Em face do meu trabalho, lá pelos idos do ano 2000 comecei a fazer palestras, lecionar e a escrever sobre logística. Mais à frente, diante da infinidade de assuntos produzidos pela nossa classe política, também ousei escrever sobre política. E por “ossos de formação”, inclusive como professor universitário, e por sempre entender que ela é indissociável da política, também comecei a escrever sobre economia. Ousadia pura, em todos os casos.
Fico confortado, e estimulado a continuar escrevendo, por ter recebido, ao longo do tempo, mais críticas boas do que ruins. Além, é claro, e aí vai uma avaliação particular, o fato de me deparar, quase que diariamente, com muito material ruim publicado. Não tenho dúvidas, ignorância, má fé, hipocrisia e desonestidade intelectual multiplicam-se nas matérias que brotam na mídia brasileira, principalmente nos últimos 10 ou 15 anos. Lamentavelmente, ‘fake news’, ‘pós-verdade’ e ‘politicamente correto’ tornaram-se características marcantes da mídia brasileira e mundial, contribuindo ainda mais para “o samba do crioulo doido”.
Uma observação que a maioria de ‘meus leitores’ (desculpem-me a presunção) faz é a de que, no final de cada artigo, eu coloco uma mensagem de esperança. Depois de comentar sobre alguns dos problemas relativos ao tema proposto, eu sempre procuro alinhavar algumas propostas de solução. Se as críticas são com relação à economia, sempre faço algumas observações que indicam possibilidades de melhoras. Se o problema é a política, tendo a crer que nossas classes dirigentes, pressionadas pela população, cada vez mais vigilante e mobilizada, forçará a busca de soluções aos impasses e conflitos existentes. E assim por diante. É óbvio que não se trata de uma esperança baseada nos contos de fadas nos quais ‘tudo acaba bem’. A esperança expressada e as expectativas de melhoras comentadas estão baseadas em possibilidades reais e disponíveis e de acordo com as circunstâncias que se apresentam. E mais do que tudo, são esperanças que se alicerçam na presunção de que a construção de algo bom é o mais provável resultado de um trabalho sério e de uma postura e um comportamento correto, honesto, digno e justo daqueles que o realizam. Dessa forma, sempre é possível, quase uma certeza, propor e realizar melhorias em tudo o que ‘não está bom’.
Eu sempre acreditei no trabalho como uma das formas de se alcançar o que se busca. Mas, como comentado anteriormente, sempre acreditei no trabalho sério, que almeja somente o ‘possível’, pois por mais óbvio que possa parecer, o impossível é algo fora de nosso alcance. Exceto nos manuais de autoajuda e nos discursos de mentirosos e demagogos.
Portanto, ao falar em trabalho, refiro-me ao esforço que todo ser humano, respeitando o direito dos outros, tem de fazer para atingir seus objetivos e realizar sonhos e desejos. E que, quando bem executado, ainda contribui direta ou indiretamente para o bem da sociedade, gera satisfação pessoal, crescimento profissional a aumento da autoestima.
Nos últimos ‘papos’ que tive com amigos, observei dois tipos de comentários distintos: um era de que as “coisas” não estavam caminhando bem e, portanto, a esperança observada nos finais da maioria de meus artigos talvez não se justificasse. O outro comentário era para que eu enfatizasse um pouco mais também o que de ‘bom’ vem acontecendo, uma vez que está cada vez mais difícil ouvir o noticiário diário, ruim em quase tudo que diz respeito ao Brasil.
Sou uma pessoa esperançosa por natureza, mas, às vezes, muito cética em relação ao ser humano e ao futuro do mundo e, mais precisamente, com relação ao Brasil. Estão aí os problemas geoeconômicos e geopolíticos do momento, o avanço do populismo de direita, o desastre ambiental, o terrorismo, as pandemias e as guerras, como alguns exemplos no campo internacional. Se bem que alguns não são problemas novos, o agravamento tem sido característica de muitos deles.
