No seu novo artigo, Elcio Grassia, colunista do Portal Logweb, destaca como a crescente instabilidade global tem colocado as cadeias de suprimentos sob pressão, tornando a resiliência um fator estratégico. Ele apresenta o conceito de shift left — antecipar decisões e integrar logística e sustentabilidade desde as primeiras etapas — como o caminho para construir operações mais seguras, eficientes e preparadas para crises.
Em um mundo cada vez mais interligado, as cadeias de suprimentos enfrentam riscos crescentes: disputas comerciais, crises geopolíticas, escassez de insumos e mudanças climáticas. Esses desafios afetam desde a produção até a entrega final, comprometendo vendas, contratos e a confiança dos clientes.
Nesse contexto, uma das estratégias mais eficazes para construir cadeias mais resilientes, sustentáveis e lucrativas é chamada de “shift left”. Em linguagem simples, significa antecipar decisões. É integrar logística, sustentabilidade e gestão de riscos logo nas primeiras etapas de desenvolvimento de um produto — e não apenas quando ele está pronto para ser fabricado ou distribuído.

A complexidade das cadeias globais
Produtos como smartphones, que dependem de matérias-primas extraídas em diversos países, ilustram a complexidade das cadeias globais. Alumínio, lítio, cobalto e tântalo são essenciais para baterias, telas e componentes eletrônicos. Porém, a origem desses materiais está sujeita a riscos como conflitos políticos, catástrofes naturais e barreiras comerciais.
Setores como semicondutores, dispositivos médicos, alimentos e bebidas também enfrentam grande vulnerabilidade por dependerem de cadeias longas e dispersas geograficamente. Um exemplo recente é o impacto do aumento no preço do cacau sobre fabricantes de chocolate.
O custo da instabilidade
Segundo estudos da IBM e Forrester, 60% das empresas perdem participação de mercado em interrupções; 58% têm queda nas vendas; 44% enfrentam cancelamentos de contratos. A reputação e a fidelidade dos clientes também sofrem.
E essas interrupções são frequentes: quase metade das empresas relata paralisações não planejadas a cada dois meses, o que torna a instabilidade uma rotina para muitos negócios. Por isso, a resiliência precisa deixar de ser um plano de contingência para se tornar parte da estratégia central da empresa.
Como construir resiliência?
A resposta está em cinco pilares:
1. Transformação digital
2. Transparência e colaboração
3. Sustentabilidade e eficiência
4. Agilidade operacional
5. Planejamento antecipado com foco em riscos
A tecnologia, em especial, é uma aliada essencial. Ferramentas como gêmeos digitais (digital twins) permitem criar simulações virtuais da cadeia de suprimentos, antecipando gargalos e otimizando processos desde o design até a entrega.
Shift Left: Antecipar para ganhar
O maior diferencial da estratégia shift left é a integração da logística no início do ciclo de vida do produto. Tradicionalmente, a logística é considerada só depois que o produto já foi desenhado. Com o shift left, ela entra logo no começo.
Isso significa, por exemplo, que ao desenvolver um novo smartphone, a equipe de design já considera:
– Onde os insumos serão comprados
– O impacto ambiental do transporte
– O risco de interrupções geopolíticas
– As emissões de carbono envolvidas
Com essas informações desde o início, é possível optar por fornecedores mais próximos (nearshoring), reduzir o custo logístico, evitar gargalos e melhorar o desempenho sustentável do produto.
Sustentabilidade e agilidade: Mais que tendência
Sustentabilidade não é mais uma opção. Empresas que reduzem emissões, otimizam transporte e cuidam da origem de seus insumos não apenas contribuem para o planeta — elas também:
– Reduzem taxas de carbono
– Aumentam a eficiência
– Fortalecem o relacionamento com clientes e investidores
Agilidade também se tornou imperativa. Eventos inesperados, como guerras ou bloqueios marítimos, exigem resposta rápida. Softwares de cadeia de suprimentos permitem replanejar rotas, ajustar produções e evitar paralisações, mesmo em meio a crises.
Um novo modelo cultural
A proposta do shift left vai além da técnica — ela exige uma mudança de cultura nas empresas. É necessário que times de produto, engenharia, compras, logística e sustentabilidade trabalhem juntos desde o início. Isso fortalece a colaboração, melhora a tomada de decisão e aumenta a capacidade de adaptação em um ambiente de constante mudança.
Conclusão
As interrupções nas cadeias de suprimentos são uma realidade constante e cara. Mas com estratégias como o shift left, combinadas a tecnologias digitais, foco em sustentabilidade e agilidade operacional, é possível construir cadeias mais preparadas, eficientes e resilientes.
Cada novo produto é também um plano logístico em potencial. Incorporar essa visão desde o início pode ser o diferencial entre o sucesso e o colapso em tempos de incerteza.
O momento de agir é agora.









