
Tem uma piada sobre consultores que diz assim: “Um consultor é alguém que pega seu relógio emprestado para te dizer as horas.” Depois de 15 anos nessa vida de consultoria, já ouvi muitas piadas, algumas engraçadas, outras exageradas, e outras meio bobas. Mas qualquer piada tem um fundo de verdade. Muitas empresas realmente precisam de ajuda de fora, alguém independente e com experiência. Mas, com o mercado mudando tanto, será que ainda vale a pena contratar consultores?
Cada vez mais parece que a resposta é “não.” Especialmente quando se fala nas grandes empresas de consultoria. Lá nos anos 80, consultores eram chamados para resolver um problema específico, algo pontual. As empresas escolhiam a dedo, via licitação ou pela reputação da consultoria, para resolver questões práticas: melhorar o fluxo de materiais na fábrica, reorganizar um armazém ou até construir uma nova fábrica.
Naquela época, o trabalho de consultoria era bem focado. As empresas recorriam aos consultores porque estavam ocupadas demais com o dia a dia e não tinham tempo ou recursos para mexer nas melhorias necessárias. Muita coisa era sobre capacidade e restrições, como explica o conhecido livro “A Meta”, de Eli Goldratt, sobre Teoria das Restrições.
Nos anos 90, o cenário começou a mudar. Surgiu o Just-in-Time (JIT) e os sistemas de informação ficaram mais rápidos e avançados. A consultoria também se transformou. Antes, quem trabalhava com Supply Chain eram pequenas ou médias empresas especializadas em layout e movimentação de materiais. Mas as grandes empresas de contabilidade perceberam o quanto a consultoria podia ser lucrativa e começaram a expandir seus serviços, entrando de vez na gestão de Supply Chain.
A maneira de conseguir novos clientes mudou. Ao invés de licitações, o que valia era ter bons contatos. As grandes consultorias usavam suas conexões para crescer, e muitos consultores acabavam ficando nas empresas clientes por tempo indefinido. O importante passou a ser “quem você conhece” em vez de “o que você sabe.” E esses consultores não eram avaliados só pelas horas faturadas, mas também pelo número de negócios novos que traziam.
Foi nessa mesma época que a ideia de que os acionistas eram os mais importantes dominou as grandes multinacionais, que ficaram obcecadas com resultados trimestrais. Consultores viram ali uma oportunidade de liberar caixa mexendo no inventário e na mão de obra. Com o JIT, as empresas podiam operar com menos produtos no estoque, liberando recursos financeiros e, muitas vezes, reduzindo o número de funcionários.
O offshoring, que é a terceirização da produção para outros países, também se popularizou e, no papel, a combinação de JIT com produção offshore parecia perfeita, mas teve efeitos colaterais: a desigualdade cresceu e os salários reais estagnaram.
Como dizia Woody Allen: “Se você quer fazer Deus rir, conte seus planos para Ele.” Quando a Covid-19 chegou, aquelas cadeias de suprimentos supereficientes mostraram que também eram frágeis. Empresas viram seus estoques sumirem das prateleiras e fábricas fechando. Isso mostrou a necessidade de um jogo de longo prazo, com estratégias mais resilientes e ágeis. Em vez de cortar custos ao máximo, a nova prioridade virou reduzir riscos, criar processos mais eficientes e ter visibilidade em toda a cadeia.
As empresas agora precisam de uma cultura organizacional que vai além de colocar o lucro em primeiro lugar. Uma cultura que considera o que é melhor para todo mundo — clientes, investidores, funcionários e sociedade. No longo prazo, essa mentalidade torna as empresas mais fortes, inovadoras e rentáveis. Só que, para isso acontecer, é preciso tempo e muita dedicação.
Hoje em dia, as mudanças acontecem numa velocidade absurda. Empresas e consultores têm que trabalhar juntos para criar cadeias de suprimentos mais seguras e adaptáveis. Consultores precisam ensinar os clientes a pensar além do curto prazo e fazer o que é certo. Se as empresas tiverem consultores confiáveis, que realmente coloquem os interesses do cliente em primeiro lugar, o sucesso vem. Mas fica a pergunta: será que todos estão prontos para essa mudança?