Além de ser fundamental para a manutenção da saúde financeira do hospital ou clínica, a logística adequada dos suprimentos – equipamentos, próteses, medicamentos e diversos outros materiais – ajuda a preservar o nosso bem maior: a vida.
No Brasil, os insumos médicos são responsáveis pelo segundo maior custo nas instituições de saúde, perdendo apenas para a folha de pagamento, segundo pesquisa da consultoria McKinsey. O índice de obsolescência chega a 20%, levando a perdas de até 15% da margem financeira de um hospital.
Além disso, os erros de medicação ocorrem em até 33% das internações. Ou seja, de cada dez remédios que pacientes recebem em hospitais e clínicas, três sofrem alguma intercorrência, por erro no medicamento administrado, no horário, na dose ou na via.
Um estudo da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz), com hospitais públicos do Rio de Janeiro, mostrou que apenas 10% das farmácias hospitalares fazem seu planejamento com objetivos e metas. E, ainda, somente 15% utilizam a curva ABC para programação dentro daqueles que possuem uma relação de produtos para compra.
Todos esses dados, apontados por Mayuli Fonseca, diretora de novos negócios da UniHealth Logística Hospitalar (Fone: 11 3555.5800), querem dizer uma coisa: que o investimento nesse setor é fundamental.
Isso porque a logística hospitalar é o processo de gerenciar estrategicamente e racionalmente a aquisição, a movimentação, a armazenagem e o transporte de materiais médico-hospitalares, medicamentos e outros itens necessários ao funcionamento de unidades hospitalares, clínicas, laboratórios de análises e unidades de pronto atendimento. “Seus objetivos são preservar a vida e restaurar a saúde dos pacientes com qualidade, baixo custo e retorno satisfatório para a instituição ou empresa”, explica Ronaldo Campos, assessor da superintendência comercial da Patrus Transportes Urgentes (Fone: 31 2191.1000).
Ao contratar os serviços de um Operador Logístico, os hospitais ganham um controle rígido de entrada e saída de medicamentos, insumos e consignados, que são itens de alto valor agregado, como também de itens de baixa criticidade, como é o caso de produtos de escritório, marketing e higiene.
Patrícia Lazzarini, gerente farmacêutica hospitalar da RV Ímola Transporte e Logística (Fone: 11 2404.7070), lembra que, em todos os casos, é necessário usufruir de um sistema compatível com o sistema ERP do cliente, para que a rastreabilidade seja realizada em sua integralidade. “O custo da operacionalização depende do tipo de hardware utilizado e da quantidade de equipamentos de automação adquirida. Para os itens críticos, deverão ser usados itens que garantam a segurança na dispensação dos produtos até a administração aos pacientes, como leitores óticos, coletores de dados e aparelhos mobiles.”
Já no que diz respeito aos itens de menor criticidade, Patrícia conta que a padronização de processos em conjunto com um sistema WMS adequado e uma equipe bem treinada já faz a diferença. “Em casos mais complexos, podemos citar a utilização dos robôs, dispensários eletrônicos, torres de armazenagem e máquinas unitarizadoras de última geração”, ressalta.
Entre as características do setor está a variação dos produtos para transporte. Apenas falando em tamanho e peso, as diferenças entre remédios ou kits de diagnóstico e equipamentos de análise, como ressonância magnética, são de 10 quilos para duas toneladas, ou seja, cada item requer cuidados específicos. É o que explica Ricardo Soares, gerente de contas da Unicargo Transportes e Cargas (Fone: 11 2413.1700).
Os remédios, por exemplo, não podem ter qualquer avaria, como um simples amassamento na caixa máster. Kits diagnósticos, reagentes ou vacinas precisam ter a temperatura controlada: de 15º C a 25º C (ambiente), entre 2º C e 8º C (perecível), -20º C (congelada com gelo seco) e inferior a -150º C (congelada em nitrogênio líquido).
“Equipamentos de análise são sensíveis, pois precisam de calibragem e requerem suspensão pneumática para neutralizar os impactos de transporte. Além disso, há produtos classificados como perigosos, que possuem código ONU e necessitam de documentação, manuseio e segregação especiais, como sprays aerossóis, acondicionados em nitrogênio líquido ou itens que contenham baterias”, expõe Soares.
Importante ressaltar que se o processo não for executado corretamente, pode comprometer a imagem institucional e a competitividade das empresas, sem falar na vida dos pacientes que precisam dos produtos, sejam eles equipamentos, próteses ou medicamentos. “Essa logística exige um conhecimento profundo não apenas de transporte, armazenagem e gestão desses itens, mas, também, da área da saúde, que exige cuidados específicos”, acrescenta Marcelo Azevedo, gerente de desenvolvimento e projetos da Ativa Logística (Fone: 11 2902.5000).
