Cobertura: Carol Gonçalves
No dia 19 de junho último, a Logweb foi convidada para participar do evento de exibição das novas operações da Brado Logística (Fone: 41 2118.2800) com os vagões double-stack no terminal ferroviário de Sumaré, em São Paulo. Um trem composto por 68 vagões desse tipo, totalizando 136 contêineres empilhados, partiu do terminal no interior paulista com destino a Rondonópolis, MT, totalmente carregado de bens de consumo, fertilizantes, materiais de limpeza e de construção. Este é o primeiro de dois lotes de vagões já adquiridos pela empresa.
Na ocasião, discursaram os executivos da Rumo, subsidiária da Brado, bem como da empresa de logística. “Esta operação atende as necessidades de expansão do mercado interno, percorrendo um trajeto de aproximadamente 1.400 quilômetros entre as regiões Sudeste e Centro-Oeste do país”, afirmou Marcelo Saraiva, diretor comercial e de operações da Brado. Segundo ele, o double-stack é um sistema eficiente que possibilita um ganho de 40% na capacidade de transporte dos trens de carga em relação ao vagão convencional, além de outros benefícios, como redução no consumo de combustível e segurança operacional.
Modelo de referência nos Estados Unidos, esse tipo de operação será utilizado pela primeira vez em trajetos de longa distância no Brasil. Os trens são formados com vagões que podem carregar até três contêineres empilhados (um de 40 pés e dois de 20 pés).
Com investimento de R$ 30 milhões no projeto, a empresa estima um crescimento superior a 20% no volume de cargas transportado em 2019, atingindo a marca de 330 mil TEUs no ano.
O processo
Para operar com o double-stack, o time da Brado treinou o processo de carga e descarga por quatro meses. “Além disso, para trazer essa novidade, houve todo um estudo, que envolveu a estabilidade do vagão e o tipo de carga, porque embaixo vai a pesada e, em cima, a leve. Somos muito criteriosos”, ressaltou Rogerio Patrus, presidente da Brado.
Quando o projeto foi viabilizado, a empresa percorreu os 1.400 quilômetros e encontrou diversas interferências, como fios e cabos elétricos, além de pontes e estações com altura abaixo de 6 metros, que não comportaria a passagem do trem. Para cada projeto foi feito um plano de execução. “Só nesta parte de intercorrência foram investidos outros R$ 35 milhões para corrigir as falhas e possibilitar a passagem do trem”, explicou.
Fabricação
Os vagões double-stack PRT foram produzidos pela Greenbrier Maxion (Fone: 19 2118.2000) especialmente para atender as necessidades da Brado Logística. Entre seus diferenciais está o truque tipo Motion Control – Truques Premium, desenvolvido especificamente para as condições operacionais e de via permanente das ferrovias brasileiras, proporcionando, através da otimização do comportamento dinâmico do vagão, aumento significativo da segurança operacional e vida útil dos componentes, principalmente rodas.
Os vagões também contam com sistema de freio incorporado ao truque, processo de manutenção simplificado para substituições de componente e oferecem melhor desempenho dinâmico.
“Ser parceiro neste projeto inovador da Brado foi extremamente gratificante para nós. O double stack é, sem dúvida, uma quebra de paradigma para a logística do setor ferroviário. Sempre acreditamos no transporte de contêineres no Brasil, tanto que nosso portfólio conta com mais quatro modelos de vagões para transporte de contêineres”, ressaltou, em entrevista à Logweb, Eduardo Scolari, presidente da Greenbrier Maxion.
Outras novidades
A Brado está providenciando a chegada ao Brasil de contêineres de 53 pés, ideais para cargas leves, mas com maior volumetria. Com 16 metros, do tamanho de um cegonheiro, eles se encaixam nos vagões double-stack, na posição superior, deixando os de 40 pés embaixo, no encaixe.
A empresa está obtendo junto ao Inmetro – Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia e ao Dnit – Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes a liberação para circulação desses contêineres em rodovias, para o transporte nas pontas. “Nos Estados Unidos, já é autorizado. Esperamos aprovar por aqui rapidamente”, disse Patrus.
Outro projeto para os próximos anos é o de um vagão que produz sua própria energia para manter a temperatura do contêiner, voltado para cargas refrigeradas, como margarina, alface e iogurte, que ainda não são transportadas pela companhia. “Através da Ferrovia Norte-Sul, vamos contribuir para o consumo desses produtos na região”, disse Saraiva.
