São várias normas, tecnologias e procedimentos rigorosos para garantir a integridade dos produtos. E as multas, para as empresas que não as seguirem, são bem altas. A pandemia mostrou a importância da cadeia do frio neste segmento.
Garantir que vacinas e medicamentos cheguem ao destino com eficácia e segurança vai muito além do transporte. No Brasil, uma complexa rede de normas sanitárias – que inclui a RDC nº 430/2020 e a RDC nº 653/2022, ambas da Anvisa, além da Lei nº 5.991/1973 e da Farmacopeia Brasileira – estabelece padrões rigorosos para a armazenagem, distribuição e controle de temperatura desses produtos.
A chamada cadeia do frio, essencial para imunobiológicos e medicamentos termolábeis, exige tecnologia de ponta, rastreabilidade em tempo real e processos operacionais capazes de mitigar riscos que podem comprometer a integridade dos insumos.
Empresas do setor logístico têm investido em certificações, sistemas de monitoramento e integração com o Sistema Nacional de Controle de Medicamentos (SNCM) para atender às exigências legais e garantir a segurança sanitária. O não cumprimento dessas normas pode resultar em penalidades severas e, sobretudo, colocar em risco a saúde pública.

Esta matéria especial da Logweb explora como a legislação molda as operações, quais tecnologias sustentam a cadeia de distribuição e de que forma o setor logístico tem se adaptado a esse cenário cada vez mais rigoroso.
RDC nº 430/2020
Afonso Moreira, CEO da AHM Solution, avalia que a RDC nº 430/2020, da Anvisa, representou um divisor de águas para o setor. “Ela trouxe um rigor muito maior na padronização das Boas Práticas de Distribuição, Armazenagem e Transporte (BPDA), exigindo um controle total da cadeia de custódia. Isso significa que, hoje, todas as empresas envolvidas no fluxo logístico de medicamentos e vacinas precisam ter um Sistema de Gestão da Qualidade bem estruturado, com procedimentos operacionais padronizados, equipamentos qualificados e calibrados, além de um sistema de rastreabilidade robusto.” Também se tornou imprescindível fazer o mapeamento térmico de rotas, qualificação de embalagens e monitoramento contínuo da temperatura.
De fato, como também destaca Liana Montemor, farmacêutica e diretora Técnica e de Estratégia em Cadeia Fria do Grupo Polar, o grande marco da RDC 430/2020 é a exigência de monitoramento e controle de temperatura durante a armazenagem e o transporte de produtos. Isso significa que as empresas devem utilizar embalagens qualificadas, com gelo na quantidade e no tipo corretos, a fim de garantir o controle térmico adequado, principalmente para os medicamentos de 15° a 30°C que, até então, em sua maioria, eram transportados em caixas de papelão sem barreiras térmicas.
Liana destaca que o controle de temperatura já era exigido anteriormente, mas a principal novidade trazida pela RDC 430/2020 é a obrigatoriedade do monitoramento documentado. “Agora, é indispensável o uso de sensores ou data loggers que registrem a temperatura ao longo de todo o transporte, assegurando que não houve variações que comprometam as características dos produtos termolábeis e aqueles considerados como ‘carga seca’”.
Outro ponto relevante da Norma é a exigência de qualificação não apenas do transporte – como a caixa térmica e o tipo de gelo utilizados –, mas, também, dos locais de armazenagem. Isso inclui, por exemplo, as câmaras frias de Operadores Logísticos e os veículos com temperatura controlada. Todos esses equipamentos devem estar qualificados para garantir a manutenção das condições exigidas pela legislação.
Jackson Campos, diretor de Relações Institucionais da AGL Cargo, destaca, ainda, que a norma exige que as empresas mantenham registros de ocorrências e desvios, além de treinamentos periódicos para as equipes envolvidas. “A conformidade deve ser garantida do ponto de origem até o destino, protegendo a integridade do medicamento ao longo de toda a cadeia.”
