Deveria ser uma cinco da tarde quando toca o interfone da minha sala…
– Zelão, o Luiz Horta (saudades) quer falar com você.
– OK… já estou atendendo…
– Fala aí, amigo, tudo bem?
– Tudo, Zé. Vem pra cá agora, temos mais um daqueles bons pepinos que você já conhece.
– Tô chegando, parceiro.
E lá fui eu largando uma gravação que estava no meio para atender ao chamado do meu amigo que estava em apuros.
Lá chegando, fui imediatamente mandado para a sala de reunião onde estava o Luiz Horta me aguardando ansiosamente.
– Pô, Zé, cê demorou paca…
– Que nada bicho, tava no meio de uma gravação e o cliente lá… sabe como é, né?
– Bom, sem perder tempo vamos ao que interessa. Temos que apresentar amanhã um jingle para um depilador feminino que vai se chamar Carícia. Ok?
– OK… vamos então saber como é que é esse briefing.
– Não tem briefing nenhum, cara, faz uma música suave com uma letra idem e vamos lá, tá?
– Tá legal, mas você não escreveu nada?
– Escrevi umas frases soltas… arruma elas e faz a letra, tá?
– Tá certo, cara. Vou nessa.
No dia seguinte, apresentei o jingle e ele foi aprovado pelo Luiz Horta. Porém, o cliente havia acabado de desistir de lançar o produto. Ficamos ambos muito p….da vida…, mas não seria essa a primeira vez nem a última que isso aconteceria. Botei o rabo entre as pernas e tchau.
No mesmo dia à tarde, apareceu no estúdio o Toninho Pinheiro (um dos melhores bateristas que este seu amigo já ouviu) me dizendo que o Dick Farney estava procurando músicas inéditas para o seu novo LP, e queria “músicas românticas, brasileiras e inéditas”, repetiu.
– Você tem alguma, Zelão?
– Acho que não.
– Você não tem nenhuma que pareça com aquela que a gente gravou hoje?
– Não, não tenho… mas tenho ela.
– Como?
– A música que eu fiz, o cliente decidiu não lançar mais o produto.
– Então é ela… arruma a letra… é ela.
Foi o que eu fiz. Liguei pro Luiz Horta e pedi pra ele me ajudar a ajeitar a letra que ela iria virar uma música para o Dick Farney gravar.
Ele deu uns toques de mestre na letra e eu gravei uma fita com ela para o Dick escutar. Não só escutou como acabou gravando esta música no seu último trabalho em vida.
A música “Carícia”, de Zelão e Luiz Horta, está no LP gravado nos estúdios do Som da Gente, e este foi um dos episódios mais importantes e curiosos da minha carreira.
Dito isso, meu recado para os leitores é o seguinte: nada que foi recusado por alguém é uma peça definitivamente fora de questão. “As veiz dá”. Falou?
José Luiz Nammur – Publicitário, músico e compositor profissional. Em seus arquivos, mais de 6.000 músicas criadas e gravadas para propaganda. Participeiou desde o início dos festivais de música no Brasil (Festival da Excelcior, Festivais da Record, FIC Festivais Internacionais da Canção e outros). Música tema da novela “Bandeira 2” da Rede Globo. Assistente de Direção Musical no Espetáculo Arena conta Tiradentes, Diretor Musical junto com Carlos Castilho da peça Roda Viva, Diretor Musical da peça Cemitério de Automóveis e outras. Entre os jingles gravados alguns sucessos como: Caldo Maggi, o caldo nobre da galinha azul; Kolynos, o gosto da vitória ah…; Cigarros Ella, Ella sou eu, sou eu…; Expo-ex exposição do exército…; Coca-Cola, (versão) isso é que é…; Gelol, tropeçou, caiu, machucou…tem que ser Gelol. Mais de 200 prêmios em festivais de publicidade. Compositor do Hino oficial da Copa do Mundo de 82 na Espanha. Ex-diretor artístico da RTV Bandeirantes. Atual diretor de Marketing do Portal e Jornal LogWeb. jlnammur@logweb.com.br