Em seu primeiro artigo para o portal Logweb, a colunista Simone Santos aborda a questão dos Data Centers, considerando que os desenvolvedores de galpões logísticos estão bastante interessados pelo termo, como alternativa de desenvolvimento dentro dos parques.
O Brasil tem todos os ingredientes para ser protagonista na indústria de Data Centers.
Com energia limpa, abundância territorial, players globais e avanços regulatórios, o país se posiciona como destino estratégico para investimentos em infraestrutura digital — um setor que se tornou o verdadeiro motor da nova economia.
E a boa notícia é: não se trata apenas de um mercado de tecnologia, mas também de real estate.

A revolução dos dados e o apetite energético
O mercado global de Data Centers cresce numa velocidade sem precedentes, impulsionado pela nuvem, pela inteligência artificial generativa e pelo machine learning — tecnologias que transformaram a forma como empresas e governos processam, armazenam e interpretam informações.
Essa revolução dos dados inaugurou uma corrida mundial por infraestrutura digital, acompanhada de desafios energéticos e regulatórios de magnitude inédita.
Em 2023, os Data Centers consumiram mais energia do que países inteiros, como Alemanha ou França. Projeções indicam que, até 2030, esse consumo pode triplicar, alcançando o equivalente ao gasto energético de toda a Índia.
Nos Estados Unidos, o alerta já é claro: a demanda de energia dos Data Centers deve triplicar até o fim da década, impondo à rede elétrica o maior estresse desde 1930.
A combinação de IA, serviços em nuvem e aplicações corporativas em larga escala fez com que o setor se tornasse, simultaneamente, o motor e o gargalo da economia digital.
A arrancada latino-americana: uma gota no oceano
Enquanto as potências tentam equilibrar custo, oferta e sustentabilidade, a América Latina vive uma arrancada impressionante. Entre 2023 e 2024, a capacidade instalada na região cresceu 141%, atingindo 1,3 gigawatt — um salto histórico.
O Brasil desponta como líder absoluto, com 665 megawatts instalados, mais do que o dobro do segundo colocado, o Chile. Essa expansão reflete não apenas a demanda local, mas o papel estratégico do país como hub regional de dados, capaz de atender empresas globais que buscam latência baixa, energia limpa e estabilidade institucional.
Quando comparada aos grandes polos mundiais — América do Norte (40,6 GW), Europa (10,9 GW) e Ásia (10,5 GW, sem contar a China) — a região ainda é uma gota no oceano digital.
Os diferentes modelos de Data Centers
O ecossistema de Data Centers se organiza em modelos complementares, que refletem o avanço tecnológico e a maturidade de cada mercado:
– Hyperscale: projetados para grandes provedores de nuvem e empresas de tecnologia (Google, Amazon, Microsoft), operam em escala massiva e exigem alta densidade energética.
– Colocation: modelo em que múltiplos clientes compartilham a mesma infraestrutura física, alugando espaço, energia e conectividade. É o formato mais adotado por empresas que buscam desempenho e custo eficiente sem construir estrutura própria.
– Edge Data Centers: menores e descentralizados, próximos aos grandes centros urbanos e usuários finais. São essenciais para reduzir latência em aplicações como streaming, IoT, carros autônomos e IA generativa.
– Enterprise Data Centers: construídos por uma única corporação para uso interno, ainda relevantes em setores que demandam alto nível de controle e compliance.
Cada formato possui dinâmica de investimento, consumo e operação distinta, mas todos compartilham o mesmo denominador comum: energia previsível, conectividade robusta e escala operacional.
Energia limpa e custo competitivo: o diferencial brasileiro
O grande trunfo do Brasil está na matriz energética. Enquanto a média global de fontes renováveis é de 41%, o país opera com 89% de energia limpa, combinando hidrelétricas, eólicas e solares.
Essa composição coloca o país em posição privilegiada para atrair capital internacional em um momento em que sustentabilidade e ESG deixaram de ser discurso e tornaram-se pré-requisitos de investimento.