Por seu lado, Juliane Wolff, Head de Relações Institucionais, Aduaneiro e Regulatório da Multilog, afirma que a norma exige que as empresas realizem estudos de Qualificação de Equipamentos, Mapeamento Térmico de Ambientes e Mapeamento Térmico de Rotas, a fim de conhecer e validar o perfil térmico de seus locais e veículos, assegurando a manutenção das condições ideais para os produtos, especialmente os termolábeis, ou seja, aqueles cuja estabilidade físico-química e eficácia dependem de condições térmicas restritas.
“Transportar produtos farmacêuticos não é como movimentar uma carga comum. Tudo precisa estar identificado e classificado corretamente desde o início: se é matéria-prima, insumo hospitalar, aparelho ou produto acabado. Essa informação define desde a prioridade de embarque até o tipo de inspeção que a carga sofrerá. Estamos falando de itens que, se expostos à temperatura incorreta por algumas horas, podem perder completamente sua eficácia, com prejuízo financeiro, risco sanitário e até desabastecimento hospitalar. Por isso, cada hora e cada grau contam”, completa Iluina Silva, consultora logística da Next Shipping.
RDC nº 653/2022
O setor ainda conta com a RDC nº 653/2022, que trata especificamente das boas práticas para transporte de produtos biológicos e imunobiológicos, como vacinas.
Moreira, da AHM Solution, lembra que esta Norma surgiu como uma complementação à 430/2020, com foco ainda maior nos produtos biológicos, como vacinas. “A adaptação não tem sido simples, pois muitas transportadoras ainda não estavam preparadas para o nível de rastreabilidade e controle térmico exigido. Além disso, a norma impõe a obrigatoriedade do uso de tecnologias de monitoramento em tempo real e da implementação de um sistema de avaliação de risco para cada rota.”
Leonardo E. Gonçalves, gerente de Vendas da Frigo King, também destaca que, apesar da RDC nº 653/2022 representar um avanço importante na regulamentação do transporte de vacinas e produtos biológicos, a adaptação do setor logístico ainda é tímida frente à complexidade e à seriedade exigida pelo processo.
“Na prática, apenas uma pequena fração das empresas envolvidas tem de fato se mobilizado de forma estruturada para cumprir integralmente os requisitos da norma – como a qualificação térmica dos sistemas, o mapeamento de rotas críticas, o monitoramento contínuo da carga e a capacitação das equipes.”
Ainda segundo o gerente de Vendas da Frigo King, muitas operações ainda funcionam de forma improvisada ou com base em práticas antigas que não garantem a segurança e a rastreabilidade exigidas para o transporte de produtos termolábeis. “Isso é especialmente preocupante quando falamos de vacinas e imunobiológicos, que exigem controle absoluto de temperatura para preservar sua eficácia.”
Para isso, diz Liana, do Grupo Polar, as empresas devem incluir sensores ou data loggers nas embalagens para garantir o registro completo das condições de transporte. Essa adaptação gera custos adicionais, o que leva muitas organizações a buscar alternativas para reduzir o impacto operacional e logístico. Nos casos de medicamentos que exigem temperatura controlada entre 15 °C e 30 °C – diferente das vacinas, que requerem refrigeração –, a adequação é ainda mais desafiadora. “Muitos desses produtos ainda são transportados em caixas de papelão comuns, sem controle térmico. A migração para sistemas térmicos qualificados representa um investimento significativo. Ainda assim, como o monitoramento é obrigatório, as empresas têm investido em sensores, data loggers e sistemas que garantam rastreabilidade e conformidade em tempo real.”
Além destes, Betina Borchardt, diretora Geral da HC Hornburg, ressalta que as empresas também devem investir em veículos refrigerados de qualidade, que disponham de monitoramento contínuo da temperatura, e realizar treinamentos específicos para os seus colaboradores.
