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“Instituir uma ‘cultura de prevenção de riscos’ é necessário em qualquer atividade econômica. Nas operações logísticas em especial”

Os Operadores Logísticos, já desde os anos noventa do século passado, deixaram de ter atuações meramente operacionais e passaram a exercer funções eminentemente estratégicas, seja no desenho das soluções logísticas, na operação, na subcontratação ou no controle de outros operadores, obrigando-os a ter responsabilidade direta, e até legalmente, dos riscos inerentes.

A procura por novos canais de conexão, mais diretos com seus clientes e suas redes de abastecimento e distribuição, de forma eficiente e rápida, tornou-se fundamental para que os Operadores Logísticos obtivessem dados e informações que pudessem, de fato, refletir a realidade negocial (e operacional) do momento.

Para tanto, os Operadores Logísticos passaram a se aproveitar do avanço da tecnologia como forma de mantê-los conectados ininterruptamente aos seus clientes e às suas redes de abastecimento e distribuição.

Obviamente isso permitiu ao Operador Logístico ter acesso a um conjunto maior, mais abrangente e mais detalhado de conhecimentos, não só operacionais, mas também sobre o próprio cliente e toda sua rede de fornecedores, distribuidores e clientes. E, em alguns casos, até de informações confidenciais.

Esse acesso às informações, agora ainda mais essencial, exigiu do Operador, além de mais conhecimento e maior capacitação, um nível de relacionamento muito mais “íntimo” com o cliente, no qual o comprometimento, a confiança e a lealdade passaram a ser “virtudes” inegociáveis. Inclusive de seu corpo de funcionários. Óbvio, portanto, que esses Operadores passaram a lidar, em seu trabalho diário, com um conjunto significativo, novo e mais abrangente de riscos. Os “ciberataques”, por exemplo, são realidade em todo o mundo e a busca por medidas de proteção digital uma nova realidade.

Portanto, se o uso intensivo de dados, a transparência, a precisão, a rapidez e a disponibilidade em tempo real das informações sempre foram valores imprescindíveis para a realização e o monitoramento de uma eficiente operação logística, mantê-los devida e concretamente protegidos também passou a fazer parte da lista de atribuições do Operador Logístico. E, consequentemente, das tecnologias voltadas a isso. Embora ainda não muito claro, são evidentes os impactos que as novas tecnologias – para o bem e para o mal, pois disponível a todos, “mocinhos e bandidos” – trarão para a sociedade e para as empresas, assim como para toda e qualquer atividade humana, sendo preciso, consequentemente, acompanhar o desenvolvimento e buscar formas de aplicá-las eficientemente.

Mais do que estarem alinhadas à essa nova realidade, na qual a compreensão a respeito da cultura e ao comportamento do cliente é importante, os programas de gerenciamento de riscos e suas respectivas apólices de seguros, precisaram ser adaptadas à administração, ao controle, à preservação e à proteção dos sistemas de dados e informações, cada vez maiores e complexos, agora totalmente à disposição dos operadores logísticos. 

Aqui mesmo neste site, em meados de 2023 (13.06.23 – “Imprescindíveis, programas de gerenciamento e prevenção de riscos precisam proteger, também, os diversos sistemas de informação e de dados existentes nas operações logísticas), eu escrevi: “os responsáveis pelos programas de gerenciamento de riscos e de cobertura de seguros, se para estarem mais adequados a essas novas circunstâncias, já precisavam compreender melhor as operações, a cultura e o comportamento dos clientes, agora também passou a ser necessário entenderem melhor os riscos inerentes à administração, ao controle, à preservação e à proteção dos sistemas de dados e informações existentes”.

Apenas para que se tenha uma ideia dos inúmeros riscos, inerentes todos eles às operações de transporte, a lista elaborada pela Confederação Nacional dos Transportes, agora em 2024, contemplou como principais riscos: 1. Ambientais (Eventos Climáticos extremos, desastres naturais, acidentes nucleares, químicos ou industriais, disputas pelo uso da água); 2. Ambientes dos Negócios (Alterações ou insuficiências das políticas legais, normativas etc., entraves burocráticos); 3. Econômicos (Mundial ou nacional: instabilidades, falta de recursos, de crédito, de insumos, matéria-prima ou energia, infraestrutura precária, alterações significativas de demanda); 4. Geopolíticos (Ataques nucleares, químicos e/ou biológicos, conflitos armados, ataques físicos à infraestrutura e/ou ativos); 5. Sociais (Crime organizado, falta de mão de obra, pandemias, aumento de acidentes, danos aos sistemas de comunicação, fake-News); e 6. Tecnológicos (Crimes e/ou conflitos cibernéticos, obsolescência, rápido avanço).

