Devido à característica cíclica e sazonal do agronegócio, agilidade e flexibilidade são fundamentais para conseguir administrar as flutuações de volumes deste segmento. E saber fazer a gestão de todo o processo também é imperativo.
Segundo o Índice de Fretes e Pedágios Repom (IFPR), a demanda por frete rodoviário no Agronegócio teve incremento de mais de 10% ao considerar o acumulado do ano – de janeiro a agosto de 2020. A Repom é uma empresa de soluções de gestão e pagamento de despesas para frota própria e terceirizada da Edenred Brasil, e faz mensalmente estas análises. “Diferentemente da Indústria e do Varejo, no Agronegócio não se observou a depressão da pandemia entre abril e maio, mas sim um pico de movimento, que está sendo compensado nos últimos dois meses, mais moderados, mas ainda positivos na visão acumulada. Este comportamento mais equilibrado também se deve ao término das safras no país”, pontua Thomas Gautier, Head de Mercado Rodoviário da Edenred Brasil.
Estas e outras análises, bem como notícias diversas, mostram que o agronegócio tem se mantido em alta neste período de pandemia.
E fica a pergunta: O que isto exige dos transportadores e dos Operadores Logísticos que atuam no segmento? Quais os impactos na qualidade e nos preços dos serviços oferecidos?
Marcus Vinicius Budel, diretor da Budel Transportes, lembra que o maior impacto é aprender a trabalhar na pandemia. As empresas precisam ter cuidado com seus colaboradores para que não haja uma contaminação em massa e assim a operação pare. “O que me preocupa como empresário do ramo é o aumento que tivemos nos equipamentos, não vejo o repasse desses valores por parte dos embarcadores, ou seja, como pagaremos essa conta. Nas operações de cana, por exemplo, temos que ter um cuidado muito grande nas trocas de turnos dos funcionários e o constante monitoramento da saúde dos mesmos”, diz Marcus Vinicius.
Bernardo Pinto Rodrigues, gerente de Segmento Rodoviário e Agro do Expresso Nepomuceno, também destaca que o desafio nesse momento é manter a estrutura operacional (veículos/pessoas) ativa e focar bastante na gestão de produtividade, sem descuidar da segurança. Com a oferta de carga maior, afirma ele, contradizendo o diretor da Budel Transportes, os valores de frete tiveram os ajustes necessários para reequilibrar os custos devido ao aumento do valor dos veículos e insumos.
Já na visão de Flávio Gimenes, diretor da De Santa Transporte Rodoviário de Cargas, exigiu-se uma forte adaptação de atendimento e armazenagem de tipos de produtos diferentes, devido ao escoamento de cargas do cliente para o armazém. Conseguiu-se também alinhar os processos internos e sua melhoria na informação para com o cliente, devido ao índice baixo de entregas.
Renato Pavan, gerente Nacional de Vendas e Marketing da GEFCO Brasil, destaca que no segmento de máquinas agrícolas em que atuam, o maior impacto foi quando as indústrias estavam sem produzir. “Nossas operações de outbound, ou seja, distribuição de máquinas acabadas, tiveram o volume reduzido, mas não pararam. Já no inbound, ou seja, abastecimento das plantas, nosso principal desafio foi acompanhar a retomada da produção que, em alguns de nossos clientes, chegou a ter saltos de 30% no volume transportado de um mês para outro.”
Rogério Andre Dullius, CEO da Moving Express Multimodal, completa dizendo que reduzir custos operacionais, mantendo qualidade e eficiência, sempre será o diferencial no segmento de transportes, porém com aumento de demanda de entregas é necessário investir na operação, e a terceirização da mão de obra na entrega é o recurso mais usado.
Covid-19
Em que pese o bom desempenho do setor na pandemia, é interessante mensurar os efeitos da pandemia na logística do agronegócio. O que exigiu, o que mudou, quais os segmentos mais impactados, quais as cargas mais transportadas e por que, etc.
“A mudança significativa foi no cuidado que as empresas passaram a ter com seus colaboradores para evitar a contaminação dos envolvidos no processo. Felizmente não houve impactos negativos neste segmento. Inclusive o volume de cargas dessa safra aumentou em relação à safra passada, proporcionando crescimento no volume de transporte”, explica Rodrigues, da Expresso Nepomuceno.
Pavan, da GEFCO, lembra que a empresa atua fortemente no segmento de agronegócios com foco nos fabricantes de maquinas agrícolas. No início da pandemia praticamente todas as indústrias tiveram de fechar suas plantas por algumas semanas, o que gerou impacto na produção. Segundo a ANFAVEA, no acumulado de janeiro a agosto, a produção sofreu uma redução de mais de 20% em comparação ao mesmo período de 2019. As exportações também foram impactadas. As vendas no mercado interno, por sua vez, estão nos mesmos níveis de 2019, impulsionadas pelas linhas de financiamento liberadas pelo governo.
“Nós atuamos com entregas em redes de supermercados em todo o Brasil e o que notamos é que o consumo aumentou, gerando mais demandas de entregas, inclusive as entregas nas residências (compras pela internet), que aumentaram muito para os produtos de alimentação em geral”, completa Dullius, da Moving Express.