As necessidades de adaptação de toda a sociedade às mudanças climáticas, por exemplo, não é assunto novo. A diferença é que seus efeitos estão chegando a todos os países, independentemente do seu nível de desenvolvimento. Os efeitos alcançam, inclusive, as grandes cidades.
Desigualdade social, econômica, de gênero, raça ou cor, concentração de renda, Congresso Nacional inoperante e sem compromissos mais sérios com o país, corporativismo burro, corrupção, tráfico e comercialização de drogas e armas, violência urbana, por outro lado, são alguns dos exemplos brasileiros. A desordem ‘institucional’ é enorme.
O motivo desta ‘peroração’ e deste texto, e mesmo que superficialmente, é tentar entender o que ocorre no Brasil e onde buscar soluções, considerando que a situação em nosso País está se tornando ‘assustadora’.
Já falei e escrevi muito sobre algumas das diversas dificuldades pelas quais passava e passa nosso País, mas sempre, como já salientado, finalizando com uma mensagem de esperança, posto que acreditava existir, naquele momento, base sólida para o correto encaminhamento das soluções que se faziam necessárias. E havia tempo!
Entretanto, a evolução dos fatos e o noticiário não nos deixa respirar e parece incrível como tudo está piorando, apesar de parecer o contrário para muitos, posto que há uma movimentação, quase invisível para a maioria, para que se estabeleçam controles em ‘quase tudo’, na política, na economia, na sociedade e, até, nas religiões e nas discussões relativas a ‘costumes’.
Ontem negava-se a pandemia da Covid-19, hoje nega-se a real tentativa de golpe ocorrida em oito de janeiro do ano passado. Ontem negava-se a existência de uma crise climática, hoje vive-se os horrores provenientes dela. E ao invés de se discutir os reais problemas do Brasil, perde-se tempo com temas que interessam apenas à classe política (eleições das presidências da Câmara e do Senado, “emendas secretas” e “anistia” para os criminosos de 08/01, por exemplo). São temas colocados em discussão como forma de ‘chantagem’ ou para tumultuar o ambiente e esconder aquilo que não se quer discutir. Exemplos? Criminalização dos viciados em maconha, proibição do aborto em todas e quaisquer circunstâncias, armamento da população, equilíbrio entre os três poderes etc.
Exemplo maior é que mesmo com as ações do Supremo Tribunal Federal, que age corretamente para proteger a Constituição e defender a “moralidade pública”, o montante de recursos destinados ao ‘tal’ do Orçamento Secreto (quase 20% das despesas discricionárias do Orçamento da União) tem sido, mais notadamente nos últimos 5 anos, cada vez maior. Vale à pena ler editorial do Estadão do último dia 12, “O Congresso está ‘de costas’ para o Brasil”.
Uma das consequências é a injusta, incorreta e inoportuna perseguição que se faz ao poder judiciário, mais precisamente ao Supremo Tribunal Federal e ao Ministro Alexandre de Moraes. Infelizmente, com a adesão de grande parte da imprensa e daqueles que temem o funcionamento correto, devido e imparcial da Justiça neste País. Com relação à imprensa, escrita ou falada e em todos os tipos disponíveis – muitos ainda sem controle – meu lamento é ainda maior, posto que esses diversos canais de informação e comunicação deveriam ser instrumentos para melhoria e aumento de compreensão sobre a vida, não só de cada um de nós, mas também de toda a sociedade.
Como se diz popularmente, “um prato cheio” para determinados partidos políticos (totalmente fracionados e enfraquecidos) e certas bancadas que só se movimentam para resolver seus próprios problemas. E lamentavelmente, quando se arvoram no direito de falar em nome da população brasileira, utilizam retóricas que, embora antigas, são persistentes, hipócritas e demagogas. Com as exceções de sempre, interessa a esses grupos apenas seus interesses muito particulares ou as próximas eleições, caso contrário, os temas (e as reformas) mais importantes para a vida do cidadão não estariam ‘engavetadas’ nas escrivaninhas do Congresso.