“A RDC nº 653/2022 traz diretrizes mais específicas e rigorosas para medicamentos, exigindo qualificação dos modais, análise de risco por rota e maior integração entre áreas de qualidade e operação. Muitos Operadores Logísticos estão criando centros de consolidação exclusivos para cargas com temperatura controlada, garantindo compliance e reduzindo perdas.”
Juliane, da Multilog, enfatiza que a resolução introduz a possibilidade de adoção da análise de risco como ferramenta de tomada de decisão para a condução dos estudos técnicos exigidos.
Farmacopeia e Lei nº 5.991/1973
A Farmacopeia Brasileira define os parâmetros técnicos de qualidade e conservação dos medicamentos, como as faixas específicas de temperatura, umidade e demais condições ambientais. Já a Lei nº 5.991/1973 estabelece as diretrizes legais para o controle sanitário da comercialização e armazenagem de medicamentos, atribuindo responsabilidade direta às empresas pela correta guarda, conservação e distribuição desses produtos.
Essas normas formam a base regulatória para toda a cadeia de armazenagem – exigindo infraestrutura adequada, procedimentos operacionais padronizados e monitoramento contínuo em Centros de Distribuição, farmácias e também durante o transporte. Em teoria, garantem a integridade do produto da indústria até o ponto de dispensação.
“Na prática, porém, ainda existe um grande desafio no cumprimento dessas exigências, especialmente na etapa logística. É comum encontrar medicamentos sendo transportados em veículos sem isolamento térmico, sem controle de temperatura ou sem qualquer sistema de monitoramento. Essa fragilidade operacional compromete a cadeia de frio e coloca em risco a eficácia dos produtos, principalmente os termolábeis”, diz Gonçalves, da Frigo King. E acrescenta: para que as normas realmente cumpram seu papel, é necessário um esforço conjunto entre reguladores, Operadores Logísticos e empresas do setor para profissionalizar o transporte e garantir que os mesmos padrões exigidos nos ambientes fixos sejam respeitados também durante a movimentação dos medicamentos. A adoção de tecnologias validadas, capacitação das equipes e processos auditáveis são fundamentais para mudar essa realidade.
Liana, do Grupo Polar, também diz que a Farmacopeia Brasileira, em conjunto com a Lei nº 5.991/1973, influencia diretamente na garantia da segurança dos medicamentos, desde a produção até a entrega ao paciente. As normas impactam diretamente as condições de armazenagem em Centros de Distribuição, farmácias e drogarias, determinando critérios como faixa de temperatura, controle de umidade, organização do estoque e proteção contra luz ou contaminação cruzada.
A partir dessas normas, os estabelecimentos devem manter condições ambientais adequadas, com equipamentos de armazenagem qualificados, controle contínuo de temperatura e registros documentados. “Um dos requisitos, por exemplo, é o uso de termômetros calibrados e o monitoramento frequente da temperatura, garantindo que os medicamentos permaneçam dentro das condições especificadas na bula e nos registros oficiais. Além disso, essa legislação reforça a importância da rastreabilidade e da responsabilidade técnica, exigindo que os estabelecimentos contem com profissionais capacitados para supervisionar todos esses processos. Isso se aplica tanto aos medicamentos de uso geral quanto aos termolábeis”, diz a diretora Técnica e de Estratégia em Cadeia Fria do Grupo Polar.
Campos, da AGL Cargo, também enxerga que essas normas estabelecem critérios técnicos fundamentais, como temperatura controlada, ventilação, ausência de contaminação cruzada e separação por classes terapêuticas. A Lei nº 5.991/73, por exemplo, exige que o armazenamento e a distribuição de medicamentos sejam realizados sob responsabilidade técnica de farmacêuticos. Já a Farmacopeia define padrões de estabilidade e ensaios que impactam diretamente a forma como os produtos devem ser acondicionados e distribuídos.
Juliane, da Multilog, completa dizendo que no caso das empresas de logística, essas normas orientam a estruturação física, os processos operacionais e os controles técnicos dos Centros de Distribuição e do transporte, garantindo a conservação adequada dos produtos farmacêuticos para a segurança dos pacientes.