Mas abundância não é sinônimo de disponibilidade imediata. A previsibilidade energética ainda é um desafio central: conectar novos empreendimentos às redes de transmissão e distribuição exige coordenação entre distribuidoras, agências reguladoras e governos locais.
No setor, já se diz que a energia é o novo vetor de competitividade global — e a velocidade em garantir acesso a ela será o verdadeiro diferencial competitivo da próxima década.
Avanços regulatórios e novos incentivos
Nos últimos meses, o Brasil deu passos importantes rumo a um ambiente mais competitivo e previsível para o setor.
A MP nº 1.318/2025 instituiu o ReData (Regime Especial de Tributação para Serviços de Data Center), criado para atrair investimentos e reduzir o custo de implantação e operação de infraestrutura digital. O programa prevê isenção de IPI, PIS/Cofins e Imposto de Importação sobre equipamentos e insumos utilizados em Data Centers, e vincula o benefício ao uso de energia renovável e metas de eficiência energética.
Além disso, o PL 2080/2025, em tramitação na Câmara, propõe a Política Nacional de Eficiência Energética e Sustentabilidade para Data Centers, definindo metas e instrumentos para o uso racional de energia e recursos naturais.
Essas medidas têm reflexos diretos:
– Redução de capex e maior viabilidade para novos projetos;
– Atração de grandes players internacionais que buscam hubs de baixa latência na América Latina;
– Expansão da cadeia produtiva nacional, com geração de empregos e fortalecimento da indústria de energia e tecnologia;
– Descentralização geográfica, impulsionando novas praças fora do eixo São Paulo–Campinas.
O país começa, assim, a alinhar ambiente de negócios, regulação e sustentabilidade, abrindo espaço para uma nova onda de investimentos estruturantes.
Real Estate e capital privado: o novo eixo da infraestrutura digital
Mais do que um setor tecnológico, os Data Centers representam um novo capítulo do Real Estate corporativo. Fundos de investimento, gestoras e desenvolvedores estão cada vez mais atentos a essa tese — que combina grandes áreas, oferta de energia, conectividade e retorno de longo prazo.
A construção e operação desses ativos exigem capital intensivo e planejamento técnico altamente especializado, e vem impulsionado parcerias estratégicas entre operadores e investidores, através de operações de sale & leaseback e construções sob encomenda (built to suit).
Essas estruturas trazem velocidade e escala para os operadores, mas ainda representam um desafio para investidores e incorporadores tradicionais, diante das múltiplas camadas de complexidade tecnológica, energética e financeira envolvidas.
Na prática, o capital do investidor e desenvolvedor se limita ao ativo físico — composto por terreno, infraestrutura de energia e edificação — enquanto o operador de Data Center assume o investimento no “recheio”: equipamentos, sistemas de resfriamento e tecnologia embarcada.
Por trás de cada megawatt instalado há um ciclo extenso e rigoroso: começa com a aquisição do terreno, passa pelo licenciamento ambiental, pela conexão à rede elétrica e culmina na construção e operação do ativo.
Embora o terreno represente apenas 3% a 5% do investimento total de um Data Center, ele é o alicerce estratégico de todo o projeto, e está fundamentalmente atrelado e oferta de energia.
Descentralização e novos polos
Embora 80% da capacidade brasileira ainda se concentre entre São Paulo e Campinas, a descentralização começa a ganhar corpo. Cidades como Fortaleza, Porto Alegre e Rio de Janeiro entram no radar de operadores e investidores, impulsionadas por fatores como disponibilidade de energia, incentivos locais e menor latência regional.
Esses novos polos têm potencial para atender à crescente demanda de edge computing e IA generativa, que exigem proximidade com o usuário final e redução de custos de transmissão.
E o futuro?
Com projeções que apontam para até US$ 350 bilhões em investimentos no país nos próximos dez anos, o desafio está em transformar potencial em escala — equilibrando crescimento, segurança energética e previsibilidade regulatória.
Se tivermos regulamentações definidas e soubermos unir infraestrutura, energia e visão imobiliária seremos um dos maiores eixos da economia digital mundial.