Raul Maudonnet, sócio-diretor da MXP Multimodal (Fone:11 4431.7300), acrescenta que este segmento sofre com a restrição no horário de recebimento por parte dos hospitais, que normalmente recebem mercadorias somente até as 16 horas. “E, ainda, como não há especialização no recebimento de materiais e insumos, é vital que o transportador disponibilize ferramentas que permitam ao cliente acompanhar o fluxo de informações, já que muitas vezes há desencontros dentro dos departamentos do hospital. Por isso, é fundamental que a informação seja disponibilizada em tempo real e que seja enviada ao remetente a imagem do comprovante de entrega devidamente assinado”, expõe.
De fato, a logística hospitalar atende a um setor extremamente exigente, talvez o que mais demande responsabilidade. “Em função dessa criticidade, os embarcadores são rigorosos na seleção dos seus parceiros logísticos que, necessariamente, precisam operar com alta performance”, lembra João Daher, gerente de operações da Via Pajuçara (Fone: 11 3585.6750).
Melhoria dos processos
Ao contrário do que muitas pessoas imaginam, a logística na área hospitalar abrange muito mais do que o gerenciamento de medicamentos e outros materiais médicos, informa Patrícia, da RV Ímola.
Na verdade, pode-se considerar que o termo “logística hospitalar” é a melhoria de processos dentro da instituição que proporciona ganho de produtividade e controle das informações com a adoção de tecnologia de ponta e, principalmente, com a mudança de paradigmas na gestão, tendo como foco a melhoria na qualidade do atendimento e a preservação da vida e da saúde dos pacientes. “Esta gestão pode ser realizada tanto nas áreas de apoio como nas assistenciais, porém, conseguimos ter maior visibilidade no setor de suprimentos”, considera.
Por sua vez, Campos, da Patrus, explica que a logística hospitalar envolve o conjunto de procedimentos de gestão, planejados e implementados a partir de bases cientificas e técnicas, normativas e legais, com o objetivo de garantir rastreabilidade, qualidade, eficácia, efetividade, segurança e, em alguns casos, o desempenho das tecnologias de saúde utilizadas na prestação de serviços. “Ela exige dos operadores e transportadores especialização para levantar os requisitos dos clientes, constituir um corpo de responsáveis técnicos que mantenham a interação com o cliente em conjunto com as equipes comercial, buscando identificar o perfil da demanda para apresentar uma solução dentro dos ativos e infraestrutura da empresa.”
Azevedo, da Ativa, faz uma lista do que envolve a logística do setor:
• Alta qualidade na gestão de estoques;
• Agilidade na operação para atender a demanda;
• Logística reversa comprometida com qualidade e responsabilidade;
• Manuseio e packing adequados;
• WMS capaz de gerir produtos, equipamentos e peças de manutenção;
• Armazém adequado às exigências da Anvisa;
• Processos operacionais detalhados, escritos e divulgados; e
• Treinamento do efetivo para compreensão da responsabilidade da operação perante o mercado.
Desafios
O setor opera sob a fiscalização da Anvisa, portanto, os transportadores e Operadores Logísticos precisam ser credenciados. No entanto, segundo Daher, da Via Pajuçara, o processo é burocrático e as exigências envolvem infraestrutura adequada – piso com revestimento em epóxi, área climatizada com controle de temperatura, paletes higienizados –, procedimentos especiais – movimentação e armazenagem de produtos médico-hospitalares isoladas de alimentícios, produtos de limpeza e outros não afins – e mão de obra especializada, incluindo a participação de farmacêuticos na operação.
“Contrapondo-se à própria recessão do país, a área se expande ano após ano, impulsionada pelo aumento da população de maior idade e por se tratar de produtos e equipamentos vitais, que não podem deixar de ser consumidos ou utilizados em função da crise financeira. Houve um cerceamento na concessão de crédito, em função da inadimplência de muitos hospitais, mas não o suficiente para impedir o crescimento do setor”, analisa Daher.
Os embarcadores, bem como os Operadores Logísticos, controlam detalhadamente os vencimentos dos produtos através da metodologia FEFO (First End, First Out), sempre escoando o que foi produzido primeiro. Para muitos itens, todas as etapas precisam ocorrer com agilidade (produção x armazenagem x transporte x consumo) porque os vencimentos são breves. “Quem opera nesse segmento precisa se adaptar, comprometendo-se com prazos de entrega mais agressivos e com senso de prioridade para esse perfil de carga”, continua o profissional da Via Pajuçara.