Reflexos
Também perguntamos aos representantes dos OLs e das transportadoras sobre as tendências/perspectivas em termos de logística do agronegócio, considerando os reflexos da pandemia na economia como um todo e a sua retomada.
“Não há dúvidas de que o motor do Brasil é o agronegócio. Isso tem sustentado nosso país por anos. Teremos mais um aumento na safra 20/21, ou seja, teremos mais negócios, empregos e, em, consequência, investimentos”, comemora Marcus Vinicius, da Budel.
O mesmo otimismo é mostrado por Gimenes, da De Santa. “Pelo fluxo desde o início até a sua retomada gradativa, estamos bem confiantes e o mercado está respondendo positivamente. O agronegócio brasileiro vem em uma crescente constante, e quem se adaptar a este negócio com certeza terá uma rentabilidade boa a longo prazo.”
Também para Pavan, da GEFCO, as perspectivas para o agronegócio são bastante positivas. Por sua natureza, é uma atividade cíclica, com altos e baixos, mas que ao longo dos anos só apresenta crescimento, e esta tendência deve permanecer. “Percebemos que nossos clientes continuam otimistas e mantendo a previsão de investimentos na região.”
Já para Rodrigues, da Expresso Nepomuceno, a tendência é que os Operadores fiquem mais focados em gestão para agregar e atingir resultados e produtividade em toda a cadeia envolvida no agronegócio.
“Acredito que o aumento nos produtos e serviços é o próximo passo, os meses que virão serão de retomada da economia em todos os setores, mas no agro e nos transportes com certeza será notado aumento do valor final de venda”, completa Dullius, da Moving Express.
Exigências
Quais são as exigências impostas pelos embarcadores, de um modo geral, para se operar no segmento de logística do agronegócio?
Marcus Vinicius, da Budel, ressalta que não há um grau de exigência como em outros segmentos de cargas perigosas ou industriais. Porém, tem demandado das empresas de transporte maior profissionalismo para se manter no mercado com esses custos altos. Somente o setor canavieiro exige um grau máximo de cuidados devido aos perigos do negócio.
A análise de Gimenes, da De Santa, é diferente: as exigências são as mesmas para quem opera neste segmento de químicos: Licença da Polícia Civil, Polícia Federal, Exército, IBAMA, CETESB e, principalmente, MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Rodrigues, da Expresso Nepomuceno, por seu lado, aponta que os
grandes embarcadores e contratantes têm migrado para contratações de transporte de empresas que tenham uma estrutura de atendimento e segurança mais robusta, controle de jornada e que atendam plenamente as legislações. Ou, como acrescenta Dullius, da Moving Express, empresas que ofereçam gestão total dos processos e eficiência a baixo custo.
“Quando falamos no transporte de máquinas agrícolas, estamos tratando de equipamentos que facilmente superam a casa do milhão de reais. As janelas de plantio e colheita são bem apertadas e o atraso de um dia na entrega de um equipamento pode representar prejuízos significativos para o produtor. Esta criticidade se reflete no rigor dos embarcadores para a seleção de transportadores e Operadores Logísticos, assim como nos altos níveis de serviço exigidos destes prestadores”, completa Pavan, da GEFCO.
Diferenciais
Já que falamos tanto de peculiaridades, fica a questão: Quais os diferenciais da logística aplicada ao agronegócio?
“Hoje, os investimentos por parte de alguns grandes embarcadores em terminais próprios têm feito a diferença”, diz Marcus Vinicius, da Budel.
Ou, como pondera Gimenes, da De Santa, são exigidos espaços customizados para armazenagem e movimentação de carga, bem como estrutura para carregamento de diferentes veículos, licenças, tanto para armazém como para transporte, e atendimento rápido e com qualidade. Ou ainda, tecnologias e processos mais flexíveis, conforme Dullius, da Moving Express.
“Devido às dimensões territoriais do Brasil, grande parte das rotas de escoamento dos produtos é longa e muitas vezes inclui trajetos em estrada de terra. Quanto mais entramos para o interior do país, maiores são as dificuldades de estrutura de apoio, como postos de combustível, restaurantes, concessionárias e oficinas, além das condições das rodovias. A estrutura de carga e descarga tem melhorado, mas ainda gera improdutividade devido ao tempo de espera nestes processos”, destaca Rodrigues, da Expresso Nepomuceno.
Pavan, da GEFCO, lembra que, devido à característica cíclica e sazonal do agronegócio, agilidade e flexibilidade são fundamentais para conseguir administrar as flutuações de volumes deste segmento.
Equipamentos especiais
E quanto a equipamentos especiais. A logística no agronegócio exige?
“Não. São veículos comuns, como basculantes e graneleiros. Somente o canavieiro utiliza equipamento bem específico”, explica Marcus Vinicius, da Budel.
Por sua vez, Rodrigues, da Expresso Nepomuceno, declara que, por se tratar de altos volumes e rotas mais longas, é fundamental possuir veículos com maior potência e que sejam mais leves para gerar maior produtividade e capacidade de carga.
“Para o transporte de máquinas acabadas, sim. Muitas vezes são equipamentos superdimensionados que necessitam de pranchas especiais e acompanhamento de escoltas”, finaliza o gerente Nacional de Vendas e Marketing da GEFCO.