A Brado transporta mais de 70 produtos e tem mais de 140 clientes. A empresa movimenta por mês 300 contêineres com bebidas na rota de Sumaré a Rondonópolis, fora bens de consumo, material de construção e carga alimentícia. Do total das operações, 30% representam o mercado interno, 70% são cargas para importação/exportação. O mercado interno movimenta, por mês, nessa rota, ida e volta, cerca de 5.000 contêineres cheios e vazios, mais a operação nos pátios.
Multimodalidade
A Brado aposta no aumento da demanda e pretende fidelizar o cliente, mostrando que a multimodalidade, que envolve tiros curtos com caminhões e tiros longos com ferrovia, é tão eficiente quanto um tiro longo no modal rodoviário. “Esse trem que saiu hoje chega em até três dias a Rondonópolis, o mesmo que um caminhão. No entanto, em condições saudáveis, com as paradas para descanso, esses veículos demorariam mais que os trens. Além disso, o ferroviário oferece mais segurança, com trocas de maquinistas no tempo estipulado e acompanhamento da carga durante o trajeto”, ressaltou Patrus. E, ainda, comparando com a operação da Brado demonstrada, são 136 contêineres transportados por um maquinista. Por caminhão, cada motorista leva uma unidade.
“Claro que não somos contra o modal rodoviário, nós o utilizamos. Por exemplo, de Rondonópolis até Cuiabá, cerca de 200 quilômetros, fazemos pela estrada. E vamos colocar mais um modal, o fluvial, na nova Ferrovia Norte-Sul”, explicou o presidente da Brado.
Ele disse que uma operação via Norte-Sul saindo de Sumaré até Estrela do Oeste – trecho que deve entrar em operação dentro de um ano e meio – pode seguir até Imperatriz pelo modal rodoviário ou fluvial. “É preciso estudar para ver se é possível, oferecendo uma logística mais integrada e bem mais otimizada”, expôs.
Mercado ferroviário
Entre os convidados da Brado esteve Vicente Abate, presidente da Abifer – Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Fone: 11 3289.1667), que falou com a Logweb sobre a novidade e as expectativas para o setor. Segundo ele, o acontecimento é importantíssimo por mostrar que é possível utilizar double-stack no Brasil. “Temos um grande problema de gabarito nas nossas ferrovias e a Brado conseguiu remover vários obstáculos no trecho utilizado, de forma a viabilizar o uso deste tipo de vagão. Além disso, a empresa já está pensando em usá-lo na Ferrovia Norte-Sul e, quem sabe, no futuro próximo, poderemos tê-lo em uma bitola métrica. A métrica talvez tenha um pouco mais de dificuldade, os gabaritos são mais restritos, mas nada é impossível”, disse.
Abate conta que o double-stack tem tudo para crescer, pois aumenta a produtividade em relação ao convencional. “As fabricantes de vagões e locomotivas têm fornecido cada vez mais produtos eficientes de forma a melhorar a competitividade das próprias concessionárias”, ressaltou.
De acordo com o presidente da Abifer, as perspectivas para o setor ferroviário são boas, mas em termos de atualidade, há dificuldades. Ele explicou que a indústria está com volumes muito baixos, operando aquém da capacidade. “Hoje trabalhamos com uma ociosidade muito forte, de cerca de 60%. Isso porque as renovações antecipadas ainda não ocorreram. Esperamos, ainda, que a assinatura do contrato de concessão da Malha Paulista, sob administração da Rumo, saia em breve”, expôs.
Com isso, investimentos vultosos serão feitos no sentido de melhorar o modal. “Não estamos só preocupados com a indústria, mas também em aprimorar o transporte ferroviário de carga, pois haverá duplicação de linha, revitalização de trechos e contornos ferroviários, o que aumentará a velocidade comercial e proporcionará melhor atendimento ao cliente.”
Paralelamente a isso, Abate diz que também haverá investimentos em vagões e locomotivas. O próprio associado da Abifer vai atuar no fornecimento de dormentes, grampos de fixação e aparelhos de mudança de via, entre outros.
“Nossas perspectivas são as melhores possíveis. Só precisamos aguentar firme até que elas se concretizem. Estamos fazendo todo um esforço para sobreviver trabalhando com férias coletivas, evitando perder mais gente, porque sabemos que vem a retomada. Já nos desfizemos de muita mão de obra, mas esperamos recontratar na medida em que o setor começar a crescer”, salientou.