Tecnologias e procedimentos
O controle da cadeia do frio é um desafio técnico e operacional que exige tecnologias de ponta e procedimentos rigorosos para garantir a integridade dos produtos. Neste sentido, é utilizada uma gama de soluções para garantir a integridade dos produtos. Para monitoramento visual rápido e eficiente, são empregados indicadores de temperatura. Para um registro detalhado e preciso das condições ambientais, são utilizados data loggers eletrônicos de temperatura e umidade. Esses dispositivos fornecem relatórios completos, essenciais para a validação de processos e auditorias.
E para uma visibilidade completa e em tempo real, pode se contar com monitores de condição conectados. Este equipamento avançado monitora não apenas temperatura e umidade, mas também impacto, inclinação e localização GPS, enviando alertas instantâneos para intervenção proativa. Tudo isso é completado com embalagens térmicas validadas, mantas isotérmicas e gelos eutéticos, além da qualificação rigorosa dos modais de transporte, com estudos térmicos e mapeamento de rotas. Ainda de acordo com a análise do CEO da AHM Solution, todos esses dados são integrados a sistemas de gestão, permitindo auditorias completas e relatórios em tempo real, garantindo a conformidade e a segurança da carga.
Já Gonçalves, da Frigo King, revela que a manutenção da cadeia do frio depende de uma combinação precisa entre tecnologia embarcada, processos operacionais padronizados e monitoramento contínuo. No transporte de medicamentos e vacinas, especialmente os termolábeis, isso significa utilizar equipamentos qualificados com sistemas de refrigeração eficientes, sensores calibrados, data loggers e plataformas de rastreamento que permitam o acompanhamento em tempo real da temperatura interna da carga.
Além do controle térmico, são fundamentais procedimentos como a validação do equipamento (OQ e PQ), a análise de risco das rotas logísticas, o treinamento das equipes envolvidas e a adoção de planos de contingência bem definidos. Todos esses elementos atuam de forma integrada para garantir que o produto chegue ao destino com sua integridade preservada.
“Para garantir o controle de temperatura, é fundamental escolher um sistema – passivo ou ativo – capaz de manter a faixa térmica adequada, sem oscilações, durante todo o trajeto. Outro fator essencial é a escolha do tipo de gelo. O gelo em gel tradicional está se tornando obsoleto para o mercado farmacêutico. Atualmente, há opções mais modernas, como os gelos em espuma, que oferecem melhor desempenho térmico e evitam picos negativos de temperatura – algo especialmente importante para o transporte de vacinas. Também se destacam os PCMs (phase change materials), que mantêm a temperatura de forma mais estável e homogênea, prevenindo flutuações ao longo do percurso.”
Por fim – prossegue Liana, do Grupo Polar –, o monitoramento é indispensável. Há tecnologias que permitem acompanhar, em tempo real, as condições da carga, garantindo sua integridade no momento da entrega e possibilitando intervenções ao longo do trajeto para evitar excursões de temperatura.
“É fundamental ter um bom isolamento térmico e de alta eficiência nas carrocerias, além de utilizar sensores de temperatura e telemetria”, acrescenta Betina, da HC Hornburg.
Também segundo Campos, da AGL Cargo, soluções como data loggers e sistemas em nuvem para monitoramento em tempo real são utilizados. Além disso, há procedimentos como qualificação térmica das rotas, uso de embalagens passivas e ativas e planos de contingência robustos para desvios de temperatura. A automação e a visibilidade ponta a ponta são hoje diferenciais críticos para garantir a segurança dos medicamentos termolábeis.
Para assegurar o controle de temperatura e a integridade dos produtos termolábeis, a Multilog adota uma série de tecnologias e procedimentos:
• Sistemas de monitoramento contínuo de temperatura e umidade, com registros em tempo real e geração de relatórios gerenciais;
• Sensores com rastreamento via GPS, que permitem o acompanhamento da rota e das condições ambientais;
• Caminhões refrigerados e qualificados termicamente, adequados aos requisitos específicos de cada tipo de produto;
• Procedimentos operacionais padronizados, documentados e validados;
• Treinamento contínuo das equipes envolvidas, com foco na prevenção de desvios e resposta rápida a eventuais não conformidades.