Observação feita no documento da CNT: Um programa de ‘gestão de riscos’, com relação aos negócios da empresa e das cadeias produtivas e logísticas pertinentes, precisa ser feito com amplo e ininterrupto monitoramento e desenvolvimento de planos alternativos. Por outro lado, jamais deve ser esquecido que manter-se ‘ligado’ aos setores público e produtivo, de forma a conhecer melhor o setor e seus desafios, é o melhor e mais curto caminho para se obter protagonismo nas discussões pertinentes.

Como se percebe, os ‘novos’ programas de proteção e gerenciamento de riscos não se limitaram apenas aos ‘softwares de segurança’ já conhecidos e bastante difundidos no mercado, tais como ‘backups’, ‘firewall’, ‘redes privadas’, ‘antivírus’, ‘serviços de autenticação’, ‘criptografia’ e outros. Foi fundamental desenvolver e instalar programas de segurança que protejam a privacidade das informações e garantam a utilização das mesmas, única e exclusivamente para atender aos objetivos e às finalidades acordadas. Além do que, garantir um processamento adequado das informações e dados disponibilizados pelos clientes, de forma a minimizar possíveis prejuízos oriundos de má utilização ou de erros de armazenamento, que possam implicar na perda ou na destruição de arquivos existentes. Aliás, manter armazenamento correto das informações e à disposição de seus proprietários, a qualquer tempo e hora, nunca deixou de ser item contratual.

Vale a pena lembrar novamente o que escrevi no artigo aqui já mencionado, de que a partir da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a grande maioria dos países entrou definitivamente na era das informações, posto que elas ficaram disponíveis a todos. “Muitos, no Brasil, ainda desconhecem a lei, criando clima ainda mais inseguro, principalmente para quem cede suas informações para os diversos aplicativos existentes atualmente.”

Como ilustração, sabe-se que na União Europeia, por exemplo, através da “General Data Protection Rules”, já se regulamentou a forma para que se dê total proteção à privacidade das informações e dados, um dos pilares do marco que regulamenta a internet.

Portanto, diante dessas novas exigências, da nova situação de riscos a ser enfrentada hoje pelas empresas e em face da própria legislação que trata da responsabilidade civil empresarial, as empresas precisam alinhar o seu programa de gerenciamento de riscos e a contratação de seguros aos desejos e às necessidades de seus clientes, às exigências inerentes às suas operações ou produtos, às circunstâncias de momento ou da região e aos valores da própria empresa. Entre as exigências de seus clientes estão, sem dúvida, a proteção e a privacidade de seus dados.

Em face do exposto, e considerando a legislação que trata da responsabilidade empresarial e da proteção de dados e informações, os Operadores Logísticos precisarão oferecer programas de gerenciamento de riscos e de contratação de seguros que sejam compatíveis aos desejos e às necessidades de seus clientes, às exigências operacionais, às circunstâncias de momento e aos valores da própria empresa. 

Todo prestador de serviços logísticos sabe que na eventualidade de uma ocorrência, seja ela qual for, e que resulte em indenização, poderá estar em discussão o seu próprio patrimônio, pois na maioria dos casos os valores de indenização requeridos são muito maiores do que o seu próprio capital, principalmente quando, lamentavelmente, inclui vidas humanas. Importantíssimo ressaltar, como fez a CNT em estudo aqui comentado, que diante deste mundo novo e cheio de incertezas, “a quantidade de riscos” é muito maior, com origens diversas e ainda desconhecidas.

