Em artigo exclusivo para a Logweb, a colunista Gabriela Guimarães, vice-presidente de Desenvolvimento de Novos Negócios da DHL Supply Chain, analisa os desafios logísticos enfrentados por empresas chinesas que operam no Brasil, especialmente no varejo digital, infraestrutura e setor automotivo.
A presença de empresas chinesas no Brasil já tem algumas décadas, mas é notável como esse movimento ganhou impulso nos últimos três anos, com destaque para o varejo digital, infraestrutura e a indústria automobilística. De acordo com o Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) e a embaixada chinesa, o investimento dessas empresas somou no Brasil mais de US$ 66 bilhões nos últimos 14 anos. E mais investimentos na casa dos bilhões são esperados para os próximos anos.
Tamanho interesse é justificável. O Brasil é a maior economia da América Latina, tem mais de 200 milhões de habitantes e indicadores macroeconômicos em recuperação. Destaque também para o boom do e-commerce no Brasil com a pandemia e o intenso uso das redes sociais pela população, o que acabou chamando a atenção de gigantes do varejo digital chinês.

Porém, essa efervescência traz alguns desafios no campo logístico que demandam atenção. Eles são oriundos de diferenças culturais e de ambiente de negócios entre os dois países, tendo impacto direto nas operações logísticas.
Pela nossa experiência no Brasil e em outros países, as empresas chinesas são verdadeiras máquinas de execução, trabalhando com prazos muito curtos e orçamentos hiper enxutos. Essa abordagem encontra alguns desafios no Brasil, cujo ambiente regulatório fiscal, trabalhista e societário requer alguns procedimentos que tomam tempo e custo.
Neste sentido, uma primeira orientação é realmente uma análise do ambiente de negócios no Brasil antes da efetiva operação ou investimento, a fim de se identificar os principais requerimentos, principalmente na área legal e tributária. No Brasil, a movimentação de carga demanda muitos procedimentos nestas áreas, mesmo dentro do país, que essas empresas chinesas não estão acostumadas.
O segundo passo é trabalhar em um planejamento logístico um pouco mais longo. De forma geral, as empresas chinesas privilegiam uma implantação ágil associada a uma flexibilidade para se escalar o volume armazenado ou movimentado. Aliás, essa é uma característica importante para se trabalhar com este perfil de empresa: flexibilidade operacional e de negócios, principalmente para escalar rápido. Porém, considerando o complexo cenário regulatório no Brasil, é necessário um prazo um pouco maior para essas adequações, sob pena de onerar os custos ou gerar riscos.
E, sim, outra dificuldade são as diferenças de idioma e cultura. Nos negócios, os chineses tendem a ser mais práticos e diretos que os brasileiros, tendo a expectativa de respostas rápidas a assertivas. O inglês pode ajudar, mas o ideal é realmente ter um falante da língua para facilitar. Temos casos de projetos e negociações que andaram melhor com o suporte de falantes do chinês. Se tiver experiência em negócios com a China, mais efetivas tendem a ser as interações.
Outro tema fundamental é o forecast (previsão de demanda). Em um país com dimensões continentais, relevo variado e com baixo investimento em infraestrutura (bem diferente da realidade chinesa atual), não basta ter a demanda dos consumidores. É necessária acurácia na previsão de venda, incluindo volume, sortimento e posicionamento de estoque. Então, de acordo com a capacidade operacional disponível, desenhar a melhor solução de armazenagem e transporte. Isso é especialmente importante em períodos de pico de vendas, como a Black Friday.
Podemos mencionar ainda questões importantes como a agilidade de implantação dessas operações, o crescente uso de tecnologia e automações para ganho de eficiência logística e a predominância de contratos do tipo uso e pagamento sob demanda, incluindo preço unitário por item expedido no caso do e-commerce.
Além da preparação e curva de aprendizado, uma estratégia importante na área logística para as empresas chinesas no Brasil é a busca de parceiros não apenas operacionais (ou que executem pequenas porções da cadeia de suprimentos), mas que possam proporcionar uma consultoria ampla e profunda do cenário brasileiro, entrando inclusive em aspectos que são mais do negócio. Isso encurta muito o caminho e evita erros e prejuízos na operação logística.
Para encerrar, é interessante notar que, de outro lado, temos muito o que apreender e nos inspirar nestas empresas. Elas trazem uma abordagem muito prática e rápida, operam com custos muito reduzidos e são muito criativas no desenvolvimento de novas soluções e produtos. Combinar os skills de ambos os países pode trazer muitas oportunidades, e não apenas na logística.