“A sinergia entre essas tecnologias e práticas operacionais é fundamental para garantir a conformidade com as normas sanitárias e a qualidade dos produtos armazenados e transportados para os nossos clientes”, diz Juliane.
Riscos
Falhas no transporte destes produtos podem comprometer toda uma cadeia produtiva e assistencial. A perda de uma remessa por variações térmicas, contaminações ou atrasos em processos alfandegários exige o descarte imediato da carga e acarreta riscos à saúde pública, especialmente para medicamentos que seguem direto para a linha de produção. É o caso de produtos como a metformina, amplamente utilizada por pacientes com diabetes, cuja entrega precisa ocorrer semanalmente, com precisão absoluta. Além disso, itens como as canetas medicinais injetáveis, populares em tratamentos de emagrecimento, demandam refrigeração constante do ponto de origem até o destino final.
Nesses contextos, a operação logística deve garantir rastreabilidade total, validação térmica e soluções técnicas adaptadas para cada cenário. Durante a pandemia, essa realidade foi ainda mais crítica. Muitos insumos chegavam da Índia e precisavam ser entregues no Brasil em menos de 48 horas (contra os 7 a 9 dias habituais em trânsitos comerciais), um prazo desafiador diante de uma malha logística global congestionada.
Iluina, da Next Shipping, conta que um transporte inadequado pode resultar na perda de lotes inteiros, gerando prejuízos financeiros significativos para a empresa, uma vez que diversos medicamentos podem ser inutilizados.
“De acordo com o grau de complexidade do transporte, desenvolvemos soluções personalizadas, sempre garantindo a estabilidade térmica da carga. A matéria-prima precisa chegar exatamente no momento em que será utilizada, pois qualquer desvio, mesmo que mínimo, pode causar impactos críticos no processo produtivo da indústria farmacêutica”, explica Iluina.
No modal aéreo, produtos farmacêuticos bem identificados são classificados com prioridade, o que garante embarque mesmo em voos lotados. Já no modal marítimo, embora o controle também seja rigoroso, a lógica muda: não há prioridade de descarga, mas o cuidado recai sobre a estufagem, ou seja, a maneira como a carga é acondicionada no contêiner, além do registro da temperatura ao longo do percurso. No entanto, dependendo da característica do produto, como os que exigem temperatura ambiente, a estratégia muda. “Os congelados vão a -1ºC e seguem. Já a temperatura ambiente exige verificação a cada seis horas pela tripulação. É obrigatório ter uma embalagem identificada logo na porta, pois a Anvisa abre os contêineres assim que chegam, e retira amostras para cruzar com a documentação, com um dispositivo que registra toda a curva térmica da viagem. Qualquer variação registrada pode invalidar o lote”, afirma a consultora logística da Next Shipping.
Com relação aos riscos mais comuns no transporte de medicamentos termolábeis – e também como as transportadoras os mitigam –, Moreira, da AHM Solution, diz que eles são diversos, abrangendo desde falhas mecânicas e quedas de energia que afetam a refrigeração, até extravios, manuseio inadequado e exposição a temperaturas fora da faixa de segurança. Para mitigar esses desafios, a AHM Solution adota uma abordagem multifacetada. Em termos de temperatura, a visibilidade imediata do WarmMark QR no recebimento permite identificar rapidamente produtos que sofreram excursão. Para uma análise mais aprofundada, os data loggers eletrônicos fornecem o histórico detalhado das condições. E o SpotBot G oferece monitoramento ativo em tempo real, alertando sobre desvios de temperatura, impactos ou inclinações, e até mesmo atrasos na rota via GPS.