O que se percebe é que as disputas, afinal, são pelo poder. Não para que, a partir dele se busquem melhores soluções para os problemas da sociedade brasileira, mas o poder para continuarem a fazer o que querem, dificultando tudo ainda mais, pois se as soluções estão na convergência de objetivos, que por si só exige negociação e entendimento, isto está longe de acontecer, considerando as circunstâncias políticas atuais, dicotômicas e polarizadas.
Não tenho medo de afirmar que o maior problema brasileiro está em nosso Legislativo, preocupado apenas com seus problemas. E se o equacionamento das soluções exigidas somente poderá ocorrer quando praticarmos Política com P maiúsculo, o final de nossos problemas ainda está muito distante. O triste, nisso tudo, é o quanto essa situação é antiga e ‘sustentada’ por àqueles que se apoderaram do Estado.
“No radar do Congresso, a mobilizar todos os partidos, está apenas a manutenção do orçamento secreto, seja qual for a conformação técnica que essa indecência venha a ter de tempos em tempos” e as discussões a respeito da eleição das Mesas Diretoras da Câmara e do Senado, pois são essas as posições legislativas que se tornaram em eficazes “instrumentos de chantagem”. Seja para se aprovar a ‘anistia’ aos golpistas do 8 de janeiro, como “primeiro passo”, para posterior aproveitamento para os reais mandantes, incluindo-se aí o “golpista-chefe, Jair Bolsonaro”, como completou o Editorial do Estadão aqui citado. Não há qualquer dúvida quanto a isso.
Volto a repetir, apesar do visível agravamento de uma das maiores crises já ocorridas no Brasil, nossas classes dirigentes, principalmente a política, ainda não se deram conta e continuam ignorando a realidade e os problemas do País. Seja por ignorância, má fé, conveniência ou burrice.
A constatação de que a grande maioria de nossos representantes não está à altura das necessidades que se impõem neste momento, apenas nos deixa mais pessimistas. Eles, se sabem, não querem fazer o que precisa ser feito. “O Brasil é um País que tem medo de ir ao dentista. Está ficando banguela” foi o título de um texto que publiquei no dia 06/06/17. Como se vê, não é assunto novo.
Enquanto isso, a grande maioria da população brasileira, apesar de algumas variáveis econômicas favoráveis (crescimento da economia, queda significativa no desemprego, inflação sob controle e aumentos reais do salário-mínimo, por exemplo) não tem mais tempo, tampouco paciência e responderá, de uma forma ou de outra, nas próximas eleições.
Como já escrevi e publiquei aqui mesmo na Logweb, em artigo específico no dia 13 do mês passado (“Política e economia sempre precisaram caminhar juntas. Agora, mais do que nunca!”), é essencial que nosso Congresso, apoiado pelo Executivo e as principais lideranças empresariais, e sempre de acordo com as normas e procedimentos constitucionais, volte a funcionar orientado para o bem coletivo e do País. De forma séria, isenta e respeitando as regras e os mecanismos que protegem as instituições democráticas, as agendas de reformas precisam estar na ordem do dia. E nesse sentido será fundamental que se criem obstáculos para os assédios constantes dos líderes com ambições autoritárias, de esquerda ou de direita, posto que praticam um populismo que só admite resultados eleitorais quando ganham.
Não é possível antever o que acontecerá nas próximas eleições (2024 e 2026), considerando que há uma tendência, até mundial, de se votar “contra o sistema” e “fora da política”. Portanto, tanto poderemos nos aproximar da Venezuela, elegendo candidatos com ‘tendências’ ditatoriais, que acreditam resolver tudo na “porrada”, ou da Argentina, elegendo candidatos histriônicos que queiram punir e castigar, por “forra instantânea”, toda a sociedade brasileira, como definiu o jornalista Carlos Andreazza no Estadão do último dia 10 (“A punição eleita”). Entre esses dois extremos e as diversas outras opções, tudo será possível. Apesar de cético e não saber quais são as bases que me fazem acreditar nisso, minha esperança é a de que, pelo menos, mantenhamos a Democracia e o respeito à Constituição.