O mundo enfrenta um déficit global de biocombustíveis crescente, que pode alcançar 45% até 2040, segundo estudo da Bain & Company. A consultoria aponta que o fornecimento será insuficiente para atender à demanda dos setores de aviação, transporte marítimo e rodoviário pesado, especialmente em mercados dependentes de importações, como a União Europeia.
Esse desequilíbrio compromete a transição energética e pressiona o mercado por soluções rápidas. Neste cenário, o Brasil emerge como um fornecedor estratégico, com infraestrutura industrial consolidada, disponibilidade de biomassa e capacidade de escalar sua produção com sustentabilidade.

Descarbonização dos transportes e lacuna de oferta
O setor de transportes responde por 16% das emissões globais de gases de efeito estufa. Embora a eletrificação avance em veículos leves, 40% dessas emissões são de difícil eletrificação — o que torna os combustíveis sustentáveis a principal alternativa de curto e médio prazo.
A Bain estima um déficit de 20% já em 2030, que pode dobrar até 2040 caso não haja aceleração no desenvolvimento de novas matérias-primas e rotas tecnológicas.
Brasil como protagonista global em bioenergia
Com forte produção de soja e cana-de-açúcar, o Brasil tem condições de ampliar rapidamente sua oferta de biocombustíveis. Hoje, 33% da soja é processada internamente, e 55% do óleo de soja será destinado à produção de biodiesel em 2024 — um crescimento de 72% em relação a 2017.
A capacidade industrial instalada cresceu 20% nos últimos dois anos e opera com ociosidade entre 10% e 15%, permitindo expansão com investimentos incrementais. A atual infraestrutura já é suficiente para suprir a demanda até 2029.
Além disso, o país mantém logística integrada ao comércio internacional de commodities agrícolas e energéticas, facilitando o escoamento da produção.

Expansão com segurança alimentar
A produção de biodiesel, projetada para crescer 8% ao ano, pode ser sustentada com ganhos de produtividade e uso de áreas degradadas — sem exigir desmatamento. Ainda há margem para aumento do processamento doméstico, já que mais de 60% da soja é exportada in natura.
Novas matérias-primas sustentáveis em desenvolvimento
Segundo Felipe Cammarata, sócio da Bain, o Brasil começa a explorar culturas alternativas como macaúba, camelina e carinata, que permitem diversificar a oferta de matéria-prima e otimizar o uso agrícola no período de entressafra.
Essas espécies, com alto rendimento de óleo e cultivo em áreas degradadas, podem reduzir a dependência de commodities tradicionais. Contudo, seu uso em larga escala depende de investimentos estruturantes, como sementes adaptadas, certificação internacional, capacitação técnica e adequações industriais.
Pressão regulatória e oportunidades comerciais
Com legislações como o Fit for 55 na Europa e o Inflation Reduction Act nos Estados Unidos, a demanda por biocombustíveis como SAF (bioquerosene de aviação), HVO (óleo vegetal hidrotratado) e biodiesel tende a se intensificar. O Brasil tem capacidade de atender essa demanda com escala, qualidade e sustentabilidade.
Quatro passos para o Brasil liderar em biocombustíveis, segundo a Bain
- Fomento à inovação agrícola, com apoio técnico e financeiro à adoção de culturas rotativas.
- Políticas públicas estáveis, que incentivem a exportação e o uso de matérias-primas sustentáveis.
- Investimentos em biorrefino e logística, adaptando infraestrutura para novas culturas.
- Acordos comerciais estratégicos, que garantam acesso a mercados regulados.
“O Brasil tem a oportunidade de assumir a liderança na produção sustentável de biocombustíveis. Ser o celeiro de bioenergia do planeta é mais do que um papel econômico: é uma estratégia de segurança energética e de contribuição real à descarbonização global”, conclui Cammarata.