Para Patrícia, da RV Ímola, existem inúmeros desafios e o motivo é simples: o serviço ofertado pelas empresas não é passível de trocas e devoluções, já que é a preservação da vida do paciente. “O parceiro em logística hospitalar deverá ser capaz de entregar um gerenciamento rigoroso, garantindo redução de desperdícios, que são oriundos de compras inadequadas, conferindo uma nova era para a gestão de insumos médicos, tanto nas áreas públicas, quanto privadas.”
Ela diz que, para tanto, existe um alto custo no desenvolvimento de ferramentas que garantam essa expectativa de resultado, como um software adequado. “Além disso, a diversidade da área é tão extensa que as adaptações aos sistemas são constantes, envolvendo critérios de excelência na contratação de profissionais especializados com atualização permanente.”
Patrícia acrescenta que outro fator relevante é o entendimento da necessidade dos clientes, visto que hospital é um setor peculiar com exigências diferenciadas junto às operadoras de saúde, Anvisa e certificadoras, sendo assim, é muito importante ter dentro da equipe multidisciplinar uma gama de profissionais específicos para estas áreas. “Não podemos deixar de mencionar a necessidade do rápido atendimento às solicitações de entregas de urgências e emergências e o acompanhamento na movimentação e no transporte das mercadorias em tempo real, garantindo o suprimento necessário para o melhor andamento da instituição.”
Esses desafios podem ser vencidos, de acordo com ela, através da contratação de equipe técnica especializada e devidamente treinada, investimento em aperfeiçoamento em software WMS e em novas tecnologias e na implantação de Centros de Distribuição especializados que possam ter sua despesa compartilhada entre seus clientes, além do investimento em carros próprios.
Os principais desafios logísticos, na opinião de Azevedo, da Ativa, são: adequação do armazém para atender às especificações e demandas dos clientes e órgãos públicos; entregas cada vez mais em menores quantidades e mais frequentes, visto que as áreas de estoques dos laboratórios, consultórios e hospitais estão diminuindo; armazenagem capacitada para atender a todos os tipos de produtos e equipamentos, pois há grande variação de dimensões e pesos dos itens estocados; e rapidez na informação logística em tempo real.
“Eles podem ser superados com investimento em tecnologia e treinamento; atendimento ágil e assertivo com informações em tempo real da operação; e contando com Operador Logístico/transportadora devidamente certificado pelos órgãos competentes”, salienta.
Soares, da Unicargo, cita a morosidade para emissão ou renovação de certificações e documentos obrigatórios – em sua maioria fornecidos por órgãos públicos –, que cria uma vulnerabilidade na relação fornecedor x cliente. “O OL e a transportadora têm o papel fundamental de ‘mimar’ seu cliente, executando atividades adicionais ao transporte, como assessorando-o para emissão de Shipper Declaration para produtos perigosos, avaliando as condições da embalagem e sugerindo melhorias, desenvolvendo treinamentos e instruções de trabalho voltadas à operação do cliente e de outras formas que possam torná-lo especial”, conta.
De acordo com Campos, da Patrus, com o avanço das tecnologias digitais, os processos de certificação podem ser agilizados. As auditorias poderiam ser realizadas remotamente, e inserções esporádicas garantiriam a conformidade dos processos, objetivando a manutenção das boas práticas de armazenamento e transportes. “Todos os meses, as empresas prestadoras de serviços de operação logística e transporte recebem auditorias externas dos clientes que operam conosco. Acredito que estes relatórios deveriam ser compartilhados com os órgãos anuentes, que poderiam utilizá-los para agilizar os processos de renovação das licenças municipais”, considera.
Falta de investimento e foco na logística dentro das unidades de saúde são os desafios ressaltados por Mayuli, da UniHealth. “Muitas vezes, os locais são inadequados, com mão de obra desqualificada, equipamentos obsoletos, quando existentes, e pouquíssimo investimento em tecnologia. Essa realidade gera um processo manual, extremamente frágil, que impossibilita o controle efetivo de estoque, validades, metodologia e a qualidade na armazenagem”, conta.
Outro grande desafio, ainda segundo ela, é o investimento em automatização da cadeia de abastecimento sem a devida integração entre máquinas e processos, causando descredito e altos custos para as instituições. “É importante o entendimento que não basta só comprar uma máquina para resolver todos os problemas de gestão. É necessário adquirir o equipamento correto, para o local correto, criar o melhor custo x benefício e, ao mesmo tempo, adequar todos os processos e sistemas para que haja coesão no investimento”, expõe Mayuli.
Segundo ela, o Operador Logístico vem exatamente para resolver os dois maiores problemas: a falta de foco e a falta de coesão. “Com estruturas completamente dedicadas para a cadeia de abastecimento, o OL é capaz de fazer os investimentos necessários e, ao mesmo tempo, servir como integrador de processos, sistemas e automações, gerando eficiência e qualidade aos processos”, acrescenta.