“Isso nos permite uma tomada de decisão rápida em caso de incidente, acionando protocolos de contingência como a transferência para outro veículo ou o uso de equipamentos auxiliares. Complementamos com redundância de dispositivos térmicos, treinamento constante das equipes e análise prévia das rotas, garantindo que cada etapa seja controlada e que a integridade do produto seja mantida.”
De fato, o transporte de medicamentos termolábeis envolve riscos relevantes, principalmente relacionados à variação de temperatura, que pode comprometer a eficácia e a segurança dos produtos. Entre os principais riscos estão o desligamento acidental do equipamento de refrigeração, falhas técnicas durante o trajeto, abertura indevida de portas, sobrecarga térmica ao carregar ou descarregar o veículo e a ausência de monitoramento contínuo. Gonçalves, da Frio King, também destaca que em rotas mais longas ou com variações climáticas intensas, o risco se agrava ainda mais. Para mitigar esses riscos, as transportadoras têm investido em equipamentos refrigerados com tecnologia capaz de manter a temperatura estável, mesmo diante de oscilações externas. O uso de sensores calibrados, data loggers e sistemas de monitoramento remoto também tem se tornado uma prática essencial. Além disso, são implementados procedimentos operacionais padronizados (POPs), análise de risco por rota, capacitação da equipe e planos de contingência que permitem uma ação imediata em caso de falha.
O fato é que em um país como o Brasil, o transporte de medicamentos termolábeis envolve diversos riscos. Um dos principais é a capacitação dos envolvidos na logistica: o alto índice de rotatividade nas equipes operacionais, muitas vezes sem o treinamento adequado, compromete o conhecimento sobre a importância do controle de temperatura e os cuidados necessários para garantir a integridade dos produtos.
Outro risco recorrente – e também apontado por Liana, do Grupo Polar – está em processos mal estruturados, como a qualificação inadequada de equipamentos – geladeiras, freezers, caixas térmicas –, sem seguir os requisitos da Anvisa ou as normas internacionais, o que as torna pouco confiáveis. Também são comuns erros na montagem das caixas térmicas, como a redução da quantidade de gelo para acomodar mais produtos, o que pode causar falhas no controle térmico.
Para mitigar esses riscos – ensina a farmacêutica –, transportadoras e Operadores Logísticos precisam investir em treinamento contínuo, garantir o cumprimento rigoroso da RDC 430 e atuar como referência em boas práticas no setor.
Há ainda riscos associados ao transporte aéreo, como falta de prioridade no embarque, horários de corte e o manuseio inadequado das caixas em câmaras frias, que podem acabar congelando os produtos. Problemas como greves, más condições das estradas ou barreiras fiscais também podem interromper a rota de transporte. Até mesmo a troca do gelo deve seguir um processo previamente qualificado, a fim de evitar desvios dos parâmetros estabelecidos, acrescenta Liana.
Há, ainda, a perda do produto causada pelo transporte em carrocerias de revestimento inadequado e sem controle de temperatura, lembra Betina, da HC Hornburg. Todo cuidado é essencial e por isso orienta-se os Operadores para fazerem a manutenção periódica dos equipamentos de refrigeração e das carrocerias frigoríficas.
Para mitigar o risco de exposição dos medicamentos termolábeis a temperaturas fora das faixas recomendadas pelos fabricantes, o que pode comprometer a sua estabilidade e eficácia, a Multilog adota diversas estratégias:
• Monitoramento contínuo da temperatura em tempo real;
• Qualificação térmica dos veículos utilizados;
• Planejamento logístico eficiente, com rotas otimizadas e controle rigoroso dos tempos de trânsito;
• Capacitação das equipes para o correto manuseio dos produtos e atuação em situações de emergência.
“O sucesso na mitigação desses riscos está diretamente relacionado à combinação de infraestrutura adequada, tecnologia embarcada e qualificação dos profissionais envolvidos, motivo pelo qual a Multilog investe na capacitação contínua dos colaboradores envolvidos no manuseio de cargas sensíveis, como medicamentos e insumos farmacêuticos”, completa Juliane.