É fundamental, portanto, que antes de se discutir a respeito de apólices ou coberturas de seguro, inicie-se uma discussão séria sobre um programa de gerenciamento de riscos. É preciso inverter o entendimento geral e comum e substituir a frase “não se preocupe, temos seguro” pela frase “não se preocupe, temos gerenciamento de riscos”. Infelizmente, essa forma antiga (“temos seguro”) ainda faz parte da cultura de uma grande maioria de empresas prestadoras serviços logísticos e, em muitos casos, também de seus próprios clientes. Suportados por processos eminentemente burocráticos de conferência e aceitação das coberturas previstas nas apólices de seguro, deixam de adotar medidas concretas para diminuição de riscos que, como se sabe, são inerentes a toda e qualquer atividade.

Os usuários de serviços logísticos não querem ser indenizados. Na verdade, eles querem que as operações ocorram da melhor maneira possível e que seus clientes sejam atendidos. Indenização, só em último caso. Não se deve esquecer, inclusive, que um eficaz programa de gerenciamento de riscos diminui sensivelmente os custos das apólices de seguro. E a prática demonstra, em muitos casos, que as economias obtidas na contratação de seguros suplantam o aumento de custos para que se implante um programa de gerenciamento de riscos eficaz.

O escopo desse novo conceito de gerenciamento de riscos – muito mais abrangente e “a priori” – deverá fazer parte da estratégia e da cultura da empresa e ser aplicado em todas as áreas e atividades empresariais. É item indiscutível da Governança Corporativa. Além de obrigação individual de cada funcionário da empresa, o cumprimento desses programas ultrapassa as barreiras legais e regulamentares, enquanto incorporam princípios de integridade e conduta ética e busca, sem dúvidas, não só a proteção de pessoas e a preservação da imagem, mas a continuidade da própria empresa.

O investimento no desenvolvimento e na qualificação de profissionais, para que todos na empresa “internalizem” valores que prestigiem as práticas de gerenciamento de riscos, isto é, “cultura de prevenção de riscos”, é necessário. É preciso estar preparado e evitar que riscos se transformem em perdas irrecuperáveis.

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Paulo Roberto Guedes

Paulo Roberto Guedes

Formado em ciências econômicas (Universidade Brás Cubas de Mogi das Cruzes) e mestre em administração de empresas (Escola de Administração de Empresas de São Paulo/FGV); Professor de logística em cursos de pós-graduação na FIA (Fundação Instituto de Administração); Consultor da ABOL – Associação Brasileira de Operadores Logísticos, da qual também foi fundador; Membro do Conselho de Administração da ANHUMAS Corretora de Seguros; Membro do Conselho Editorial da Revista Tecnologística; Consultor Associado do escritório de Nelson Faria Advogados; Consultor empresarial e palestrante nas áreas de planejamento estratégico, finanças, economia e logística; Articulista de diversas revistas e sites, com mais de 300 artigos publicados (Guia do TRC, Tecnologística, Orbisnews, Logweb e Faria de Oliveira Advogados); Exerceu cargos de direção em diversas empresas (Veloce Logística, Armazéns Gerais Columbia, Tegma Logística Automotiva, Ryder do Brasil e Cia. Transportadora e Comercial Translor) e em associações dos setores de logística e de transporte (ABOL – Assoc. Brasileira de Operadores Logísticos, NTC&L – Assoc. Nacional do Transporte de Cargas e Logística, ANTV – Assoc. Nacional dos Transportadores de Veículos e ABTI – Assoc. Brasileira de Transp. Internacional); Foi membro de diversos Conselhos de Administração de empresas do setor logístico (Veloce, Columbia Logística, Columbia Trading, Eadi Salvador, Consórcio ZFM Resende, Ryder e Translor); Exerceu cargos de consultoria e aconselhamento em instituição de ensino e pesquisa (Celog-Centro de Excelência em Logística da FGV) e de instituição portuária (CAP-Conselho de Autoridade Portuária dos Portos de Vitória e Barra do Riacho do Espírito Santo); Lecionou em cursos de MBA e pós-graduação na área de Logística Empresarial em várias escolas: EAESP/FGV (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas), ENS (Escola Nacional de Seguros) e FIPECAFI (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras); Lecionou em cursos de graduação de economia e administração de empresas em diversas faculdades (FAAP-Fundação Armando Álvares Penteado, Universidade Santana, Faculdades Ibero Americana e Universidade Brás Cubas); Agraciado com a Medalha Ministro Celso Furtado por serviços prestados à classe dos Economistas, outorgada pelo Conselho Regional de Economia de São Paulo.

 

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