, a análise do setor de TRC recai sobre a infraestrutura. “De acordo com a Confederação Nacional dos Transportes (CNT), o Brasil tem mais de 1,7 milhão de quilômetros de estradas federais e estaduais, mas apenas 12% desse total são pavimentadas. Essa deficiência na infraestrutura do país acarreta custos generosos para o transporte rodoviário de cargas, visto que em muitos casos é preciso criar rotas alternativas mais longas para chegar ao destino final. Outras deficiências são a escassez de áreas de descanso para motoristas ao longo das estradas, para servir de apoio ao cumprimento da jornada legal, assim como de terminais intermodais que pudessem viabilizar a conexão com os modais ferroviário e marítimo.”

2023

Com base no mercado de hoje, os participantes desta matéria falam sobre as suas perspectivas para o próximo ano. Panzan, do SINDICAMP, se mantém otimista, mesmo tendo previsão de crescimento de 0,5% do PIB brasileiro em 2023. “Será um ano difícil, mas temos confiança que o Brasil está no caminho certo.” 

Também na IBL Logística há otimismo, de acordo com Schmeing, trabalhando com uma perspectiva de crescimento de 20% a 30% no modal transporte, dividido entre todos os segmentos. Sendo que o segmento eletrônico e fármaco são visto como entre os de maior crescimento em 2023.

“Estamos otimistas em relação a 2023. Com o controle da pandemia, as atividades estão avançando, as atividades voltaram ao ritmo pré-pandemia e os relacionamentos comerciais voltaram a ser presenciais, o que ajuda muito. A economia está voltando ao seu curso natural”, acrescenta Alcaraz, da JSL.

E, também para Trevisan, da RV Imola, as perspectivas para o ano de 2023 são otimistas e positivas. “Com nossa estrutura consolidada, completando 20 anos, e nos últimos anos, um alto investimento em tecnologias, ferramentas de controle, processos e profissionais capacitados, consolidamos uma grande expertise em operação logística especializada no setor da saúde.”

Barrios, da DHL Supply Chain, também aponta otimismo, depois de dois anos intensos. “Nossa perspectiva para 2023 continua positiva, com uma expansão do volume transportado e novos clientes. Para suportar esse movimento, investimos em várias frentes, fortalecemos nossas capacidades de armazenagem e expandimos nossa frota de carros elétricos para oferecer cada vez mais soluções verdes.”

Euro 6

Ainda com relação a 2023, teremos a entrada em vigor do Proconve P8 (Euro 6), o que deverá promover um aumento de 25% no preço dos veículos, impactando, logicamente, o TRC. Várias medidas devem ser tomadas para ajudar transportadoras e OLs a superar esta questão, lembrando que o sistema Euro 6 é um conjunto de normas regulamentadoras sobre emissão de poluentes para motores diesel.

“Muitos transportadores estão procurando antecipar a renovação/ampliação de frota ainda este ano, por conta do aumento dos veículos Euro 6. Entretanto, como se trata de uma legislação a ser cumprida, não teremos escapatória. Precisamos fazer mais com menos, ou seja, criar sinergias em nossas operações e buscar sermos mais eficientes. Não tem café de graça! Creio que o mercado irá se adaptar, aos poucos”, aposta Panzan, enquanto Barrios, da DHL Supply Chain, está confiante de que algum subsídio na questão tributária será concedido pelo Governo de modo a não impactar ainda mais o TRC.

A RV Imola também é favorável e apoiadora de práticas e regulações que permitam um menor impacto no meio ambiente e o crescimento sustentável. Mas, continua Trevisan, “sabemos também que o valor dos fretes não acompanha essa curva de aumento de 25% nos veículos a serem adquiridos em ampliação ou renovação da frota. Se medidas que permitem um olhar responsável do meio ambiente não forem acompanhadas de apoio e incentivo de órgãos reguladores e governamentais, a conta final acaba chegando apenas aos transportadores. Acreditamos que poderiam ser incorporados novos benefícios, carências ou compensações que incentivem as ações de sustentabilidade e que permitam também o crescimento sustentável das empresas”.

A análise de Nilson Santos, sócio-diretor do Grupo TGA e diretor da unidade Expresso TGA de transporte internacional, vai por um caminho parecido.

Segundo ele, o primeiro ponto, é claro, é a nossa realidade. A norma P-8 foi criada exatamente para adequar as diretrizes europeias à vivência em solo brasileiro. Com relação à performance dos motores, a nossa legislação permite um Peso Bruto Total Combinado (PBTC) maior que nos países da Europa. Outro ponto é a diferença de condições entre as estradas: aqui, os veículos precisam ser mais robustos, o que impacta na potência, no consumo e na tecnologia utilizada. “Sendo assim, o Governo, no meu ponto de vista, deverá autorizar linha de crédito com taxas de juros bem menores do que as praticadas hoje no mercado.”

No lado oposto está Schmeing, da IBL Logística. Ele adverte: “Com relação a esta medida, entendemos que se ela entrar em vigor a partir de 2023 muitos veículos usados, principalmente os pesados, deixarão de transitar pelas rodovias, por diversos motivos. Seguem dois exemplos: 1º) o frete muito baixo para ambos, empresa e proprietários de veículos; 2º) de modo geral, todas as empresas de transporte estão cada vez mais sendo pressionadas pelos seus clientes para reduzirem os valores de frete.”