Certificações e autorizações
Para atuar legalmente no transporte e armazenagem de medicamentos e produtos termolábeis, uma empresa precisa obter duas autorizações fundamentais: a Autorização de Funcionamento de Empresa (AFE), emitida pela Anvisa, e a Licença Sanitária, emitida pelos órgãos de vigilância sanitária estadual ou municipal, conforme a localização da operação.
A AFE, explica o gerente de Vendas da Frigo King, comprova que a empresa está habilitada a exercer atividades reguladas pela Anvisa, como armazenagem, distribuição e transporte de medicamentos. Ela só é concedida após análise da documentação da empresa, incluindo infraestrutura, procedimentos operacionais, responsável técnico e cumprimento das Boas Práticas.
Já a Licença Sanitária é concedida após inspeção do estabelecimento pela vigilância local, que verifica as condições higiênico-sanitárias, a adequação física e a conformidade com a legislação vigente, como a RDC nº 430/2020. Além disso, quando se trata de medicamentos sob controle especial, como psicotrópicos, a empresa também precisa de autorizações adicionais para atividades com produtos sujeitos a controle especial, incluindo a escrituração específica e o envio de relatórios periódicos ao Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC).
“Essas exigências regulatórias têm como objetivo garantir a rastreabilidade, a segurança sanitária e a integridade dos produtos durante todo o processo logístico. Estar devidamente autorizado e regularizado é condição indispensável para atuar nesse segmento com responsabilidade e dentro dos parâmetros legais”, completa Gonçalves.
Liana, do Grupo Polar, também lembra que, dependendo do tipo de atividade ou do produto, pode ser necessário um Certificado de Boas Práticas de Fabricação, Distribuição ou Armazenagem. E ainda, como apontado por Campos, da AGL Cargo, dependendo da natureza da carga (medicamentos controlados, imunobiológicos, etc.), podem ser necessárias também habilitações específicas junto ao Ministério da Saúde. “Empresas que atuam com transporte internacional precisam seguir a norma como se elas também fossem donas do medicamento, por conta da responsabilidade compartilhada.”
Rastreabilidade
Também é interessante notar como funciona a rastreabilidade de vacinas e medicamentos em conformidade com o Sistema Nacional de Controle de Medicamentos (SNCM), instituído pela Lei nº 11.903/2009.
Este Sistema foi criado para garantir a rastreabilidade de medicamentos em toda a cadeia logística, desde a fabricação até o consumidor final. Ele estabelece a obrigatoriedade de registro, armazenamento e transmissão eletrônica de dados que permitam acompanhar cada etapa da movimentação do produto.
Na prática, diz Gonçalves, da Frigo King, isso significa que cada unidade de medicamento deve receber uma identificação única — geralmente um código de barras bidimensional (2D DataMatrix) — que contém informações como número de lote, data de validade e número serial. A cada movimentação, seja ela entre fabricantes, distribuidores, transportadores ou estabelecimentos de saúde, essas informações são capturadas e enviadas para a base central do SNCM, permitindo a rastreabilidade completa e em tempo real. Esse controle fortalece o combate à falsificação, desvios e perdas, além de permitir ações mais eficazes em casos de recolhimento.
No caso de vacinas e medicamentos termolábeis, a rastreabilidade deve estar associada também ao controle de temperatura, garantindo que o histórico do produto inclua informações ambientais que comprovem sua integridade durante o transporte e armazenagem.
“Apesar de o SNCM ainda estar em fase de implementação plena em algumas cadeias, ele representa um avanço essencial para a segurança sanitária no país. Seu sucesso, no entanto, depende do comprometimento de todos os elos da cadeia – indústria, Operadores Logísticos, distribuidores e estabelecimentos de saúde – com tecnologia adequada, processos estruturados e cultura de qualidade”, acentua o gerente de Vendas da Frigo King.