Logística reversa
No setor médico-hospitalar, nada se descarta sem procedimentos específicos de coleta e, em grande parte dos casos, de incineração. Produtos vencidos ou avariados precisam, obrigatoriamente, seguir as instruções dos fabricantes para o descarte. “Normalmente, os transportadores coletam e encaminham para que os próprios fabricantes façam esse trabalho e, se for o caso, existem empresas especializadas na coleta e descarte do lixo hospitalar”, explica Daher, da Via Pajuçara.
A esse ponto, Campos, da Patrus, acrescenta que os fabricantes e/ou importadores devem comprovar a dispensação correta dos itens, apresentando os termos de descarte para fechamento de processos perante a Receita Federal, evitando a possibilidade de contaminação e risco à saúde pública.
Patrícia da RV Ímola, conta que um dos principais motivos da implantação da logística hospitalar é a diminuição da perda com produtos vencidos, porém, existem inúmeros fatores dentro de cada instituição hospitalar que pode fazer com que isto ocorra. Segundo a Resolução RDC nº 33/03 da Anvisa, os resíduos hospitalares são classificados em cinco tipos: Grupo A (potencialmente infectantes), Grupo B (químicos), Grupo C (rejeitos radioativos), Grupo D (resíduos comuns) e Grupo E (perfurocortantes), porém, para o Operador Logístico, o Grupo B é o mais significativo, já que será necessário dar o devido andamento no caso do vencimento de medicamentos, tendo a empresa que instituir um PGRSS – Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviço de Saúde. “Caso haja a anuência do cliente em casos de produtos vencidos no Centro de Distribuição contratado, os mesmos devem seguir para a incineração.”
Em se tratando de itens que podem ser reutilizados, Azevedo, da Ativa Logística, detalha o processo: vários produtos são enviados para os hospitais em kits ou embalagens másters e devem retornar para o armazém após a utilização de um ou mais itens da demanda em uma cirurgia ou procedimento médico. “Começamos então pela identificação do SKU, todos os produtos devem ser devidamente cadastrados com referências pela unidade e caixas máster, com os respectivos códigos de barras”, conta. O material que não foi utilizado deve ser devidamente embalado e enviado para o armazém. Recebido no armazém, a conferência deve ser rígida no tocante à qualidade da embalagem, do produto e na conferência de referência x quantidade recebida. Após esta etapa, deve ser armazenado nos respectivos locais, respeitando a data de fabricação, o lote e a validade do item, para que esteja pronto para uma próxima demanda de picking & packing.
Maudonnet, da MXP Multimodal, diz que a LR do setor é um grande desafio, pois somente com um TMS/WMS de ponta é possível se fazer uma operação ágil e com assertividade.
Avaliação do Prêmio Top do Transporte
Veja a seguir como os participantes desta matéria especial avaliam o Prêmio Top do Transporte – promovido pelasrevistas Logweb e Frota&Cia – para este segmento.
“É de extrema importância que o mercado se torne cada vez mais profissional para que não haja concorrência desleal de valores de fretes, pois qualidade, investimento e manutenção de estruturas têm custos inerentes ao mercado e isso deve ser reconhecido. Portanto, o Prêmio Top do Transporte é fundamental para que as empresas conheçam e deem o referido valor àquelas que prezam pela qualidade e manutenção de suas certificações.”
Marcelo Azevedo, gerente de desenvolvimento e projetos da Ativa Logística
“O Prêmio Top do Transporte têm muita relevância neste segmento, pois é o setor mais preocupado com certificações e garantias de qualidade.”
Ricardo Soares, gerente de contas da Unicargo Transportes e Cargas
“Acreditamos que por se tratar de um Prêmio concedido por meio de eleição dos embarcadores, ser indicado é muito importante para a ampliação de nosso reconhecimento entre os clientes atuais e os novos.”
Ronaldo Campos, assessor da superintendência comercial da Patrus Transportes Urgentes
“Para fazer o transporte de medicamentos e correlatos, é de extrema importância que os carros sigam os requisitos de Boas Práticas para o Transporte de Cargas, com limpeza e temperatura adequadas, sendo monitorados desde o momento da expedição até o destino final. Assim, é importante que o transportador seja avaliado de acordo com sua qualidade no transporte, para a preservação dos produtos até o momento da sua administração aos pacientes.”
Patrícia Lazzarini, gerente farmacêutica hospitalar da RV Ímola Transporte e Logística
“A importância do Top é destacar as empresas que realmente primam pela qualidade como diferencial na prestação de serviço.”
Mayuli Fonseca, diretora de novos negócios da UniHealth Logística Hospitalar