Apesar dos avanços alcançados nos últimos anos, o setor de transporte rodoviário de cargas possui uma baixa participação das mulheres em áreas operacionais do serviço. De acordo com estudos do Instituto Paulista do Transporte de Cargas (IPTC), no ano passado, foram registradas 13.471 contratações femininas; enquanto os homens tiveram 125 mil. Se, no geral, o Instituto aponta para a porcentagem de 1,51% de mulheres caminhoneiras no Brasil, no segmento de produtos químicos e/ou perigosos, essa margem é menor, devido ao baixo estímulo para a ocupação dessa função.
Para servir de exemplo e iniciar uma mudança no cenário, a Zorzin Logística, transportadora especializada no ramo, cuja matriz localiza-se em Mauá (SP), anunciou, em 29 de junho, uma de suas ações específicas para trabalhar a questão: o seu primeiro caminhão personalizado para mulheres. “A iniciativa faz parte de uma série de ações internas que realizaremos para incentivar a contratação de caminhoneiras em nossas operações e filiais”, afirmou a diretora administrativa da empresa, Gislaine Zorzin.
A gestora diz que a ideia surgiu com base no compromisso estabelecido pela transportadora com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. A igualdade de gênero é o 5º objetivo definido na proposta da Organização, que, para se tornar uma realidade, conta com o apoio das empresas, do setor público e da sociedade civil.
“O Movimento Vez e Voz, criado pelo Sindicato das Empresas do Transporte Rodoviário de Cargas de São Paulo (SETCESP), representa um verdadeiro avanço nas buscas por ações concretas de incentivo à participação das mulheres no nosso setor. Ainda somos um setor predominantemente masculino, porém, as entidades, sejam as do próprio transporte rodoviário de cargas como a de áreas próximas, já incluem no escopo dos seus trabalhos ações e a realização de pesquisas para caminharmos em direção a um cenário diferente”, explica Gislaine.
No início do ano, a empresa assinou, em conjunto com a Associação Brasileira de Indústria de Cloro-Álcalis (Abiclor), o Pacto de Sustentabilidade da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). O compromisso é uma iniciativa que visa contribuir com os ODS da ONU e sinaliza quais empresas consideram o trabalho de ESG uma prioridade de seus valores institucionais.
De acordo com a economista do IPTC, Raquel Serini, apenas 24% das empresas de transporte possuem o apoio à diversidade e à inclusão entre as suas diretrizes institucionais. Esse número cai para 20%, se olharmos para quantas empresas avaliadas de fato criam políticas para proporcionar um ambiente de trabalho mais propício para a introdução de mulheres nos diferentes setores de uma transportadora.
Assim, segundo Serini, cria-se um desestímulo, que é responsável, em parte, pelo índice de 1/3 de evasão de profissionais mulheres no TRC. Gislaine, por sua vez, acredita que, no caso das caminhoneiras, o trabalho de inclusão e de criação de melhores condições também envolve a estruturação de políticas públicas de infraestrutura nas estradas voltadas à segurança e ao bem-estar das mulheres. A empresária também lembra da importância de se pensar em um apoio específico àquelas que precisam lidar com a dupla jornada de trabalho enquanto realizam a rotina de trabalho com o transporte.
“Há muitos detalhes psicológicos, administrativos e organizacionais a serem considerados se as transportadoras querem de fato passar às mulheres que lá é um local onde elas podem se sentir seguras. Isso em segmentos com procedimentos padrão. No caso de produtos perigosos, existem outros fatores a serem considerados, como o estigma de associar a mulher a apenas atividades delicadas, ou mais simples, entre outros. Enquanto empresária, digo que a solução é irmos passo a passo. Já temos uma motorista para veículos menores e o objetivo é observarmos como esse processo flui para, então, analisarmos como podemos evoluir. Temos em mente que, com essa questão, o objetivo é sempre aumentar o número de contratações e jamais estagnar”, finaliza Gislaine.