Penalidades e sansões
São várias as penalidades ou sanções que as empresas podem sofrer em caso de descumprimento das normas sanitárias e de segurança durante a armazenagem ou transporte desses insumos.
“As penalidades vão desde advertências e multas até a interdição das atividades da empresa. Em casos mais graves, como danos à saúde pública, pode haver sanções civis e criminais, incluindo responsabilização dos dirigentes. Além disso, o descumprimento pode comprometer contratos com laboratórios e órgãos públicos”, diz Moreira, da AHM Solution.
Já Gonçalves, da Frigo King, lembra que o descumprimento das normas sanitárias e de segurança no transporte e armazenagem de medicamentos e vacinas pode gerar sanções administrativas, civis e até criminais, conforme previsto na Lei nº 6.437/1977, que trata das infrações à legislação sanitária federal.
As penalidades vão desde advertências formais e multas, que podem variar de R$ 2 mil a R$ 1,5 milhão, dependendo da gravidade da infração, até medidas mais severas, como interdição do estabelecimento ou do veículo, cancelamento da autorização de funcionamento, apreensão de produtos, suspensão da atividade e responsabilização do responsável técnico.
Em casos em que o transporte inadequado compromete a eficácia do produto e coloca em risco a saúde pública, também pode haver sanções penais, com base no Código Penal, especialmente se for comprovado dolo, negligência ou omissão. Além disso, o descumprimento de exigências como a rastreabilidade, controle de temperatura e ausência de qualificação de equipamentos pode levar à perda de contratos com o setor público, bloqueio de licitações e danos à reputação institucional da empresa.
“Diante disso, o cumprimento rigoroso das normas da Anvisa e dos órgãos de vigilância sanitária não é apenas uma obrigação legal, mas uma questão estratégica para a sustentabilidade e credibilidade de quem atua no setor de transporte e armazenagem de insumos de saúde”, alerta o gerente de Vendas da Frigo King.
Além de tudo isto, o descumprimento das normas pode acarretar danos à reputação e perda de credibilidade no mercado, avisa Liana, do Grupo Polar, lembrando, também, que a aplicação dessas sanções depende da natureza e da gravidade da não conformidade, da interpretação do auditor ou fiscal responsável e de outros fatores que influenciam a decisão final das autoridades sanitárias.
“O risco de contaminação e a falta de eficácia da medicação são consequências que ninguém pode pensar em acontecer”, completa Betina, da HC Hornburg.
Participantes deste matéria
AHM Solution – Oferece soluções para eliminar ou reduzir os riscos de acidentes e avarias, como sistemas de detecção de pedestres, sistemas de alertas visuais e sonoros, registradores de impacto, tombamento e temperatura das cargas e garfos que aumentam a produtividade das empilhadeiras, entre outros.
Frigo King – É especializada no transporte em baixas temperaturas de cargas perecíveis e sensíveis realizado em caminhão refrigerado. Oferece equipamentos de refrigeração divididos nas linhas Titan, Apollo, Flex e SA1.
Grupo Polar – Atua na fabricação de caixas, bolsas térmicas, data loggers, rastreadores e monitores de temperatura, incluindo serviços de qualificação, treinamento e consultoria.
HC Hornburg – É fabricante de carrocerias e semirreboques para transporte frigorificado, oferecendo, ainda, vários produtos para atender este segmento.
Jackson Campos – Além da AGL Cargo, atua com comércio exterior e relações governamentais há anos, destacando-se em aspectos relacionados à importação, exportação, comércio exterior e lobby. Também é Fellow do CBEXs.
Next Shipping – É uma empresa de logística internacional que oferece soluções em transporte marítimo, aéreo, projetos especiais, seguro internacional e logística integrada.
Multilog – É considerada uma das maiores operadoras de logística integrada do País e líder na administração de recintos alfandegados no Brasil, incluindo os pontos de fronteiras secas no Mercosul. Possui certificação de Operador Econômico Autorizado (OEA) para atuar em cinco centros logísticos industriais e aduaneiros e dois portos secos.
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