O gerente Comercial da IBL Logística destaca que a resolução 490 do Conama aborda o seguinte: “Art. 1º Instituir a Fase P8 do PROCONVE, conforme tabela 1 do Anexo desta Resolução, estabelecendo os novos limites máximos de emissão, aplicáveis conforme cronograma abaixo: I – a partir de 1° de janeiro de 2022, para as homologações de novos modelos de veículos, que nunca obtiveram Licença para Uso da Configuração de Veículo ou Motor – LCVM; e II- a partir de 1º de janeiro 2023, para os demais veículos abrangidos por esta Resolução.”

Neste caso, continua Schmeing, a resolução trata da necessidade de investimentos para adequações dos veículos, considerando a necessidade de prazo e de investimentos para promover a melhoria da qualidade dos combustíveis automotivos para viabilizar a introdução de tecnologias de controle de poluição e, ainda, considerando a necessidade de prazo para a adequação tecnológica de motores veiculares e de veículos automotores às novas exigências de controle da poluição. “Neste caso, fazemos a observação de que a resolução não cita os veículos usados, somente os novos. Porém, verificamos na informação acima que são mencionados investimentos e adequações, por isso, entendemos que vale para os usados também.”

Alcaraz, da JSL, também entende que haverá impacto do Proconve P8 para os Operadores Logísticos, mas as compensações ambientais geradas por ele são primordiais para a redução dos gases de efeito estufa lançados na atmosfera. “A partir de 2023, a frota da JSL deve atender aos novos padrões de requisitos do programa, uma vez que nossos veículos são mais novos que a média nacional.”

Agenda 2030

Por outro lado, como medida visando cumprir a Agenda 2030 de diminuição da emissão de poluentes, o Governo Federal instituiu com a MP 112/2022 o Programa de Aumento da Produtividade da Frota Rodoviária (Renovar). O objetivo é diminuir a idade média dos equipamentos usados no transporte rodoviário de cargas, o que também impacta o TRC. 

Panzan, do SINDICAMP, destaca que o Renovar é um programa que pode contribuir para melhoria do transporte de carga, melhorando a produtividade e eficiência, beneficiando o setor. “Veículos novos, mais eficientes e menos poluentes deveriam pagar um IPVA menor e contar com redução de impostos para aquisição, enquanto os mais antigos deveriam ter uma idade limite para poder operar, o que poderia contribuir com o propósito Programa de Renovação. Poderiam andar em paralelo com o Renovar”, diz o presidente do SINDICAMP.

O vice-presidente de Transportes da DHL Supply Chain também lembra que o Programa Renovar agrega iniciativas e ações voltadas à retirada progressiva dos veículos em fim de vida útil, à renovação de frota ou à economia circular no sistema de mobilidade e logística no País. Beneficia o setor porque esse programa tende a suportar o Plano Nacional de Redução de Acidente, Mortes e Lesões no Trânsito. Os principais beneficiários serão os Transportadores Autônomos de Carga (TACs), pois, aderindo ao programa, terão a recompra do caminhão antigo, pelo qual será pago ao caminhoneiro o valor de mercado do veículo, com recursos oriundos das empresas de exploração e produção de petróleo e gás natural, e, além disso, terão ganho de produtividade (veículo roda mais e com um custo menor) e o perdão de débitos, bem como linha de crédito direta do BNDES para troca do seu veículo. “Desta forma, devemos ter uma maior disponibilidade de frota no setor, bem como uma frota mais produtiva e menos poluente”, acredita Barrios.

Santos, do Grupo TGA, também aponta que essa medida vai ajudar a diminuir os juros na compra de veículos, incentivando a troca por caminhões mais novos, abaixando, assim, a idade média da frota circulante brasileira, sem contar a diminuição da poluição. “Mas há alguns problemas nessa medida. O programa de reciclagem precisa se adequar à grande quantidade de caminhões que será encaminhada aos pontos de coleta. Sem isso, eles podem não ser descartados corretamente, prejudicando ainda mais o meio ambiente. Mesmo com os obstáculos, esse programa vai trazer melhores equipamentos, planos e ciclos de fornecedores, além de gerar mais empregos.”

Como visto, esta MP fala em aumento na produtividade da frota rodoviária no País, renovação da frota e diminuição da vida útil dos equipamentos. “Entendemos que esta medida é necessária, porém, o Governo precisa auxiliar as empresas nesta renovação de frota. Pois, não cabe apenas às empresas e aos proprietários de veículos assumirem os custos, o Governo precisa baixar os impostos e abrir linhas de créditos especificas, com juros mais baixos, para que todos possam fazer a sua parte”, aponta, por sua vez, Schmeing, da IBL Logística.

Finalizando, Trevisan, da RV Imola, revela que, inegavelmente, a Agenda 2030 precisa ser discutida, analisada, ponderada e planejada nas empresas. “Não podemos desconsiderar as medidas atuais, bem como os impactos da Agenda 2030. Assim como no início a internet era desacreditada por alguns, não compreender ou reconhecer as mudanças e os impactos da Agenda 2030 seria um ponto negativo dos empresários, impactando na manutenção e crescimento dos seus negócios.”

Ele lembra que a RV Imola já adotou, regularmente, a renovação de frota a cada 2 anos. “Mas, sabemos que nos deparamos com um mercado em que a realidade não seria essa. Por isso, frente a esses impactos, bem como às normas reguladoras que envolvem a Anvisa e o transporte de medicamentos, entendemos que os contratantes, sejam fabricantes, importadores ou distribuidores, precisam ter mais atenção em suas contratações de fretes, não considerando apenas o fator decisivo do preço mais baixo, mas compreendendo que um veículo de idade muito antiga dificilmente estará adequado às normas da Anvisa e da RDC430. Por esta razão, entendemos que a aplicabilidade da MP112/2022 pode permitir uma melhor qualidade nos transportes, entretanto, há de se considerar uma readequação nos preços.”

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